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"Tenho a mesma raiz do Mano Brown", diz Naldo Benny sobre parceria polêmica

Leonardo Rodrigues

Do UOL, em São Paulo

18/11/2015 06h00

Quando está na estrada ou em estúdio, o carioca Naldo Benny, 36, faz um único pedido à sua equipe. Viciado na maromba, precisa ter sempre por perto uma academia de ginástica nem que sejam alguns halteres e uma quadra de basquete, onde quica sua bolinha.

A paixão do cantor pelo esporte está nos versos da primeira faixa de seu novo disco, "#Sarniô" –gíria corrente na favela da Maré, onde nasceu, que significa “fazer bem feito”--, que traz na capa um retrato multicolorido e cheio de formas assinado por Romero Britto.

No turbilhão de referências de “Benny e Brown”, Naldo, acompanhado do "irmão" Mano Brown, cita o astro LeBron James e os parceiros “Leandrinho Barbosa, campeão NBA” e “caboclo Varejão”, além do jogador de futebol Emerson Sheik.

Antes, adapta versículo bíblico (“Hoje com o Mano Brown na pura sintonia/Se não tivesse amor de nada valeria”), denuncia que é "anormal pros PM dois pretos de BM[W]" para arrematar: “E o meu respeito máximo vem pra representar/Talento nato, Romero Britto é classe A”.

Muita polêmica para uma música só? Não para um disco que também traz MC Guimê, Mr. Catra e o tremendão Erasmo Carlos. “A crítica não é fácil para ninguém. Mas faz parte”, diz um descontraído Naldo ao UOL, enquanto roça com os dedos seu inseparável trio de anéis de ouro, que compõem o visual de pulseira, relógio e calças “punk” rasgadas na altura do joelho.

“Mas [a parceria com Mano Brown] é uma coisa verdadeira. Polêmica é polêmica. Sempre vai existir. Até troquei uma ideia com ele sobre isso. Acho que tem a questão da opinião dos outros e o respeito.”

Nos encontramos umas 20 vezes no decorrer do processo da música. Não que a música tenha ficado em menor plano, mas a gente acabou se tornando amigos. De confidenciar lances da vida. Uma relação forte. Hoje a gente tem amizade de irmão. 
Naldo Benny, sobre a parceria com Mano Brown em “Benny e Brown”

Naldo não esconde. A ostentação faz parte de seu idioma “funk pop”, que parece emular o clima festeiro de churrascos na piscina e baladas VIP. Mais "light" e evangélico desde a infância, o autor dos versos chiclete “Vodca ou água de coco/Pra mim tanto faz” pode até não repetir a marra dos colegas MCs paulistas, mas nem por isso deixa de fazer melodias sobre suas posses e sobre sexo.

“Existe a minha fé e existe meu lado profissional. Por eu ser muito desprendido, falo o que acontece dentro do meu trabalho, nos lugares onde eu vou tocar. As pessoas bebem, se desejam”, diz Naldo, que, de álcool, só bebe vinho. E apenas em ocasiões especiais. Como a que espera um dia viver ao lado do rei Roberto Carlos.

“Eu tenho esta parada em comum com ele. Faço aniversário no mesmo dia. Até tenho um sonho de um dia participar de um lance dele.”

Veja abaixo os principais trechos da entrevista.

UOL – Sarniô traz Mano Brown, Erasmo, Catra, Guimé. Como foi juntar essa turma toda?
Naldo – A ficha caiu mesmo quando eu estava dando entrevista para uma rádio aqui em São Paulo, uns 15, 20 dias atrás. Pensei: ‘Pô, que projeto bacana que eu tenho em mãos”. O Erasmo Carlos eu já ouvia desde criança. Recebi na minha casa, cara. Ele foi ao meu estúdio. A gente ficou conversando, brincando. Como não tomo café, comprei uma cafeteira para ele. E ele falou: “Fiquei feliz de saber que a cafeteira foi comprada exclusivamente para mim. Está batizada agora. Caferasmo! Só eu bebo aqui” (risos).

Ele é muito simples. É de se ficar impressionado. Até o empresário dele me disse que o Roberto Carlos é a mesma coisa. E eu tenho esta parada em comum com o Roberto. Faço aniversário no mesmo dia que o ele. Até tenho um sonho de um dia participar de um lance dele. Só de ter essa atmosfera de “Roberto e Erasmo” no disco já é incrível.

E como conseguiu trazer o Mano Brown?
Uma vez eu tinha que fazer o festival Planeta Atlântida, no Sul, e o Brown estava lá fazendo outro show. A gente estava no mesmo hotel, e nos encontramos na porta do elevador. A galera dele falou: “Pô, esse aí é o Naldo”. O Brown falou: “firmeza”. Eu achei até estranho, mas, no momento que a gente apertou a mão, já foi legal.

Aí eu liguei para ele depois de um tempo. Pensei: “Por que não tentar?”. O cara me recebeu tão bem. E aí começou a ideia. A gente se encontrou umas 20 vezes no decorrer do processo da música. Não que a música tenha ficado em menor plano, mas a gente acabou se tornando amigos. De confidenciar lances da vida. Uma relação forte. Hoje a gente tem amizade de irmão.

