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Banda homenageia pai de Cazuza e holograma agrada público em SP

Patricia Colombo

Do UOL, em São Paulo

01/12/2013 09h33

Se não há como evitar a morte, pelo menos há tecnologia para homenagear quem já se foi. Tal pensamento foi a base para a realização da segunda apresentação musical com holograma no país, sucedendo a de Renato Russo em Brasília no final do mês de junho.

O “ressuscitado” da vez foi Cazuza, que morreu aos 32 anos em 1990, em decorrência do vírus HIV, e que completaria 55 anos em abril de 2013. O show de duas horas no Parque da Juventude, em São Paulo, foi focado nos hits do compositor carioca, teve 20 minutos de holograma (podendo entrar no Guinness World Records por tempo de atividade de tal recurso no palco) e contou ainda com uma homenagem ao pai dele, João Araújo.

“Quis o destino que o dia de hoje fosse o de homenagem a Cazuza e também o do falecimento de seu pai, João, um homem forte e que foi extremamente importante para a música brasileira”, disse o produtor Nilo Romero, no início do show. Araújo, fundador da gravadora Som Livre e uma das mais renomadas figuras da indústria musical no Brasil, morreu aos 78 anos neste sábado (30), vítima de uma parada cardíaca. O enterro foi realizado no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro. Tanto ele quanto Lucinha Araújo, sua mulher e mãe de Cazuza, estavam a caminho da capital paulistana e, segundo idealizador Omar Marzagão, João “foi a primeira pessoa a dar o sinal verde” para a elaboração da apresentação. 

Com a homenagem de Romero e de toda a equipe envolvida, o GVT Music Live – Show Cazuza teve início às 21h, sob leve garoa, com a execução de trechos de alguns sucessos em versão instrumental. Logo na sequência, a cantora Gal Costa subiu ao palco para comandar “Brasil”. A participação dela, interpretando também “Codinome Beija-Flor” e “Eu Preciso Dizer que Te Amo” em outros dois momentos, foi um dos pontos altos da noite.

Formada por amigos pessoais e parceiros musicais de Cazuza, a banda contava com o saxofonista George Israel (um dos envolvidos no projeto e o responsável pela escolha dos integrantes), Leoni, Nilo Romero, Arnaldo Brandão, Rogério Meanda e o baterista Guto Goffi. Além de Gal, figurou também como convidado o cantor Paulo Ricardo, que interpretou “Ideologia”, “O Nosso Amor a Gente Inventa”, “Solidão que Nada”, “Ponto Fraco”, “Blues do Ano 2000” e “Blues da Piedade”.

Embora os grandes hits no setlist estivessem, até então, recebendo retorno positivo da plateia de quase 30 mil pessoas (a expectativa da organização era a de atrair em torno de 40 mil), o momento mais aguardado era o do “retorno” do cantor, por meio do tão comentado holograma em 4D que levou cerca de cinco meses para ficar pronto. Às 22h27, logo após “Vida Louca Vida”, cantada por Leoni, Arnaldo Brandão e George Israel, a banda se retirou do palco e os instrumentos foram rearranjados no espaço. Com “Exagerado”, o Cazuza do século 21 entrou em ação.

“Faz Parte do Meu Show”, “Amor Amor”, “O Tempo Não Para” e “Brasil” completaram o repertório. Os trejeitos eram os mesmos e o figurino idem (uma faixa na cabeça, calça jeans colada, uma camisa estampada por cima de uma regata branca; ao final apenas a regata e o jeans junto a uma bandeira do Brasil). A voz, claro, certamente a mesma já que o áudio foi extraído dos fonogramas originais. Mas o conceito de simular a sensação de um show do músico por meio de tal tecnologia (como era a intenção dos envolvidos) deixou um pouco a desejar.

Ainda que com a presença da banda auxiliando no aspecto de clima ao vivo, a junção do holograma com o áudio de estúdio deu sensação de que aquilo era o que realmente era: uma ficção na qual você não esquecia que se tratava apenas de uma ficção. É óbvio que ninguém esperaria que uma imagem em 4D pudesse representar fielmente toda a força de um artista real no palco, mas alguns aspectos poderiam ter sido melhorados para construir uma atmosfera mais fantasiosa e, assim, mais proveitosa dentro do conceito do próprio evento.

A localização do holograma, por exemplo, foi o principal problema. Ao optar por situar Cazuza em um espaço no fundo do palco, a organização distanciou ainda mais o recurso dos fãs. Muitos, inclusive, reclamaram da dificuldade em conseguir enxergar, tendo que acompanhar apenas pelo telão. Era por ele, inclusive, que dava para perceber como a imagem do cantor ficava em tamanho menor se comparada aos integrantes em carne e osso que estavam mais à frente do palco - o deslocamento dos músicos também prejudicava ainda mais a visibilidade.

“Eu sei que é um holograma, uma animação, mas não posso dizer que senti algo diferente, como se ele [Cazuza] estivesse entre nós. Mal conseguíamos ver daqui, na lateral”, disse Octavio Corrêa, de 19 anos, que estava na grade do espaço aberto ao público (havia uma pista VIP em frente ao palco). Wallace Roi, de 48 anos, assistiu Cazuza ao vivo nos anos 80, na capital paulista, e concorda. “Foi até legal conseguir ver um pouco da tecnologia”, diz. “Mas acho que um show dessa natureza inevitavelmente acaba sendo mais frio e mais programado. Cazuza tinha energia e espontaneidade.”

Selo de aprovação
Apesar de tais questões, uma grande parte do público, composto em sua maioria por jovens, pareceu bastante satisfeita com o espetáculo. Carolina Silva, de 23 anos, nasceu no ano de morte do cantor e compositor carioca e se disse altamente emocionada. “Eu achei que nunca teria uma oportunidade dessas, já que não conseguir ver um show dele na época”, afirmou.

Alizla Emanuela, de 15 anos, chegou ao local às 17h e estava posicionada na grade durante a apresentação. Tendo conhecido a obra do cantor aos seis anos de idade por influência de seu pai, disse amar “a verdade que ele colocava nas canções” e ter aproveitado muito o holograma. “Nasci muito tempo depois da morte dele, então foi demais poder ter visto isso”, contou.

E teve ainda quem encarou o avião rumo à capital paulista apenas para a apresentação. Foi o caso de Liliane Araújo, de 36 anos, que chegou de Salvador neste sábado (30) e voltou para o aeroporto, ainda extasiada, logo após o término do evento. “Era uma falta que eu sentia nunca ter podido ver Cazuza”, conta. “Quando fiquei sabendo do holograma, imediatamente comprei minha passagem. Acho que essa foi a forma que encontrei de compensar. Não dá para pedir ele de volta, infelizmente, mas esse show foi lindo.”