Rodrigo Silveira
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Jan Fjeld
O DJ, produtor e multi-instrumentista Karsh Kale se apresenta pela primeira vez no Brasil durante o festival Abril Pro Rock, trazendo o seu ambient drum'n'bass com
bansuri,
sarangi e muita
tabla elétrica. Ao lado de nomes como
Talvin Singh e Nitin Sawhney, Kale é um dos mais destacados expoentes do asian underground. Aproveitando a sua vinda ao país, a gravadora Trama faz a distribuição nacional do primeiro álbum solo de Kale, "Realize" (Six Degrees Records, 2001) no dia 15 próximo.
Em entrevista exclusiva a "O Pulso", durante uma folga da atual turnê pela Europa, Kale, 27, falou sobre sua formação musical e diz que cresceu ouvindo Sepultura. Também define seu som como "electro urban raag", explica o que é o "asian massive" e diz que virá ao país para mostrar os seus talentos nas pick-ups.
Colaborador de alguns dos nomes responsáveis por trazer referências étnicas para a música eletrônica contemporânea, como DJ Spooky,
Bill Laswell e Ryuichi Sakamoto, Kale lançou um maxi single de material próprio com o título revelador de "Classical Science Fiction from India" em 1999. O título é também uma boa indicação do que traz o seu álbum de estréia, que puxa os limites entre o clássico e a vanguarda com o foco na instrumentação acústica, no tratamento eletrônico e nas melodias.
Karsh Kale será também um dos quatro DJs estrangeiros (ao lado do DJ Digicay da França, Gaetano Parisio da Itália e The Advente de Portugal) que tocarão na festa dos 10 anos do Festival Abril Pro Rock, em Nova Jerusalém (PE), no dia 4 de maio. Kale se apresentará no dia 26 de abril, na Choperia do Sesc Pompéia, em São Paulo.
Leia principais trechos da entrevista, feita por e-mail:
É difícil definir o seu estilo de música, mas tente descrever o que você faz. Para quem nunca ouviu a minha música, a descreveria como ficção científica clássica da Índia e de Nova York. Ou electro-urban raag, ritmo e pressão, perdidos num sonho lúcido, ou algo assim... É difícil descrever o seu próprio som.
Há diferença entre som e música? Se sim, qual é esta diferença? Acredito que um bom som é música. Qualquer som que você está curtindo é música. Até sons que você talvez não necessariamente curta - mas que te dão um certo prazer doentio ao ouví-los - são música. Mesmo assim, a arte de compor é capaz de traduzir som em uma expressão eloqüente.
Qual a sua formação musical? Música clássica indiana? Com quem você estudou tabla? Quais outros instrumentos você toca? Passei o maior parte da minha vida aprendendo a tocar instrumentos. Começou com tabla, bateria e depois fui pegar na guitarra, teclados, baixo, tecnologia, vocal, santoor. Sempre estudei música na escola e passei alguns anos estudando com o mestre de tabla Samir Chatterjee. Os meus professores também sempre foram artistas que eu tentava emular, como Zakir Hussain, Jimi Hendrix, The Police, John Bohnam.
Você colaborou em várias produções de Bill Laswell, como o recente "Ponts of Order" (com Toshinori Kondo, Graham Haynes e Buckethead), e o antológico "Tabla Beat Science". Qual a sua conexão com Laswell e como vocês se conheceram? Aparentemente o Bill Laswell estava de olho em mim na época em que estava me aperfeiçoando, tocando na cena novaiorquina. Trabalhamos juntos pela primeira vez em Londres, no Barbican Center, junto com Ryuchi Sakamoto, Talvin Singh, Sultan Khan e outros. Ficamos juntos uma semana ensaiando intensamente a seção rítmica. Jamais tinha feito parte de um grupo de artistas tão de vanguarda como esse. Desde então, tenho trabalhado com Bill regularmente. Ele é um artista muito inspirador e um excelente exemplo de um artista que pode ser músico, compositor, produtor, um cara que cuida de repertório (A&R), dono de gravadora e ao mesmo tempo está envolvido com um monte de artistas de vanguarda. Bill tem poder. É didático observá-lo em ação.
