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"Respeita as mina": Rappers se unem para atacar gordofobia e machismo

Sara Donato e Issa Paz, criadoras do projeto Rap Plus Size - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
As rappers paulistas Sara Donato e Issa Paz, criadoras do projeto Rap Plus Size
Imagem: Reprodução/Facebook

Renata Nogueira

Do UOL, em São Paulo

25/10/2016 07h00

Mulheres, gordas, periféricas e rappers. Issa Paz e Sara Donato, criadoras do Rap Plus Size, emprestam seus corpos e suas vozes para um projeto que vai muito além da música. Com som e rimas, as paulistas de 24 e 26 anos expõem --quase-- todos os problemas e preconceitos enfrentados diariamente pelas mulheres. 

O primeiro resultado da união de ideias é um álbum com 13 músicas. Entre rimas e batidas que passeiam até pelo funk e reggae, faixas como "IMC", "Ninguém Merece" e "Vai Virar o Placar" denunciam o dia a dia daquelas que sofrem com gordofobia, machismo, assédio sexual e o preconceito dentro do próprio rap, gênero conhecido pelo teor de denúncia.

"O rap está inserido na sociedade, não tinha como escapar de um problema que já está enraizado ali, como o machismo", explica Issa. A faixa "Vai Virar o Placar" faz referências ao tão masculinizado universo do futebol para denunciar situações em que a mulher é colocada em segundo plano. "Eu não aceito ficar no banco / Eu vim pra entrar em campo / Nosso time tá escalando, e os machistas nóis vai driblando / [...] Chega de ser apoio de palco / Eu vou escrever minha história", elas cantam.

Consciente da falta de representatividade dentro do próprio rap, Issa já organizava eventos feitos pelas minas e para as minas. Foi na curadoria de um deles que ela conheceu o trabalho de Sara, que tocava sua carreira na cidade de São Carlos, no interior de São Paulo. Pagou a passagem de ônibus para que a artista mostrasse suas músicas em um de seus rolês e hospedou a amiga em sua própria quebrada, na zona norte da capital.

A identificação foi instantânea e a cada encontro surgia uma nova composição da parceria entre Issa e Sara. Em cinco anos de amizade, foram várias colaborações para os projetos independentes de cada uma, até surgir no final de 2015 a ideia do disco em conjunto. "Desenvolvemos uma amizade muito sadia, muito forte. As ideias bateram. Aí virei para a Sara um dia e falei: 'Mano, vamos fazer um disco'. Fui para São Carlos no final do ano passado para a gente escrever, trabalhar, e ela veio para São Paulo no começo desse ano para morar, ficar de vez. Sequestrei", relembra Issa.

Sara conta o termo plus size, um termo da indústria da moda, hoje ocupa toda a agenda delas. "Nunca se encaixou para o meu padrão. Sou gorda e não me vejo representada nas modelos plus size. Não fazem roupa para a gente. É muito difícil achar uma peça que eu goste, que não tenha cara de velha. Optamos por usar o termo justamente para desconstruir essa imagem glamourizada que ele carrega. Para ressignificar a definição e mostrar que plus size pode ir muito além da moda".

Vida para o rap

Issa Paz é o nome artístico de Larissa, que desde os 12 anos já escrevia suas letras. "Comecei em casa ouvindo rap, gravando em um microfone velho. Fazia minhas poesias virar rap na real, porque eu sempre escrevi muito". A partir daí ela começou a "viver de rap". No caminho das rimas veio uma formação em marketing, além de alguns trampos mais formais para ajudar a investir no sonho. "Conforme tinha dinheiro gastava com rap".

O primeiro EP, "Essência", foi lançado em 2014. Em seguida vieram "Todosomos", parceria com o grupo Rimologia, e "A Arte da Refutação", álbum solo lançado no ano passado. Issa divide sua casa no bairro Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte de São Paulo, com a namorada, Bia, e com a parceira musical, Sara. Ela hoje se dedica integralmente ao Rap Plus Size e à militância na Frente Nacional Mulheres no Hip-Hop. 

Sara Donato nasceu e foi criada em São Carlos, a 240 km da capital paulista. Influenciada pelo irmão, que também é rapper, começou aos 14 anos a a participar ativamente da cena na cidade. Fez parte de dois grupos antes de lançar "Made In Roça" em 2013, seu primeiro disco solo. "Sempre gostei muito de rap. Antes de pensar, imaginar e cantar rap, eu já colava em show".

Há dez meses, Sara cansou do vai e vem entre o interior e a capital e ficou definitivamente em São Paulo para se dedicar ao Rap Plus Size. "Ainda não vivo, mas hoje posso dizer que sobrevivo de rap".