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Saxofonista do Morphine quer reviver experiência da Virada Cultural de 2012

Vapors of Morphine: da esq. para a dir., Dana Colley, Jeremy Lyons e Jerome Doupree - Zack Smith/Divulgação
Vapors of Morphine: da esq. para a dir., Dana Colley, Jeremy Lyons e Jerome Doupree Imagem: Zack Smith/Divulgação

Marco de Castro

Do UOL, em São Paulo

20/09/2014 05h00

Classificado nos anos 1990 como um grupo de "low rock", um tipo de som minimalista (apesar de sofisticado) por não ter a presença de guitarra entre seus instrumentos, o Morphine inovou ao criar uma sonoridade com base em saxofone, bateria e baixo de duas cordas. Depois da morte do vocalista Mark Sandman, em 1999, a banda já passou por várias formações e a mais atual delas, chamada Vapors of Morphine, se apresenta gratuitamente neste sábado (20) em São Paulo, no Largo da Batata, como parte da programação do Mês da Cultura Independente.

A banda veio ao país em 2012, mas na ocasião trazia o nome Members of Morphine & Jeremy Lions. Fizeram um elogiadíssimo show gratuito em São Paulo, durante a Virada Cultural. "Havia muitos concertos por toda a cidade, com as pessoas caminhando durante 24 horas, dia e noite, para ver shows. Foi ótimo. Foi incrível ver tantas pessoas juntas em um lugar para curtir música", contou saxofonista Dana Colley, por telefone, ao UOL.

O Morphine surgiu em 1989 em Cambridge, no Estado norte-americano de Massachussets, e gravou cinco discos. No final dos anos 1990, estava conquistando popularidade ao redor do mundo. Suas músicas passaram a entrar na programação das rádios e seus videoclipes eram exibidos na MTV. A carreira da banda, no entanto, foi interrompida bruscamente pela morte do baixista e vocalista Mark Sandman, que sofreu um ataque cardíaco fulminante em 1999, durante um show na província romana de Palestrina, na Itália. 

Um ano depois da morte do líder, Colley e Billy Conway, segundo baterista que integrou banda, se reuniram com amigos e criaram a Morphine Orchestra, juntando ao todo nove músicos para tocar, principalmente, o quinto disco do grupo, "The Night", lançado após a morte de Sandman. Foi difícil manter nove músicos excursionando e a "orquestra" passou a se reunir esporadicamente (o que faz até hoje) para algumas curtas turnês.

Quando a morte de Sandman completou dez anos em 2009, Colley resolveu voltar a tocar as músicas do grupo como um trio, reunindo-se com o baterista original do Morphine, Jerome Deupree, e com o baixista Jeremy Lyons, e eles voltaram à Palestrina, onde fizeram um concerto em memória a Sandman. Agora, o trio se apresenta sob o nome Vapors of Morphine. "Somos o que sobrou [do Morphine], os vapores", explicou Colley. 

Na entrevista, Colley fala sobre como o Morphine poderia estar hoje, caso Sandman não tivesse morrido, e revela que o colega de banda amava o Brasil e até estudava português. "Era o idioma favorito dele".

UOL - Quando Mark Sandman morreu, em 1999, o Morphine estava preparando o lançamento do álbum "The Night" e se tornando famoso ao redor do mundo. Como você acha que a banda estaria hoje se Mark ainda estivesse vivo?

Dana Colley - Eu imagino que nós provavelmente ainda estaríamos tocando juntos, fazendo mais músicas e mais discos. Acredito na possibilidade de que nós sermos bem mais conhecidos do que nós éramos e do que nós somos. É difícil, para mim, dizer. É algo difícil de se imaginar. É uma coisa sobre a qual já pensei bastante, mas agora tento não pensar muito, porque a vida tem que continuar de qualquer jeito. Temos que ser realistas. 

Depois da morte de Mark, vocês se apresentaram como a Morphine Orchestra, o Members of Morphine e agora como Vapors of Morphine. Qual a diferença entre esses projetos?

Quando Mark morreu, "The Night" tinha acabado de ser finalizado e a parte instrumental do disco era muito extensa, com muitos instrumentos adicionais, e queríamos garantir e ter certeza de que o disco fosse ouvido ao vivo. Então, nos reunimos como uma banda de nove integrantes, a maioria deles amigos de Mark, que o conheciam ou haviam tocado com ele. Era mais para que o instrumental soasse como as músicas do disco e também para dizer adeus [a Mark], ter uma grande despedida em uma turnê pelo país, e depois tocando em Palestrina, que foi onde Mark morreu. O Morphine Orchestra se juntou para alguns shows em Boston, e ainda mantemos contato, mas é difícil fazer uma banda de nove pessoas sobreviver. 

