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Na terra do metal melódico, grupo faz forro universitário na Finlândia

Guilherme Tagiaroli

Do UOL, em Helsinque*

21/12/2013 07h00

Existe uma teoria --fajuta-- de que o nome forró veio da junção de duas palavras do inglês: for all (para todos). Independente da veracidade da tese, o gênero musical nascido no interior do Nordeste tem se mostrado universal e foi encontrar adeptos a mais de 10 mil quilômetros de seu país de origem: a Finlândia, conhecida pelas bandas de metal melódico. Trata-se da Mirkka & Madrugada, um grupo de forró composto apenas por finlandeses.

A banda foi formada em 2006, mas as raízes estão ligadas diretamente com o boom do forró universitário na região Sudeste do Brasil no início dos anos 2000, quando grupos como Falamansa, Rastapé e Bicho de Pé despontavam no cenário nacional. "Meu primeiro contato com o gênero foi durante um intercâmbio que fiz no Brasil em 2000", disse ao UOL Mirkka Kivilehto, vocalista da Mirkka & Madrugada, em bom português.

O amor não foi à primeira vista. Após voltar para seu país impressionada com o Brasil, ela aprendeu português na faculdade e começou a frequentar em 2002 aulas de capoeira na capital da Finlândia. Foi lá que conheceu os integrantes do grupo e aprendeu um dos propósitos do ritmo. "Tinha muitos eventos de capoeira e, durante a noite, os brasileiros queriam dançar forró para conhecer melhor as meninas finlandesas", contou. Como ela sabia português, tinha mais facilidade em pegar as letras e virou a "cantora oficial" das festas.

As cantorias iam madrugada adentro. Os únicos elementos do ritmo durante as festas eram um triângulo e uma zabumba. Em 2006 foi criada a Banda Madrugada --o nome faz menção às noites etílicas em que eles tocavam nas festas. Recentemente, o grupo resolveu mudar o nome para Mirkka & Madrugada. "Depois de começarmos a fazer músicas próprias em finlandês, passamos a pensar mais no nome. Como Banda Madrugada não quer dizer nada para os finlandeses, resolvemos pegar meu primeiro nome para dar uma referência e deixamos Madrugada para não perder a conexão com a língua portuguesa".

A banda é composta por sete pessoas e segue o script de grupos de forró modernas: zabumba, cavaquinho, guitarra, triângulo, baixo e sanfona. O único elemento diferente do ritmo brasileiro é que eles contam com uma viola (instrumento da família do violino), o que confere ao grupo uma sonoridade bem característica.

Carreira
Apesar de o forró tradicional falar de amor e tristeza e, às vezes, utilizar o sertão e a seca como panos de fundo, a versão finlandesa do gênero não foge muito à regra, segundo Mirkka. "Acho que o forró tem bastante relação com a música finlandesa, pois trata a melancolia de jeito leve, de como lidar com a saudade. Ao mesmo tempo que a temática é parecida, os instrumentos são bem diferentes", disse. "Talvez por essas semelhanças que nós do grupo assimilamos de forma mais fácil a música."

A banda tem dois álbuns lançados. O primeiro, "Paiste", saiu em 2009 e conta com pelo menos três músicas em português, entre elas "Hora do Adeus" (cover de Luiz Gonzaga) e "Medo de Escuro" (cover do Falamansa). O segundo, chamado "Piiri" (que significa circuito), foi lançado em setembro deste ano e apenas uma das 12 canções é em português.

Apesar dos regionalismos de "Pau-de-arara" (de Luiz Gonzaga), como bodocó e matolão (sons bem difíceis para o finlandês), Mirkka se sai bem nos vocais. "No início só cantávamos músicas brasileiras. Depois o público começou a pedir canções em finlandês, eles gostavam bastante, mas não entendiam nada; Agora, eles já conseguem assimilar melhor".

O álbum ainda conta "Hakaniemen markkinat" (Feira de Hakaniemen), uma música instrumental que faz referência à "Feira de Mangaio", de Sivuca e Glória Gadelha; "Antaa Mennä" (abandonar, em tradução livre), um xote sobre um amor que não deu certo; e "Sinä yönä" (à noite, em tradução livre), que abre o disco e faz o caminho contrário: trata de um amor que parecia impossível, mas que numa noite é correspondido. Ambas músicas são composições de Mirkka Kivilehto.

Mesmo com uma banda estruturada, a Mirkka & Madrugada faz dois shows por mês e, às vezes, eles próprios organizam apresentações por Helsinque --inclusive, num desses eles conseguiram levara a banda Bicho de Pé para tocar na Finlândia. Ninguém vive exclusivamente para o grupo. As formações dos integrantes são bem variadas: há uma advogada, um sociólogo e até um doutorando em ciências da religião.

"O forró é muito marginal e meu marido trabalha com música, o que, às vezes, torna nossa situação financeira instável. A música para gente é mais hobby, mas poderia ser algo mais profissional. Se alguma das nossas canções fizesse muito sucesso, eu me dedicaria mais", disse Mirkka, que trabalha como advogada de um sindicato que reúne músicos e artistas. "Vamos fazer shows sempre que alguém pedir."

*O jornalista viajou a convite da Embaixada da Finlândia no Brasil