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Cat Power atrasa 1h20 e mostra seu lado anti-heroína do rock em SP

Estefani Medeiros

Do UOL, em São Paulo

22/05/2013 04h41

Na fila que dobrava a esquina da rua do Cine Joia, as inúmeras meninas de franjas escorridas em cima do olho e cabelos castanhos denunciavam a atração da noite. Mas, do lado de dentro da casa de espetáculos de São Paulo, a cantora americana Cat Power se preparava para desmistificar o estereótipo do estilo que ajudou a criar nos anos 1990.

Com cabelo curto, em um loiro desbotado e penteado para trás com gel, usando uma jaqueta de couro, calça e blusinha preta, Power, codinome para Chan Marshall, trouxe nesta terça (21) a turnê do álbum “Sun” para a capital paulista, show que já passou por Recife e Rio de Janeiro e chegou a São Paulo com ingressos esgotados.

Sob ameaças de vaias do público, a banda subiu ao palco por volta das 23h15, com mais de uma hora de atraso não explicado pela cantora. Com um incenso soltando fumaça do chão, entre tosses e uma dificuldade visível em engatar a voz nos primeiros momentos, ela abriu a apresentação com "Sea Of Love" ainda resmungando sobre o volume do som da casa e a iluminação. Com dois microfones, Cat Power só ficou satisfeita a partir da comemorada “The Greatest”, o que não evitou que sua voz falhasse outras vezes.

Com o olhar abatido e linhas de expressão marcando os 41 anos no rosto, revezando goles de água e uma xícara de chá, companheira sempre presente nos palcos por onde passa, Cat trouxe um show baseado nas músicas do novo álbum. Assim também foi a última e comportada apresentação no país em 2009, quando trouxe o recém-lançado disco de covers “Jukebox”, que teve seu espaço no show com a apresentação da densa e contemplativa “Angelitos Negros”.

Diferentemente da turnê do depressivo “The Greatest”, que passou pelo extinto Tim Festival em 2007, a banda que toca com a cantora é formada por três integrantes mulheres e um homem, que substituem a Dirty Delta Blues, grupo que acompanhou Power em boa parte da sua carreira. Entre os intervalos das músicas, ela deixa a banda tocando e faz pausas para autografar álbuns, camisetas e os mínimos papéis entregues pelos fãs.

O show ainda teve músicas como a recém-lançada “Bully”, além de “Human” e “I Don’t Blame You”, quando ela parou de novo de cantar para receber presentes e conversar com a plateia. O show é encerrado com “Ruin”, quando a cantora se vira de costas para pegar rosas brancas, distribuir para a plateia e apresentar a banda timidamente com gestos e palmas.

Cat Power chega ao país após um momento delicado na vida pessoal. Em 2011, ela se separou de Giovani Ribisi,  por causa de seus excessos com drogas e álcool, o que já tinha lhe rendido períodos difíceis e internações em 2006. No ano passado, um problema de saúde a fez cancelar uma série de shows da turnê, quando ela achou que iria morrer.

Enquanto lançava “Sun”, em entrevista ao Pitchfork, ela disse que a separação foi o maior motivo pra cortar o cabelo e viajar para a França, onde finalizou o disco praticamente sozinha, o mais ensolarado, eletrônico e otimista da carreira.

O que a apresentação transparece é que, assim como o álbum, a cantora deixou o lado mais menina, triste e doce de lado, o que influenciou uma geração de cantoras inspiradas no gênero - e algumas no corte de cabelo. A fase de mudanças unida às falhas na voz, seu transparente e sincero desconforto nos shows ao vivo, unidos ao atraso, as bebedeiras e talento a transformam, no que antes era uma depressiva musa indie, em uma espécie de anti-heroína do rock.