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"O mercado musical brasileiro é desigual e burro", diz Toninho Ferragutti

O violonista Marco Pereira e o acordeonista Toninho Ferragutti, que fizeram o show de encerramento do Festival Mimo, em Ouro Preto - Divulgação
O violonista Marco Pereira e o acordeonista Toninho Ferragutti, que fizeram o show de encerramento do Festival Mimo, em Ouro Preto Imagem: Divulgação

Carlos Minuano

Do UOL, em Ouro Preto*

01/09/2014 13h13

“O mercado musical brasileiro é uma aberração, é desigual e burro”, afirma o acordeonista Toninho Ferraguti. Ele reclama que há muito espaço para um só gênero musical. “É como você ir ao mercado e só encontrar um tipo de arroz ou feijão, parte da população não está representada. Falta que esse público seja visto", defende Ferragutti. “É preciso cuidado com esse mercado, que é muito agressivo, é comprado, funciona como um cartel”, prossegue o músico. “Tem quem compre um dia inteiro da programação de uma rádio, para tocar um só tipo de música”.

Na opinião do virtuose do acordeom, esse cenário faz com que outros estilos musicais fiquem segregados a um circuito restrito, como se não tivessem audiência. Mas o Festival Mimo, de música instrumental, que aconteceu neste fim de semana (de 29 a 31 de agosto) em Ouro Preto, mostra que boa música ainda tem público, sim.

Nada de "Lepo Lepo" ou "Beijinho no Ombro". No Festival Mimo, o palco é de sonoridades mais sofisticadas, como o jazz, a música instrumental, erudita e world music. Milhares de pessoas lotaram todos os 46 concertos da 11° edição do evento, que pela segunda vez espalhou música da melhor qualidade por praças e igrejas da histórica cidade mineira.

É claro que fãs do axé, funk e outros gêneros mais populares e comerciais podem questionar, afinal, como determinar o que é bom ou ruim?

“Existe música ruim, sim”, responde a diretora do festival, Lu Araújo. “O problema é que se convencionou, no passado, pelas gravadoras, que a música de fácil assimilação é que poderia ser consumida.” Para ela, a questão da ausência de espaços para a música instrumental não está no consumidor. “Nunca tivemos um concerto cancelado por falta de público”, afirma. “Temos sempre que administrar o excesso de pessoas, igrejas com até mil lugares ficam pequenas”.

Lu garante, portanto, que o problema não é audiência. “Quando o espaço é criado, o público responde, é preciso repensar essa convenção de que o popular é que tem que tocar, que vende mais, afinal, tem lugar para todos. Música tem que ter alma”, diz a diretora do Mimo. Para ela, essa é a medida do que é bom.  Mas ela reconhece que algumas composições do gênero instrumental e erudito são mais delicadas e complicadas. 

Inserir o festival em cidades e espaços históricos, segundo ela, é justamente uma forma de auxiliar na compreensão e assimilação dessa música mais refinada.

E por falar em boa música, o Festival Mimo em Ouro Preto terminou em grande estilo. Um show, cheio de poesia e suíngue, do acordeonista Toninho Ferragutti e do violonista Marco Pereira, encerrou o evento na noite deste domingo, 31, na Igreja Nossa Senhora do Carmo.

A dupla apresentou o repertório do CD recém- lançado “Comum de Dois”. Segundo Marco Pereira, um encontro entre o violão e o acordeon. “É um projeto autoral, tem composições minhas e do Toninho, que mexem com uma rítmica essencialmente brasileira”.

Público jovem

Uma particularidade a ser comemorada no Festival Mimo é a presença de jovens no evento. Visivelmente foi a maior parte do público. Diferentemente dos concertos em espaços fechados nas grandes cidades, de ar mais sisudo, com públicos de mais idade, o Mimo, em Ouro Preto, foi marcado por uma atmosfera jovem.

O evento ganhou ainda um indisfarçável toque hippie, típico da cidade, repleta de repúblicas estudantis. Entre uma atração e outra, quem perambulasse por Ouro Preto também tinha como opção se embalar nas muitas rodas de música, com violão e percussão, que se espalhavam por praças e ruelas.

* O jornalista viajou a convite da organização do evento