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Otimista, disco perdido de Johnny Cash traz retorno às raízes country

  • Capa de "Out Among The Stars", novo disco de músicas inéditas de Johhny Cash

Leonardo Rodrigues

Do UOL, em São Paulo

25/03/2014 14h20

Disco “perdido” de Johnny Cash (1932-2003) nos anos 1980, “Out Among the Stars” chega às lojas nesta terça-feira (25) trazendo um até então desconhecido aceno de esperança em meio a um dos períodos mais difíceis da carreira “homem de preto”. Gravado em 1981 e, principalmente, em 1984, época em que voltou a usar drogas e permaneceu distante das paradas de sucesso, o álbum foi produzido por Billy Sherrill, especializado em penetrar nas raízes da música country.

Amparado pelo amigo, Cash pode ser enfim ser Cash, como há tempos já não o fazia. Limpa e sem excessos, a produção retorna ao estilo rústico dos anos 1950, descartando a qualquer resquício de sonoridade oitentista. A ausência de "modernismos"  também é clara na escolha do repertório, que ignora covers de artistas contemporâneos --comuns em seus álbuns da época—, trazendo versões apenas de compositores de Nashville e ícones do gênero, como Richard Dobson ("Baby Ride Easy") e Hank Snow (“I'm Moving On”, com participação de Waylon Jennings).

As letras também relembram o passado, juntando as velhas histórias do homem do campo fora da lei, com passagens de bebedeiras, brigas, espiritualidade, amores, e agora também de família. Cantadas com seu tradicional vozeirão de barítono, as faixas são impregnadas por um tom otimista que pouco dá pistas sobre o momento difícil que Cash atravessava na época, após ter mais uma recaída no vício em anfetaminas.

Para os fãs da clássica “Jackson”, com June Carter, há ainda os novos e belos duetos de “Baby Ride Easy” e “Don't You Think Our Time Will Come”, que trazem frescor, como se o tempo (e o amor) jamais tivesse passado. O mesmo frescor traz a singela balada "After All", em que Cash canta com a emoção sóbria que seria exposta anos mais tarde, em sua bem-sucedida "american series".

Todo esse louvável esforço de voltar às origens, no entanto, surgiu estranho aos olhos da Columbia, que via no músico uma espécie de fóssil vivo do Tennessee: velho e incompatível com o gosto urbano da geração pós-MTV.

Mesmo sendo um dos registros mais interessantes de Johnny Cash nos anos 1980, os rolos de fita acabaram engavetados pela gravadora. Trinta anos depois, coube ao filho do casal Cash, John Carter Cash, descobrir --apenas em 2012-- e trazer à tona as gravações. Segundo John, seus pais tinham o hábito de guardar tudo, de recortes de jornal a rolos de fita. Ou seja, para alegria dos fãs, provavelmente há mais pérolas e boas lembranças por vir.

O álbum está disponível para audição gratuita no site da Sony.

Confira um faixa a faixa de “Out Among the Stars” feito por John Carter Cash, a pedido do jornal britânico “The Guardian”.

1. “Out Among The Stars” (Adam Mitchell)               
A faixa-título é uma música poderosa. Triste, mas cheia de significado. E o título pode significar ainda mais. A música em si lida com a tristeza, trata de uma perda. E esse sentimento é algo que pode ser relacionado à nossa nossa própria sociedade moderna.

2. “Baby Ride Easy” (Richard Dobson)
Eu me lembro de meus pais cantando durante anos essa música nos shows do início dos anos 1980. Eles amavam essa música. Para mim, é tão poderosa quanto “Jackson”. Que bela benção é poder sentir e ouvir a energia e o espírito dos meus pais, como se eles estivessem no aqui no mesmo quarto.

3. “She Used To Love Me a Lot” (Kye Fleming, Dennis Morgan, and Charles Quillen)
Para mim, essa música toca profundamente em ressonância dentro do meu espírito. Consigo ouvir a voz de meu pai, seu tom de voz, a sua força. Eu ouço o seu espírito se elevando quando ele canta essa música. E ele a cantou em apenas uma tomada. Não precisava cantá-la novamente.

4. “After All” (Ed Bruce and Patsy Bruce)
Não é uma canção típica de Johnny Cash. Não é algo que ele normalmente cantasse. Seu alcance vocal aqui é extenso. O espírito da música é como se fosse algo de outro estilo, algo que ele não fazia. É uma gravação única.

5. “I’m Movin’ On” (Hank Snow)
Lembro de estar no estúdio no dia em que meu pai gravou essa música com Waylon Jennings. Waylon era figura fácil na cidade – sempre parava em qualquer pequeno estúdio apenas para dizer "olá" aos amigos. Soa como algo verdadeiro, poderoso, como dois amigos se divertindo juntos.
 
6. “If I Told You Who It Was” (Bobby Braddock, Curly Putman)
Quando eu ouvi pela primeira vez, eu ri alto. Que divertido, que energia, que espírito. Meu pai tinha muita amizade com muitas pessoas no mundo da música, e é uma bênção ter aqui uma aparição da grande comediante Minnie Pearl.

7. “Call Your Mother” (Cash)
É uma canção que meu pai escreveu para si mesmo. É realmente do seu coração. A primeira coisa que ele me ensinou quando eu era jovem foi honrar a figura da mãe e do pai. Ele realmente fez e viveu isso. Ele ficou perto de seus pais durante toda a vida. Ele amava a mãe dele.

8. “I Drove Her Out of My Mind” (Gary Gentry, Hillman Hall)
Se você quiser rir em voz alta e conhecer mais sobre o senso de humor do meu pai, escute “I Drove Her Out of My Mind”. É uma música divertida. Não consigo imaginar outra música em que a pessoa que está contando a história ri sobre cometer suicídio e matar a garota que ele ama. É único, diferente de tudo que meu pai gravou.

9. “Tennessee” (Rick Scott)
Meu pai era um verdadeiro patriota, e “Tennessee” mostra isso. Ele realmente amava o estado onde viveu. Tennessee significou muito para o meu pai, e ele sempre se manteve fiel. Viveu em Hendersonville, Tennessee, de 1967 até o fim da vida.

10. "Rock and Roll Shoes" (Paul Kennerley, Graham Lyle)
Essa música traz de volta para mim uma energia que meu pai tinha no início de 1980, que é verdadeira e forte. Ela me faz lembrar meu pai rindo e, é claro, lembra de seus anos de início de carreira. A grande criatividade, o espírito de amor e de música que ele tinha e ficou com ele até o fim. Adoro “Rock and Roll Shoes”. É uma música divertida.

11. “Don’t You Think It’s Come Our Time” (Paul Kennerley, Graham Lyle)
Para mim, é como algo de outra era. A energia e o espírito dos meus pais nessa gravação é algo poderoso que, quando escuto, fica comigo. Havia chegado a hora para o amor deles. Realmente havia.

12. “I Came to Believe” (Cash)
Meu pai estava sofrendo no início dos anos 1980. No final de 1983, ele passou por uma clínica de reabilitação no Betty Ford Center. Enquanto estava lá, ele escreveu “I Came to Believe”. Para ele, era como se estivesse dando toda a sua vida e espírito a Deus. Essa música é muito pessoal e verdadeira. Embora ele tenha regravado no fim da vida com Rick Rubin, esta é a primeira vez que ele a gravou. Que bênção ter isto e ouvir a sua voz forte e verdadeira.

ESCUTE “OUT AMONG THE STARS”

Tradutor: bem-sucedido