Em tempos de crise, ostentação dá lugar ao funk chavoso na periferia
O funk ostentação já não é mais o ritmo da vez na periferia. A novidade, impulsionada pelo momento de crise econômica, agora atende pelo nome de chavoso, um retorno às origens do gênero, mais afinada com a atual realidade nacional. "MC Guimê e MC Gui não tocam mais nas favelas. Eles agora são pop", diz Ronaldo Dias Viana, o MC Naldinho, 19, principal representante do estilo e morador da região leste de São Paulo. Ao invés de cantar sobre cordões de ouro e carros importados, a música que o MC faz fala sobre veículos populares e marcas mais em conta.
O nome chavoso surgiu da expressão "chave de cadeia", que se refere a uma pessoa propensa a causar problemas, e se transformou em uma gíria para identificar os garotos que são os mais descolados do bairro, que também podem ser chamados de "moleque chave". "Os meninos da periferia pegaram esse nome e transformaram em algo bom. Ou seja, se ele chamava a atenção da polícia é porque ele se vestia melhor do que os outros", diz Renato Barreiros, pesquisador sobre o estilo e ex-subprefeito do distrito de Cidade Tiradentes.
Identificar um chavoso, segundo MC Naldinho, é fácil. "Usamos bermudas de marcas como Quicksilver e óculos da Oakley ou Evoke. O boné não pode ser da New Era, de aba reta, que é de swag [vertente inspirada no rap ostentação norte-americano, que se espelha em artistas como Justin Bieber, Chris Brown, Lil Wayne e Soulja Boy]. Mas o principal elemento é o tênis com meia na canela", diz ele.
"Quando o chavoso faz algo muito legal, dizemos que ele chaviô", conta MC Boy, outro representante do estilo. "A marca registrada é a meia na canela. Pode ser preta ou branca. Quando é preta, chamamos Chaveta [de meia preta]", explica Naldinho.
O número de visualizações dos clipes dos chavosos no YouTube é significativo, girando na casa de 1 milhão de visualizações por música, mas ainda está longe do fenômeno MC Guimê. "País do Futebol", por exemplo, foi visto 54 milhões de vezes e "Suíte 14", hit de Henrique e Diego e o vídeo mais visto no YouTube brasileiro neste ano, teve 80 milhões de visualizações.
O clipe de "Ui Chavoso, Meia na Canela", de Naldinho, tem mais de 1,5 milhão de visualizações no YouTube. O vídeo foi filmado na comunidade, sem carrões ou modelos famosas, e custou menos de R$ 5 mil. É uma bagatela se comparado com as superproduções do funk ostentação do passado, que chegavam a custar até R$ 75 mil.
Ostentação possível
O estilo chavoso ganhou uma pesquisa, elaborada por Renato Barreiros, que dirigiu em 2012 o documentário "Funk Ostentação - O Filme". "Os bailes funk diminuíram na periferia. Agora o que rola são as festas nas ruas, chamadas de fluxo. MC Guimê transcendeu a periferia e virou ídolo do sertanejo universitário", diz.
Para Barreiros, o surgimento do chavoso tem a ver com a crise financeira, mas é também uma maneira da periferia se afirmar e dizer que não se identifica com o esbanjamento. "Os jovens continuam querendo comprar roupas de marca, ter o carro ou a moto própria. Mas ninguém precisa comprar Prada ou Ferrari. Pode ser óculos da Oakley ou um carro popular. É a ostentação possível", conta. "O Brasil não está às mil maravilhas e isso se reflete nos bailes. Mas ninguém faliu ou está pedindo esmola".
Danilo Barbosa dos Santos, o MC Boy, 24, autor do funk "Chavoso", define o estilo como uma "ideologia da favela". "A gente prega o funk de raiz, que fala do nosso cotidiano, de putaria, da vida na favela", diz. "Quero dizer que somos da favela mesmo, mas não somos otários. A base de tudo é o funk".
"Não precisamos copiar os americanos. Nunca precisamos disso. Digo 'não' à transformação do funk em pop", afirma ele, sobre comparações com o estilo swag, mais próximos dos norte-americanos.
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