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Prêmio Multishow 2014 se consolida como reflexo de uma audiência popular

Mariana Tramontina

Do UOL, no Rio

29/10/2014 10h43

Os votos do público que elegeu os vencedores do Prêmio Multishow 2014, que aconteceu nesta terça-feira (28) no Rio de Janeiro, representam bem a audiência média do canal a cabo: jovens que andam de mãos dadas com a música popular do Brasil. Dessa vez, Thiaguinho desbancou Nando Reis e Lulu Santos, enquanto Paula Fernandes tirou a chance de Pitty e Marisa Monte colocarem as mãos no troféu. O Sorriso Maroto não deu nem espaço para O Rappa e Skank.

Apesar de abraçar a música mainstream e os artistas que frequentam as FMs em todos os gêneros, o Prêmio Multishow tem se consolidado a cada ano como o reflexo de uma audiência que carrega suas playlists principalmente com canções sertanejas, de pagode e axé --a exemplo da lista de vencedores escolhidos pelo público.

Viagem aos anos 90

Neste ano, o evento fez uma enigmática viagem aos anos de 1990, quando provavelmente grande parcela de seu público alvo sequer havia nascido. Assim, é coerente relembrar o que houve de mais representativo naquela época com foco no seu telespectador --e o que, invariavelmente, colocou em perspectiva artistas e músicas que transformaram aqueles anos em uma década caricata.

Apostando em ícones fáceis daqueles tempos, o roteiro do show celebrou a obra de Cássia Éller, Legião Urbana e Mamonas Assassinas, atrações que jamais voltarão aos palcos por motivos óbvios. Marisa Monte e Lulu Santos, artistas que tiveram seu auge em meados dos anos 90 e que continuam em plena atividade, foram saudados em reinterpretações ao vivo, apesar de serem vistos como antiquados pelo público mais novo.

O evento, então, colocou no palco artistas que estavam presos em um limbo na memória afetiva da grande audiência. A dupla de funk MC Cidinho e Doca, do hit "Rap da Felicidade (Eu Só Quero é Ser Feliz)" (1994), ressurgiu no bonde que trouxe o axé do Terra Samba e seu "Carrinho de Mão" (1998), o rap de Gabriel o Pensador, com "Cachimbo da Paz" (1997), e o pagode do Art Popular e do Molejo, com "Bom-Bocado" (1995) e "Dança da Vassoura" (1997), respectivamente.

Na ala sertaneja --um transatlântico de sobreviventes na música brasileira--, Zezé Di Camargo e Luciano relembraram os áureos tempos de "Você Vai Ver" (1994). Bruno e Marrone, por sua vez, entoaram seu grande hit "Dormi na Praça" (1994), enquanto Daniel fez uma versão de "Estou Apaixonado" (1996), sucesso de quando fazia dupla com João Paulo.

No contexto do Prêmio Multishow, a música brasileira dos anos 90 soa como uma grande piada interna, que está ali a serviço da diversão e do catálogo do karaokê mais próximo. Ignorou-se que aquela década foi de extrema relevância para o rock brasileiro de massa, lançando nomes importantes como Raimundos, Planet Hemp, Chico Science & Nação Zumbi, O Rappa, Skank, Sepultura, Charlie Brown Jr. e Los Hermanos, entre outros que passaram batido pelo panorama apresentado no evento.

O que dá a entender é que essa pouca atenção do programa ao rock brasileiro também parece não fazer falta à plateia do Prêmio Multishow, responsável pela escolha dos principais vencedores por meio de votação aberta. Por isso, protestar pela falta desse gênero e até mesmo de certa ausência de qualidade musical em um show voltado ao gênero popular não faz sentido. É como sintonizar uma rádio sertaneja esperando ouvir uma banda de rock: é melhor procurar outro programa para assistir.