Rodrigo Silveira
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Jan Fjeld
Sai em maio no Brasil, o segundo CD da cantora e compositora norte-americana Angie Stone, "Mahogany Soul" (
J records 2001).
Stone refuta para o disco, lançado nos EUA no final do ano passado, o rótulo de "novo soul", e diz que de "neo" ou "nu" (de "new", novo) ela não tem nada, o que faz é soul mesmo, e completa: "sou crua e verdadeira, e canto sobre a vida como ela é".
Desconhecida no Brasil, Stone é comparada na Europa a Aretha Franklin, por seu fraseado, timbre e a influência
gospel, e não há nenhum exagero nessa afirmação. Stone é uma cantora
grande -já recebeu convites para jogar basquete profissionalmente-, e é uma grande cantora de trinta e poucos anos que está aí para provar que uma bela voz e uma boa melodia ainda são fatores mais importantes do que sex appeal e estratégias de marketing.
O seu primeiro disco solo "Black Diamond", de 1999, foi lançado pela BMG Brasil em meados do ano passado em virtude da ótima vendagem nos EUA (platina no seu ano de lançamento e também eleito "Álbum do ano" pela revista Billboard), que ultrapassou as mais otimistas expectativas de sua gravadora.
Produzido em conjunto com Lenny Kravitz, D'Angelo e Ali Shahaeed Muhammad do grupo A Tribe Called Quest, o álbum mostra uma Stone positiva, de bem com a vida e possui uma sonoridade firmemente baseada no soul clássico, no funk anos 80 e no hip hop de hoje.
"Mahogany Soul" mostra muito mais do que os dotes vocais de Angie Stone. A cantora se revela também uma hábil baixista, tecladista e percussionista neste seu segundo disco solo. Stone já forneceu letras, músicas, arranjos e emprestou a sua voz para Mary J. Blige, Macy Gray, Lenny Kravitz e D'Angelo -este último, seu ex-namorado, cujo álbum de 2000, "Voodoo", conta com colaborações de Stone na produção e composição de arranjos vocais.
É particularmente na sua voz e nos seus arranjos vocais que Stone diferencia-se das suas contemporâneas -ela é mais contida no uso da sua força e mais suave no timbre. Ela usa menos firulas do que Erykha Badu e menos rap do que
Jill Scott, e obtém uma sonoridade mais suave do que a de Macy Gray ou Lauryn Hill.
Das 18 faixas de "Mahogany Soul", uma é um remix, e dez são composições de Stone. Há uma ardente versão de "Makings of You" de Curtis Mayfield, e uma adaptação do clássico "20 Dollars" de Al Green -uma crítica a pessoas que pedem dinheiro emprestado, sabendo que nunca vão devolver.
As letras de Stone e de seus colaboradores falam sobre o cotidiano. A maioria das músicas tem batidas mid ou downtempo -e são todas recheadas com a sua voz, às vezes suave, às vezes rascante- e lembram os anos dourados de
Gladys Knight e Betty Wright. Algo que Stone explicita na música "Soul Insurance", que abre o disco, em que ela, além de listar as suas influências, dedilha uma boa linha de baixo e toca percussão.
A segunda faixa é o primeiro single
"Brotha", uma cantiga puxada pelos scratches de Jake & The Phatman e uma linha de baixo. A música recebeu uma indicação ao
Soul Train Awards (programa dominical norte-americano dedicado à música afro-americana) em 2002. Mesmo sem ganhar o prêmio, foi um passo importante para Stone se fincar como alguém no mundo da soul music norte americana.
Não que ela precise disso. Além do currículo acima e de seus dois álbuns solo, Stone traz experiência em coro de gospel e teve o seu primeiro mini-sucesso já em 1993, com o grupo de rhythm 'n' blues Vertical Hold. Antes disso, já integrava o trio de rap The Sequence, com Cheryl Cook e Gwendolyn Chisolm, que gravava com a lendária Sugarhill Records.
Vale mencionar também a música composta por sua vocalista de apoio, Andrea Martin, junto com Ivan Matias, que é uma das melhores faixas do disco. Stone exibe a sua voz contida e sofrida sobre uma batida hipnótica produzida por
Swizz Beatz e mixada pelo Tony Maserati, utilizando samples da música "Backstabbers" de
Huff, McFadden e Whitehead.
Nas duas baladas "Life Goes On" e "Time of the Month", cujas bases são tocadas pela própria Stone ao teclado, a cantora mostra todo o seu lado Aretha Franklin. A primeira lembra o clássico "Float On", dos Floaters, com uma melodia tocada em um teclado Wurlitzer, o que cria um clima anos 60, e cantado com uma voz que lembra a Aretha Franklin da fase "Lady Soul", de 1968. Em "Time of The Month", que utiliza frases de outro clássico de soul, "I Can't Say No", de
Charles Jackson e Marvin Yancey, Stone entoa com fervor: "é o período do mês, não mexa comigo".
Por enquanto, ninguém está mexendo com a ascensão de Angie Stone. A expectativa para o seu terceiro álbum -o definitivo- prometido para o ano que vem já é grande.
Ouça Angie Stone na Rádio UOL:
"
Slippery Shoes" - da trilha sonora "Bamboozled"
"
Keep Your Worries" - faixa extraída no "Jazzmatazz Streetsoul" do Guru
"
My Nutmeg Phantasy" - colaboração extraída do disco "The Id" da Macy Gray