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Formada por bandas como Pollo e Bonde da Stronda, cena do rap mostra seu lado mais pop

Show da banda Pollo no Planeta Atlântida. A banda foi formada há dois anos em Pirituba - Reprodução/Facebook
Show da banda Pollo no Planeta Atlântida. A banda foi formada há dois anos em Pirituba Imagem: Reprodução/Facebook

Estefani Medeiros

Do UOL, em São Paulo

27/05/2013 16h35

Os clipes têm milhões de visualizações no YouTube, as músicas são tema de novelas da Globo e figuram nas listas de mais ouvidas nas rádios e na MTV. Entre os padrinhos estão Sandrão (RZO), KL Jay (Racionais) e Marcelo D2 (Planet Hemp). Formada por grupos como Pollo, ConeCrewDiretoria, Haikaiss e Bonde Da Stronda, a nova geração do rap está mudando a forma como o público ouve a periferia. 

Criadores de "Pirituba City" (10 milhões de visualizações), música inspirada no bairro da zona oeste de São Paulo, o Pollo, trio formado por DJ Kalfani e os MCs Adriel e Luiz, que têm entre 16 e 21 anos, começou a carreira há dois anos. O primeiro clipe foi gravado com a ajuda dos amigos e de forma caseira, conta Adriel. "Vendi o carro pra fazer esse clipe. Era a única coisa que tinha de herança do meu pai, porque não tinha nenhuma grana no bolso pra entrar de cabeça nisso. Aí juntamos namoradas, amigos, e gravamos o clipe da música. Pra gente é inacreditável. Ainda não caiu a ficha", comenta sobre os números do grupo. 

O Pollo, que já prepara sua estreia internacional com shows marcados na Argentina e em Portugal, tem "Vagalumes" (26 milhões de visualizações) como música tema da novela "Sangue Bom". "Em uma semana foi 1 milhão de views e não entendemos nada. Depois da novela, eu não acreditei mesmo. No primeiro comercial com a música na novela, minha família quase morreu. Não tínhamos acostumado nem com a rádio. É tudo muito novo. Estamos felizes que muita gente vai poder se inspirar na gente. somos três moleques de Pirituba. não estamos pensando que somos os Rolling Stones." 

Representantes do estilo no Rio de Janeiro, a ConeCrewDiretoria, formada em eventos de rap nos arredores da Lapa carioca, tem sete anos de carreira. No início, a banda tentava fazer a divulgação à moda antiga no rap, distribuindo CDs em batalhas de MCs. Mas foi com "Chama os Muleques", lançado há mais ou menos um ano no YouTube e com 9 milhões de visualizações, que a banda conseguiu os holofotes.

"Sem o YouTube, a gente ia estar ferrado. A gente é independente. Nunca teve assessoria de imprensa, nem alguma coisa pra ir atrás e buscar espaço na mídia. A gente vendia disco por um real e ia divulgando", comenta o beatmaker Papatinho, que diz ter sido introduzido no rap por uma fita de Gabriel O Pensador.

Com dois discos lançados, os cariocas do Bonde da Stronda, formado por Léo e Mr. Thug, já tiveram sua versão de "Tic Tic Nervoso" na trilha sonora de "Malhação" e ficaram famosos depois de lançar "Zica do Bagui", clipe com 5 milhões de visualizações.  

"Tem espaço? Faz tatuagem!" 
Com os braços cobertos por tatuagens, o estilo desses grupos é uma representação da cultura de rua atual. Seus logos são recriados por designers e vendidos em lojas on-line em forma de acessórios que o público usa como marca durante os shows. "Old school, new school. Mudaram minha aparência", canta o Bonde. 

"A gente nunca teve uma intenção de se vestir assim, a gente sempre se vestiu do jeito que a gente queria. O principal é você querer passar a sua mensagem, sem se preocupar com o que vão dizer", comenta Adriel. Papatinho também acredita que o estilo não influencia e, sim, é um retrato espontâneo da cena atual. 

O Haikaiss, grupo de rap formado na zona norte de São Paulo, classifica o estilo do grupo como um revival da "golden era", que tem Public Enemy e Beastie Boys entre seus expoentes. "Estilo é importante como referência, pra gente ter conhecimento, entender cada época musical. Anos 90, pós 2000", comentam os integrantes SPVIC (produtor e MC), Spinardi (MC) e DJ Qualy. 

O rap é pop
Nas músicas, o uso do efeito conhecido como auto-tune sobre as vozes misturado com batidas eletrônicas e melódicas e letras sobre corações partidos é o que diferencia as bandas do cenário do rap criado nos últimos dois anos. "Pra gente não é relevante se categorizar, a gente mistura. Falam que é modinha, mas o rap tá mais pop. Está entrando de vez na grande mídia, é uma coisa louco. Não tinha espaço, agora abriram a porta pra gente e o público invadiu", comenta Adriel. Para o Haikaiss, o rap "está mais popular." 

Papatinho discorda e acha importante manter as diferenças. "Acho que enquanto estiver falando sobre a realidade de cada um é rap. Só não curto quando o cara fala o que não é. Sendo ritmo e poesia, contanto que tenha batida e ritmo, estímulo mental, facilita o cara ter a escolha dele (na comunidade), o acesso ao estúdio pra gravar uma voz. Rap é rap e pop é pop." 

Veterana do rap em São Paulo, com doze anos de estrada, a banda Pentágono atribui a popularidade à demanda criada pela internet. "A continuação do trabalho através das gerações é importantíssima para o rap e para qualquer estilo musical. Hoje é bem mais fácil produzir, muitos grupos têm estúdios próprios, mas em contrapartida é mais difícil se destacar pela quantidade de artistas que têm no mercado. Percebemos que hoje o rap brasileiro é diferente do americano, cada vez mais temos elementos da nossa cultura misturados e incorporados nas canções e isso só aumenta a qualidade e diversidade da nossa música." 

Das batalhas para as baladas

Outro aspecto que caracteriza as bandas é que as músicas que eram tocadas em eventos de rap, agora ganharam espaço e as bandas dividem a agenda entre batalhas de passinhos, no Rio, e baladas caras, em São Paulo. Papatinho explica que com a ConeCrew esse processo foi natural.

"A cena era muito diferente. O público consumidor do rap era a própria galera do rap, coisa de balada na Lapa. Era uma cena fechada, a gente dominava, conhecia ali. Em festa de rock, de funk, a gente ia por nossa conta, sem cachê, fazendo turnê, tocava em qualquer lugar e a gente ia sem frescura nenhuma. Acho que por conta disso, a gente tenha começado assim, acho que ajudou a levar pra outra galera. A gente também toca pra molecada, novinha, que não dá pra tocar até tarde e também toca pra coroa, mas isso é bom." 

"O primeiro show que a gente fez foi pra umas 1.000 pessoas e coube só a família e amigos de todo mundo. Era muito diferente. Hoje mudou da água pro vinho. De alguma forma, a gente conseguiu conquistar essa galera. Mas a gente não diferencia a relevância, a gente toca na favela, de graça e em bairro de boy", explica Adriel.