Você trabalhou com vários músicos de formação clássica como Ustad Sultan Kahn e Zakir Hussian. Qual a diferença entre trabalhar com eles e os magos da tecnologia? A maioria dos artistas com os quais trabalhei transcende de uma forma ou outra o seu próprio estilo, o que os torna colaboradores ideais. São pessoas que pensam além do seu instrumento ou máquina. Há mais similaridades do que diferenças. Quando o papo acaba e a música começa, sentimos o quanto nós temos em comum. Respeito muito os que tocam os seus instrumentos e os que se expressam através de programar máquinas se o resultado final for música bonita.
O que vem primeiro, o conceito, a batida, a melodia, o sample (ou qualquer outra coisa)? Em geral é a melodia ou a escala melódica (raag) com uma progressão de acordes. Raramente começo com uma batida, a não ser que esteja fazendo uma faixa especificamente para a pista. Para mim, uma música é sempre uma melodia. A batidas mudam, os estilos de produção, os estilos musicais também mudam, mas uma melodia é eterna e por isto gosto de começar com ela.
De onde vem a sua inspiração: da influência da música clássica indiana, da música eletrônica ou de outra referência? Provavelmente de algum outro lugar. Nestas alturas do campeonato, a minha cabeça mistura influências eletrônicas com influências clássicas indianas e qualquer outra influência, naturalmente. Tudo faz parte de quem sou hoje e por isto o meu som sai desta forma.
O que representa o código binário para você? Acho que você está se referindo à pilula com os dois "K" na capa do disco... É o meu logo, que foi desenvolvido pelo Mohamed Rashid da Squaresquare. Representa as minhas iniciais em forma de pílula, fácil de engolir...
O que é o Asian Massive? O Asian Massive é um movimento cultural. Representa artistas, mundo afora, que têm uma necessidade comum de mudança e progressão na arte, na música e na cultura. O Asian Massive são os asiáticos que fazem. Não acho que seja um modismo ou algo do momento... Começou quando Ravi Shankar trouxe a música clássica indiana para o resto do mundo, ao mesmo tempo em que as pessoas começaram a deixar o continente indiano para novas terras, e continuam desde então. O nome Asian Massive inevitavelmente mudará, mas o movimento continuará.
O que é o grupo 32 Tribes Posse? 32Tribes foi uma escola. Passei alguns anos tocando bateria neste grupo de rock-reggae do futuro, que era uma instituição em si. Fazia parte também o Shahid Siddiqui (que canta em "Realize") e o meu empresário atual, Fabian Alsultany, aka Sultan32.
É a sua primeira vez no Brasil? Quais as suas expectativas? Aprendi a não chegar com expectativas, para ter uma experiência melhor na hora. Estou muito excitado com a idéia de tocar a minha música para uma platéia brasileira. Além disso, espero passar um tempo maravilhoso com a minha esposa e a nossa filha de cinco meses.
Você está trazendo a sua banda ou você se apresentará como DJ, tocando tabla elétrica? Desta vez vou me apresentar só como DJ e com tabla elétrica, mas espero poder trazer a minha banda na próxima vez.
São Paulo tem uma cena club muito ativa e diversificada. Você tocará em algum clube na cidade além da sua apresentação no Abril Pro Rock? Não tem nada confirmado ainda, mas é possível...
Você está ouvindo algo de música brasileira, tem alguma referência do Brasil no seu som? Acho que a música e os ritmos brasileiros têm uma forte influência na música que ouvimos hoje. Cresci ouvindo Sepultura.
Quais os seus projetos futuros? Quando teremos um novo álbum de Karsh Kale e o que podemos esperar? Vou lançar ainda este ano um álbum de remixes de "Realize", com faixas de artistas como Bill Laswell, Makyo, Banco De Gaia, Ming and FS, DJ Spooky e outros. Também estou participando no "Tabla Beat Science Live", que deve ser lançado no meio do ano. Quanto ao meu novo disco, isto ainda é um segredo...
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Talvin Singh na Rádio UOL
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