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Americanos usam vaquinha online para fazer desfile de Carnaval em Chicago

Desfile da Evanston Escola de Samba em Chicago - Divulgação
Desfile da Evanston Escola de Samba em Chicago Imagem: Divulgação

Guilherme Solari

Do UOL, em São Paulo

01/07/2014 07h00

Quando é perguntado se gringo tem samba no pé, o americano Matthew Rarey é categórico: "no pé e na alma!". Ele é presidente da Evanston Escola de Samba, comunidade de um subúrbio ao norte de Chicago que organizou um financiamento coletivo na internet para fazer um desfile de Carnaval durante o 4 de Julho, dia em que se comemora a Independência dos Estados Unidos e um dos feriados mais tradicionais de lá.

"A escola considera o samba como música brasileira, mas também como música norte-americana", disse Rarey ao UOL. "Celebramos a diversidade do nosso país e a importância das culturas estrangeiras aqui em Chicago e nos Estados Unidos." A Evanston Escola de Samba levantou cerca de US$ 3.700 (R$ 8 mil) em doações para o desfile.

A escola foi fundada em 2003 em Chicago, depois de o americano Chris Hasselbring viajar para o Brasil e se apaixonar pelo país. A transição do ritmo do ensolarado Rio de Janeiro para a chuvosa Chicago foi surpreendentemente tranquila. "Historicamente, o samba foi criado como uma resposta aos problemas sociais no Rio de Janeiro, e temos os mesmos problemas aqui em Chicago e Evanston", disse Rarey. O presidente da escla conversou com o UOL sobre a sua iniciativa e o aumento do interesse dos americanos pelo Brasil ao longo do tempo, em particular pela Copa do Mundo.

UOL - De onde veio a ideia de criar uma escola que ensina samba em Chicago?

Matthew Rarey - Em 2003, o nosso fundador, Chris Hasselbring, viajou ao Brasil com Dill Costa, uma passista famosa da Mocidade Independente, para ver o desfile das escolas de samba no Rio de Janeiro. Ele ficou muito impressionado e diz que essa experiência mudou a sua vida. Voltou aos Estados Unidos com a ideia de fundar uma escola de samba aqui em Evanston. Historicamente, o samba foi criado como uma resposta aos problemas sociais no Rio de Janeiro, e temos os mesmos problemas aqui em Chicago e Evanston. Então, o Chris insistiu que essa escola deveria servir como um centro comunitário, onde todos os membros da comunidade poderiam aprender o samba como um caminho para uma mudança social. Mas colocar este projeto em prática tem sido difícil porque nos Estados Unidos não temos uma história ou uma cultura de samba.

Aula de percussão da escola em Chicago - Divulgação - Divulgação
Aula de percussão da escola em Chicago
Imagem: Divulgação

Com pouco ou nenhum contato anterior com a cultura e música brasileiras, como é a procura de estrangeiros?

Eu costumo dizer que temos duas comunidades brasileiras aqui em Chicago: uma de corpo brasileiro, e a outra, de alma brasileira (pessoas nascidas em outros países). Em Chicago existe uma comunidade brasileira animada (por volta de 30 mil pessoas), e muitos brasileiros participam das nossas aulas e desfiles. Mas temos outras pessoas que simplesmente adoram o Brasil. Por exemplo, aqui temos um grupo profissional de música brasileira fantástico, o Bloco Máximo, onde todos os membros são norte-americanos. A música da América Latina em geral é extremamente popular em Chicago. Muitas pessoas que gostam da música brasileira e que participam em nossas aulas também gostam de outros tipos de música ou percussão. E muitas pessoas que participam na Evanston Escola de Samba desenvolvem um profundo amor ao samba e à música brasileira.

A escola foi fundada em 2003. A percepção da cultura e da música brasileira mudou nesse período?

Esperamos que sim! Em 2003, foi muito difícil conseguir pessoas para vir às nossas aulas. Em Chicago, quase todos sabem que samba é Carnaval com passistas. Sim, gostamos da ideia, mas estamos trabalhando para utilizar o samba como um caminho para promover uma mudança social. Levou muitos anos para organizar a escola, e desfilamos pela primeira vez em 2009. Agora, em 2014, a cultura e a música brasileira estão mais populares em Chicago por causa da Copa do Mundo, e estamos recebendo muito mais pedidos para desfilar e fazer apresentações. Esperamos que agora o samba seja um aspecto importante na comunidade de Chicago.

Como foi a mudança dessa percepção com a aproximação da Copa do Mundo?

Agora a gente recebe muitas perguntas sobre o Brasil. Por exemplo: “O Brasil é só Carnaval e futebol?”, “por que os brasileiros estão protestando?” E, na EEDS, consideramos essas perguntas, essa curiosidade sobre o Brasil, um caminho para dialogar mais sobre as relações entre o Brasil e os Estados Unidos. Ficamos contentes porque podemos apresentar a cultura brasileira com sua beleza e complexidade. Inclusive escrevemos o nosso samba-enredo de 2014 sobre disso: a Copa do Mundo e as relações entre o Brasil e os Estados Unidos.

Como foi a ideia de criar um financiamento coletivo para a parada do 4 de Julho? Como foi a resposta?

A ideia foi simples! Nos anos anteriores, o nosso desfile saía muito caro. Então, neste ano, pensamos que seria melhor utilizar o [site] Kickstarter como uma forma de arrecadar fundos para o desfile e, desta forma, atingir um público mais amplo e com pessoas que apreciam a música brasileira. A resposta foi maravilhosa: arrecadamos US$ 3.700, com doações de todo o país.

Passistas de desfile organizado pela Evanston Escola de Samba - Divulgação - Divulgação
Passistas de desfile organizado pela Evanston Escola de Samba
Imagem: Divulgação
O Dia da Independência é um feriado tipicamente americano, mas também cabe um desfile de samba?

Uma pergunta excelente! EEDS considera o samba como música brasileira, mas também como música norte-americana. Celebramos a diversidade do nosso país e a importância das culturas estrangeiras aqui em Chicago e nos Estados Unidos. O nosso desfile no Dia da Independência é uma competição. Tanto os participantes como o jurado do desfile nos estão dando a impressão de que essa perspectiva é importante. De cem participantes, temos ganhado o título de vice-campeão no desfile nos dois últimos anos. Além disso, há outros grupos diversos no desfile, como mexicanos, porto-riquenhos, e chineses. O Dia da Independência é um dia para celebrar todas as pessoas e culturas nos Estados Unidos.

O que você aprendeu em seu tempo à frente da Evanston Escola de Samba?

Aprendi o português em 2009 e, quando entrei a Evanston Escola de Samba em 2010, sabia muito pouco sobre o samba. Estar envolvido com a EEDS tem sido estar envolvido com a cultura brasileira em geral: minha esposa e eu moramos no Brasil por um ano (Bahia e Rio de Janeiro). Estudei com mestres baianos e cariocas, e criamos uma programa de rádio sobre a música brasileira. Agora, sei que a música brasileira é muito importante nessa cidade; e o samba tem o poder de criar comunidades.