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"Gangnam Style", de Psy, é uma crítica social aos novos ricos de Seul; entenda

Artista coreano Psy entra para o Top 100 da Billboard com o hit "Gangnam Style" - Mike Coppola/Getty Images/AFP
Artista coreano Psy entra para o Top 100 da Billboard com o hit "Gangnam Style" Imagem: Mike Coppola/Getty Images/AFP

19/09/2012 13h00

O hit "Gangnam Style", do cantor sul-coreano Psy, ultrapassou a marca de 200 milhões de visualizações no YouTube e é fácil entender o porquê. Nenhum conhecimento da língua coreana é necessário para desfrutar a dança do artista, que consiste em uma divertida galopagem em cima do cavalo, um refrão viciante e acontecimentos esquisitos durante o vídeo.

Apesar da excentricidade e da superfície cômica, a canção que conquistou o mundo é uma forte crítica social sobre os novos ricos do país que vivem no distrito de Gangnam, que é apenas uma pequena parte de Seul, mas inspira uma complicada mistura de desejo, inveja e amargura.

O lugar

Gangnam é o endereço mais cobiçado da Coreia do Sul, mas, há duas gerações, era apenas um lugar abandonado, cercado por terra plana e valas de drenagem.

O distrito de Gangnam, que literalmente significa “sul do rio”, é metade do tamanho de Manhattan, em Nova York. Cerca de 1% da população de Seul mora lá, mas muitos dos habitantes são ricos. A média de preço de um apartamento em Gangnam é de US$ 716 mil, o que um sul-coreano da classe média demora 18 anos para ganhar.

O centro de negócios e do poder governamental de Seul sempre foi no norte do rio Han, nas vizinhanças em torno dos palácios reais, onde muitas famílias ricas tradicionais ainda moram. Gangnam, no entanto, é o lugar dos novos ricos, que ganharam dinheiro com o boom que começou nos anos 1970.

Como os preços dos apartamentos dispararam durante um frenesi de investimento imobiliário no início de 2000, os latifundiários e especuladores se tornaram ricos praticamente da noite para o dia. A nova riqueza atraiu as mais modernas lojas e clubes e houve uma proliferação de clínicas de cirurgia plástica, mas também forneceu acesso a algo considerado vital na Coreia do Sul: educação sob a forma de aulas particulares prestigiadas e escolas preparatórias. As famílias de Gangnam gastam quase quatro vezes mais em educação do que a média nacional.

A noção de que os moradores de Gangnam não subiram na vida seguindo as virtudes tradicionais sul-coreanas de trabalho duro e sacrifício, mas simplesmente por viverem em um pedaço cobiçado da geografia, irrita muitos. Habitantes do bairro são vistos por alguns como monopolizadores das melhores oportunidades do país para a educação, das melhores ofertas culturais e da melhor infraestrutura, enquanto gastam muito em bens luxuosos estrangeiros para destacarem sua riqueza.

“Gangnam inspira inveja e desgosto”, diz Kim Zakka, crítico de música pop. “Os moradores de Gangnam são sul-coreanos da classe alta, mas os sul-coreanos os consideram egoístas, com nenhum senso de obrigação social”. De certa forma, a canção do Psy pressiona esses botões culturais.

Assista ao clipe "Gangnam Style", de Psy

O cara

Muitos artistas do K-Pop, sigla para pop coreano, já famosos na Coreia do Sul e na Ásia, já tentaram e não conseguiram se infiltrar no mercado norte-americano. Então, como Psy, ou Park Jae-sang, de 34 anos, que foi multado em cerca de US$ 4,5 mil por fumar maconha depois de seu show de estreia em 2001, conseguiu aparecer ensinando Britney Spears a dançar a galopagem no cavalo na TV americana?

"Eu não sou tão bonito, não sou alto, não sou musculoso, não sou magro”, disse Psy no programa de TV “Today”. “Mas eu estou sentado aqui”. Ele atribui seu sucesso à “alma ou atitude”.

Psy, cujo nome artístico vem das três primeiras letras da palavra psicopata (psycho, em inglês), sempre se denominou como um estrangeiro peculiar. Mas ele é de uma família rica e foi criado e educado ao sul do rio Han, perto de Gangnam.

“Ele é um excelente dançarino, um rapper confiante e é engraçado, mas outra razão para sua descoberta pode ser a imagem menos do que polida”, disse Jae-Ha Kim, colunista de cultura pop do “Chicago Tribune”.

A música sul-coreana é conhecida na Ásia por bandas com integrantes masculinos bonitos, estilosos e maquiados, incluindo Super Junior e Boyfriend. Mas ver esses cantores “deixa alguns americanos nervosos”, afirma Kim. “Americanos estão confortáveis com garotos asiáticos que parecem com Jackie Chan e Jet Li, que são charmosos, mas eles não se comparam a Brad Pitt ou Keanu Reeves”. 

Parte do interesse inicial em "Gangnam Style”, Kim conta, foi tipo “uma mentalidade de freak-show, onde as pessoas são como, 'Esse cara é engraçado’. Mas então você olha para a coreografia e percebe que você realmente tem que saber dançar para fazer o que ele faz. Ele é muito bom”.

A música

Psy, que às vezes veste camisas sem mangas com gravatas coloridas em seu vídeo, repetidamente satiriza as noções populares dos sul-coreanos sobre Gangnam.

Em vez de se divertir em boates, ele festeja com aposentados em um ônibus com iluminação de discoteca. Em vez de se exercitar em uma academia de alta qualidade, ele relaxa em uma sauna com dois gangstêres tatuados. Enquanto ele caminha ao lado de duas belas modelos, enormes quantidades de lixo são atiradas nos rostos deles pelo vento. O trono do qual ele exibe sua arrogância hip-hop é um vaso sanitário.

A canção explora a relação sul-coreana “de amor e ódio com Gangnam”, diz Baak Eun-seok, crítico de música pop. Os sul-coreanos enxergam os moradores de Gangnam como tudo o que Psy não vê: boa aparência por causa das cirurgias plásticas, estilosos porque eles podem exibir seus bens luxuosos, magros graças a yoga e aos personal trainers.

“Psy parece um caipira. Ele está muito longe do chamado ‘Gangnam Style’. Ele está parodiando ele mesmo”, afirma Baak.

O vídeo está repleto de ironia, não das imagens "de classe alta" que os sul-coreanos reconhecem, disse o blogueiro Park Byoung-soo. Homens velhos jogando em um tabuleiro e mulheres de meia-idade que usam chapéus de abas largas para manter o sol fora de seus rostos - uma maneira popular de se exercitar na Coreia do Sul.

O personagem de Psy no vídeo é modelado sobre os heróis sem noção de filmes como “Corra Que A Polícia Vem Aí!” e “Débi & Lóide”, disse o rapper à agência Yonhap. Ele também afirma que seu lance é “se vestir elegante, mas dançar brega”.

Alguns acham que Psy é mais do que um estrangeiro desengonçado. “Psy faz algo em seu vídeo que poucos artistas, na Coreia ou em qualquer lugar, já fizeram: ele parodia os mais ricos, do mais poderoso bairro da Coreia do Sul”, escreveu Sukjong Hong, da revista eletrônica “Open City”.