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Rock em baixa? Alf, ex-Rumbora, lança disco solo: "Momento de experimentar"

Alf Sá: O músico passou Câmbio Negro, Rumbora, Supergalo e Raimundos - Divulgação
Alf Sá: O músico passou Câmbio Negro, Rumbora, Supergalo e Raimundos
Imagem: Divulgação

Tiago Dias

Do UOL, em São Paulo

20/01/2017 04h00

Muita coisa mudou desde o início dos anos 2000 para cá. E Alf Sá sabe bem disso. O baixista, cantor e compositor que iniciou aquela década com sua banda Rumbora onipresente nas rádios e na MTV lança agora o primeiro disco solo, justamente em um momento em que a maré não está mais para o rock. "Muita coisa mudou, mas é uma parada tão incondicional que eu simplesmente continuo fazendo", ele diz, sobre a produção do álbum "Você Já Está Aqui". 

Com produção do próprio Alf e de Biu, antigo companheiro do Rumbora, o disco sai pelo selo Hearts Bleed Blue --ou HBB-- e conta com a participação de Black Alien, Fred (Raimundos), PJ (baixista do Jota Quest) e Malásia (do Ultraman), além de uma arte caprichada, repleta de ilustrações para colorir, assinada por Daniel Lopes e Luciana Tolentino, namorada do músico. "É sempre um recomeço, mesmo para um artista bombado. Eu participei de várias bandas e tenho que ter humildade. Estou chegando de novo", diz, animado, o músico de 45 anos.

Alf surfou as últimas ondas boas do rock com o Rumbora entre 1999 e 2001, com irreverência e forte dose de ska. Foi presença constante na MTV: além de "Chapírous", emplacou "Skaô e o hit "O Mapa da Mina" entre as mais tocadas, se apresentou no Rock in Rio e viu as duas canções serem "escolha da audiência" no VMB (Video Music Brasil), extinto prêmio de música da emissora. 

Após três discos com o grupo, ele assumiu o baixo do Raimundos em 2003, mas deixou a banda quatro anos depois, junto com o baterista Fred, para criar o SuperGalo. A partir dali, ele avalia, uma série de confluências levou ao fim de uma era.

Capa de "Você Já Está Aqui" - Divulgação - Divulgação
Capa de "Você Já Está Aqui"
Imagem: Divulgação

"Quando o Rumbora assinou [com a gravadora Trama], o Napster [primeiro site de MP3 a popularizar] tinha acabado de chegar. No início dos anos 2000, tinha coisas muito mais legais que poderiam ser expostas, mas as que foram [divulgadas] deram uma infantilizada no rock. O rock meio ficou sem moral, saca? Acho que deu uma queimada", observa. "Perdeu credibilidade. Com tudo isso junto e misturado, rolou um desinteresse."

Na curadoria do festival Porão do Rock, fundado com amigos em 1998 por conta da ausência de casas de shows em Brasília, mas que hoje se tornou um dos mais importantes eventos independentes do país, ele conta que a maior dificuldade hoje é achar um nome grande do gênero para chamar o público. "Tem muita banda legal, muita promessa, mas o Porão é um festival grande, que reúne 20 mil pessoas por dia. Na hora de fechar o line-up você tem que ter uns nomes para chegar na galera que não está tão antenada no que está rolando. E a coisa anda bem a margem".

Bom momento

Foi nesta realidade que o músico se fechou em um quarto de Brasília para dar luz ao rebento solo. No maior estilo Paul McCartney, tocou todos os instrumentos dos primeiros singles, "O Sol Saiu", "Pra Onda Boa Me Levar" e "Guarde um Lugar", com a certeza de que tem conseguido se traduzir melhor do que há 17 anos.

"Voltei a uma coisa que rolava quando eu era molequinho, quando eu tinha gravador de quatro canais e gravava as demos do Raimundos e do Little Quail and The Mad Birds e onde, por muitas vezes, quando eu não estava com banda, fazia minhas coisas sozinho", lembra.

Saiu do quarto com uma demo pronta e influências além do ritmo que lhe deu a fama. Experimentou afro-samba e privilegiou arranjos de groove de funk --uma de suas paixões desde quando integrou o grupo de rap Câmbio Negro, antes de estourar com o Rumbora. "Foi quase uma regressão. Eu voltei e fui viajando em tudo que eu ouvi desde moleque. Tinha época que eu estava roquento, outra época era uma coisa mais brasileira."

Para ele, mesmo com o rock em crise, não existe melhor momento para experimentar. "O rock tem essa coisa no Brasil, chega: 'Oi! Beleza? Chega aí'. E de repente some, é como se nunca tivesse existido. É muito louco, não tem uma continuidade. Todos os outros estilos conseguem virar música brasileira, hip-hop já virou há muito tempo, mas com o rock parece que sempre rola uma torcida de nariz, um preconceito".

Com o disco prestes a reconquistar o público de antes, e aberto para novos ouvintes, ele avista uma maré positiva. "Sinto que a cena está crescendo, talvez não para viajar tanto em coisas ultra-gigantes, mas sim tentar focar mais em fazer algo interessante, sabe? Adequar mais em como as coisas estão acontecendo", defende. "É bom fortalecer o nicho, mas é melhor ainda que as coisas se misturem. Senão fica chato, fica tudo igual."