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Em BH, jovens sanfoneiros buscam a revalorização do instrumento

Liderado por Fred Penzin (dir.), o Trio Lampião aparece em imagem de divulgação - Divulgação
Liderado por Fred Penzin (dir.), o Trio Lampião aparece em imagem de divulgação Imagem: Divulgação

João Marcos Veiga

Do UOL, em Belo Horizonte

26/06/2013 12h41Atualizada em 26/06/2013 12h41

Os foles e baixos dão o tom das músicas, conduzem as danças e coreografias e aquecem o coração dos amantes da festa. Com diferentes nomes no Brasil – gaita para os sulistas, sanfona para os nordestinos ou simplesmente acordeão – o instrumento ganha destaque no mês de junho. Essencial para uma boa festa junina, o sanfoneiro é mais disputado do que moça bonita solteira em barraca de beijo nesses eventos.

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Há uma procura muito grande de trios de forró nessa época do ano, chegando a um aumento de 300% nos shows em comparação ao restante do ano. Hoje em dia, existe uma nova geração que quer tocar sanfona

Danilo Castro, sanfoneiro do Trio Gandaiêra

Apesar de relatar a concorrência e a descaracterização trazidas pela presença do sertanejo, arroxa e até do pop nas festas juninas, Danilo Castro não tem o que lamentar. “Há uma procura muito grande de trios de forró nessa época do ano, chegando a um aumento de 300% nos shows em comparação ao restante do ano”, contabiliza o sanfoneiro do Trio Gandaiêra, que atua em Belo Horizonte. “Quando procurei professores em BH para aprender, há mais de 10 anos, a grande maioria dos alunos eram adultos, pessoas mais velhas. Hoje em dia, existe uma nova geração que quer tocar sanfona”, lembra.
 
Vocalista e zabumbeiro do Trio Lampião, o grupo de forró pé de serra com mais de 10 anos de estrada, Fred Penzin se espelha tanto nos fundadores do cancioneiro nacional quanto em destaques da nova geração. “O Dominguinhos é sem dúvida uma referencia para todos que amam o instrumento. E hoje no Brasil temos muitos sanfoneiros que levam sua escola à frente, como Mestrinho, que acompanha Elba Ramalho, Cezzinha Thomaz, que tem um trabalho muito bonito no nordeste, Toninho Ferragutti em São Paulo, e Lucas Viotti em Belo Horizonte”, lembra.

Sanfona em diferentes palcos
Belo Horizonte vem se firmando nos últimos anos como importante celeiro da música instrumental através de inúmeros festivais do gênero que integram a agenda cultural da cidade e dão espaço cada vez mais nobre para o acordeão. Em maio, a capital mineira recebeu o Festival Internacional de Acordeão, com atrações como Vince Abbracciante Duo (Itália), Miroslav Lelyukh (Rússia) e Renato Borghetti Duo (Brasil). Em junho, a cidade recebeu a Festa da Música, tradicional evento de música instrumental da cidade, trazendo na programação sanfoneiros como Bebê Kramer, Marcos Nimrichter e o próprio Lucas Viotti.

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Luiz Gonzaga foi o principal sanfoneiro do país, seguido por Dominguinhos, que modernizou o estilo, Sivuca, com seu acordeão sinfônico, e Oswaldinho, com um acordeão inovador. Mas ainda falta em Minas uma universidade de música que tenha a sanfona no currículo.

Lucas Viotti, sanfoneiro das bandas Baião Caçula (forró), 4 na Roda (choro e samba), das bandas do cavaquinhista Warley Henrique e do violeiro Tau Brasil, Lucas Viotti Trio e Orquestra Ouro Preto

Para Lucas Viotti, que começou a tocar há 10 anos com o instrumento que era de sua mãe e se dedica a várias bandas, o acordeão representa todo um povo e cultura. “Luiz Gonzaga foi o principal sanfoneiro do país, seguido por Dominguinhos, que modernizou o estilo, Sivuca, com seu acordeão sinfônico, e Oswaldinho, com um acordeão inovador", diz.

Para ele, atualmente o forró e o sertanejo são a maior porta de entrada de novos acordeonistas, pois são mais difundidos entre os jovens. "Depois disso, alguns deles, assim como aconteceu comigo, buscam outras vertentes”, aponta o músico.

Mesmo percebendo essa valorização e a grande procura pelo instrumento, Lucas sente falta de incentivos mais concretos. “Ainda falta em Minas uma universidade de música que tenha a sanfona no currículo. Os novos acordeonistas, em sua maioria, são autodidatas e se acomodam. Poucos realmente estudam e levam isso à frente, até porque a música atualmente não dá muita renda para que a pessoa viva dela.”

Sanfona nas escolas
Sarah Assis vem batalhando para mudar essa realidade. Graduada em Música na UFMG, ela é sócia-proprietária do Ei (Estúdio Interativo) espaço que será inaugurado em breve. Para a professora de 35 anos, a difusão recente da sanfona está relacionada ao centenário do ícone e mestre Luiz Gonzaga, celebrado em 2012, mas também a outros fatores, como trilhas sonoras e, sobretudo, pela característica do instrumento, que permite tocar qualquer estilo e até comandar sozinho uma festa.

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O acordeão foi inserido no Brasil através dos imigrantes e rapidamente ganhou nosso território. Como é um instrumento harmônico, melódico e rítmico, facilmente aceito pela sua bela sonoridade, notamos sua presença em várias classes sociais e períodos diferentes na história da música popular brasileira.

Sarah Assis, sócia-proprietária do Ei (Estúdio Interativo)

O acordeão tem sua origem na China, em 2.700 a.C., com o cheng, instrumento tocado até hoje na Ásia. Porém, sua consolidação e aperfeiçoamento aconteceram na Europa – as principais marcas são de fábricas italianas. “O acordeão foi inserido no Brasil através dos imigrantes devido a sua portabilidade e rapidamente ganhou nosso território, sendo incorporado aos ritmos regionais nordestinos e folclóricos”, explica Sarah Assis. “Como é um instrumento harmônico, melódico e rítmico, facilmente aceito pela sua bela sonoridade, notamos sua presença em várias classes sociais e períodos diferentes na história da música popular brasileira.”

Sarah também salienta a ginga e a pluralidade do instrumento. Integrante do grupo PROA, de rock instrumental, ela lembra também do bandoneón, instrumento similar ao acordeão eternizado pelo argentino Astor Piazzolla, mas com algumas particularidades mecânicas. Nesta época, no entanto, os temas juninos estão na ponta do dedo. No próximo mês, ela deve tocar novamente no Arraiá da Casinha, festa da qual participa desde 2011. No ano passado, 5 mil pessoas estavam posicionadas quando ela pisou no palco, trazendo nos braços a presença mais aguardada da noite: o acordeão.

Os trios Gandaiêra e Lampião se apresentam nesse fim de semana em Belo Horizonte.