Depois disso, Billy [Conway] e eu decidimos voltar ao estúdio e colaborar com Laurie Sargent. Ela estava gravando um disco solo naquele tempo, que acabou virando o primeiro disco do Twinemen, criado a partir de material que ela tinha escrito. Formamos um trio. Com o Twinemen gravamos cinco discos e fizemos turnês, mas não fizemos sucesso. Depois, montei uma banda com Monique Ortiz chamada A.K.A.C.O.D, com a qual gravei um disco e fiz uma pequena turnê. Tocamos em alguns festivais. Isso foi por volta de 2008, que era um tempo muito ruim para a música, devido à crise econômica daquele ano. As pessoas estavam se interessando menos por música, estavam mais preocupadas em tentar sobreviver. As gravadoras estavam falindo.

E estava chegando o aniversário de dez anos da morte de Mark Sandman. Eu quis montar um trio de novo em memória ao ano de sua morte. Então juntei forças com o baterista original Jerome Dupree e com Jeremy Lyons, e voltamos à Palestrina para fazer o show de dez anos da morte dele, como Members of Morphine. Agora mudamos o nome para Vapors of Morphine em referência ao fato de que nós somos o que sobrou, os vapores. Mas é ainda a mesma banda, as mesmas músicas.

Você tem hoje projetos não relacionados ao Morphine?

Nós sempre temos outros projetos. Eu escrevo músicas para shows infantis de marionetes, colaboro também com um artista de Berlim, Sash, com quem gravei um EP de sete músicas chamado "The DeltaHorse", e ainda estou colaborando com um cara chamado Ken Winokur, que criou a Alloy Orchestra, uma banda com músicos que tocam acompanhando filmes mudos, como "Nosferatu". Nós faremos uma turnê quando eu voltar [aos EUA], tocando junto com um filme mudo chamado “Psychedelic Cinema”.

Como Jeremy Lyons entrou na banda? Como vocês decidiram: "Esse é o cara que substituirá Mark"?

Eu não diria substituir Mark, não é isso. É mais: "Quem poderia tocar com a gente, aprender as músicas do Morphine e tocá-las ao vivo?". Jeremy morava em Nova Orleans, e em 2005 o furacão Katrina atingiu a cidade e fez muita gente se mudar. Ele então foi com sua família para Cambridge, e assim nos conhecemos e nos tornamos amigos, começando a tocar juntos. Percebi que ele era ótimo para tocar com slide e era ótimo para aprender músicas. Pensei: "Esse cara deve conseguir fazer o serviço". E perguntei: "Você está a fim de aprender algumas músicas do Morphine?". Ele disse: "É claro". E um amigo nosso fabricou para ele um baixo slide de duas cordas que captava, da melhor forma possível, o som da banda. Substituir Mark não era o objetivo. O objetivo era fazer com que a música [do Morphine] pudesse ser ouvida e vista de novo.

Vocês têm planos para escrever material novo e gravar discos como o Vapors of Morphine?

Nós temos tocado muito e temos muitas gravações ao vivo que estamos tentando transformar em um novo disco. Temos muito material e precisamos decidir o que fazer com isso. Muito de nossa música vem do improviso, das jam sessions. Então pretendemos nos juntar uma hora para escrever músicas e gravar, assim como nos juntamos para tocar, e ver o que acontece.

Esse é o segundo concerto gratuito que vocês farão em São Paulo. O que vocês lembram do primeiro e o que vocês esperam para o show deste sábado?

Na primeira vez que viemos era um festival de cultura [Virada Cultural], e havia muitos concertos por toda a cidade, com as pessoas simplesmente caminhando durante 24 horas, dia e noite, para ver shows. Foi ótimo. Foi incrível ver tantas pessoas juntas em um lugar para curtir música. Não sei se será tão grande quanto aquilo, mas estou certo de que viveremos uma experiência parecida de novo. E o Brasil era um lugar importante para Mark. Ele estudava português, já viajou para cá. Queria muito que o Morphine tocasse no Brasil. Então, para nós, vir aqui é muito especial, significa muito. A música, as pessoas, a cultura. É uma ótima oportunidade para dividir isso com as pessoas em São Paulo. Mark amava idiomas, e o português era o seu preferido, estava estudando para aprender. Ficava falando: "Temos que tocar no Brasil, temos que tocar no Brasil".