A parceria foi atacada nas redes sociais, principalmente por fãs de Racionais. Como lidar com as críticas?
Acho que crítica não é fácil para ninguém. Mas faz parte. E eu vejo que as reações são parecidas. O Brown mesmo, um dia, dentro do estúdio, me contou que um cara foi falar com ele. E ele foi lá e xingou o cara. E, para outro, eu vi que ele escreveu: “Depois de 26 anos, eu não vou moscar”. Falou que o “Naldo é nóis”.

Acho que a nossa aproximação tem uma verdade. A gente tem uma raiz em comum. Ele sabe por tudo que passei para estar aqui. Achei bonito esse reconhecimento. O Brown é um cara muito inteligente. Muito puro. Ele tem aquela onda dele durão, mas tem muito uma onda de amor ao próximo.

No ano passado, a imprensa divulgou que você estava em crise financeira, que seu cachê tinha passado de R$ 120 mil para R$ 15 mil. Você se sente pressionado a voltar a fazer sucesso?
Sinceramente, eu não tenho essa pressão. Toco pro meu público tanto se for de graça quanto se for por muito dinheiro. O que foi colocado na mídia saiu de forma agressiva, maldosa, porque existem shows que você pode fazer com cachê bem alto e outros que não. E meu som se enquadra nisso. Tenho um formato de show menor, que posso tocar numa boate. Obviamente que não vou cobrar o cachê que cobro numa feira, com uma hora e meia de show e superprodução, em uma boate, quando vou com equipe reduzida.

Na música com o Brown, você fala de “preto andando de BMW”. Já sofreu rascismo?
Não tem como esconder que sou oriundo da favela. Nunca escondi isso. Se você vai dar sinal para o táxi, e você é loirinho, o taxista para. Se você é um moleque de aspecto negro, mais voltado para a favela, o cara não para.

Se eu chego no restaurante hoje, os caras me reconhecem porque sou o Naldo. Mas, se não fosse, talvez todo mundo me visse meio torto, com aquele olhar de “oh, o que você está fazendo aqui?”. São coisas que infelizmente fazem parte da nossa sociedade.

Depois do seu último disco, de 2013, você insinuou que viraria cantor gospel, que poderia até virar pastor. Ainda planeja?
Não. Eu deixei isso de lado porque acabou virando uma grande confusão. E é difícil para as pessoas entenderem. Um músico é sempre cheio de ideias, de energia. E ninguém é sempre fácil de entender. A gente é meio maluco mesmo (risos). Eu continuo com minha carreira secular, estou lançando CD novo. Essa é só minha religião [Naldo é evangélico]. Não tenho preconceito com nada. Com pessoas da umbanda, com o catolicismo, com os gays. Sou um cara muito desprendido. Vou muito pelo lado que Jesus pregou mesmo, que é o amor ao próximo.

Existe a minha fé e existe meu lado profissional. Por eu ser muito desprendido disso, falo o que acontece dentro do meu trabalho, onde eu vou tocar. As pessoas bebem, se desejam.
Naldo Benny, sobre ser evangélico e cantar sobre ostentação e sexo

Seu disco fala abertamente de sexo e ostentação. Isso não é paradoxal considerando sua fé?
Existe a minha fé e existe meu lado profissional. Por eu ser muito desprendido disso, falo o que acontece dentro do meu trabalho, onde eu vou tocar. As pessoas bebem, se desejam. Tem o lance de, de repente, o cara estar se beijando com a mulher mesmo antes de estar se beijando de fato, só com o olhar. As pessoas querem se divertir com bebida, querem extravasar, porque trabalham a semana inteira. Então eu só relato temas do ambiente em que vou tocar. É a realidade.

Já parou para pensar em como vai competir com o sertanejo?
Já parei, sim. Hoje, no Rio, eu estou sempre em primeiro ou segundo lugar há dois meses. E, em São Paulo, estou com a quinta faixa mais tocada. Eu ouvi de algumas pessoas de rádio aqui de São Paulo, de rádio de primeiro lugar de audiência, que eles precisam do meu som, para trazer um frescor para a programação. Eles tocam tanto um único gênero que é legal ter algo com uma sonoridade diferente, que de repente faça surgir uma nova onda. É uma honra para mim estar competindo ali, na frente de muitos sertanejos.

Você já gravou clipe fora, já falou que sonha com carreira internacional e agora traz o Romero Britto na capa. É evidente que você está pensando lá fora. O que eles têm que não temos?
A questão é do apoio à cultura. É bem diferente. Lá, os artistas grandes têm um Projac à disposição. No mercado norte-americano, você consegue falar para o mercado do mundo. Os acessos, as visualizações são bem maiores. Com isso, o que volta de recurso também é maior. Aqui é bem difícil para um artista lutar sozinho. Acho que o apoio é a grande diferença. As empresas deveriam apostar mais, afinal é um meio de publicidade.

O Naldo 2015 está mais para vodca ou água de coco?
(risos) Quando fiz essa música [“Amor de Chocolate”], eu era do mesmo jeito que sou agora. Já não era muito de beber. Bebo um vinho de vez em quando, quando a gente vai comemorar alguma coisa. Sempre fui muito saúde, malhação o tempo todo. Acho que continuo mais água de coco.

Lembro que escrevi essa música porque estava em um churrasco, na beira da piscina, e um cara falou para outro. “Quer um uísque?” Aí o outro falou: “Pega aquela com uma pedrinha de gelo de água de coco”. Daí que veio o estalo. Uísque com água de coco. Nunca tinha visto aquilo.