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Kiss lança primeiro disco em 11 anos e diz que encontrou a "fonte da juventude"

Os integrantes do Kiss: Gene Simmons, Eric Singer, Tommy Thayer e Paul Stanley - Glen La Ferman/NYT
Os integrantes do Kiss: Gene Simmons, Eric Singer, Tommy Thayer e Paul Stanley Imagem: Glen La Ferman/NYT

GARY GRAFF*<br>The New York Times Sindycate

11/10/2009 03h31

O Kiss lançou seu álbum de estreia há 35 anos, o que o baixista fundador, Gene Simmons, chama de "surpreendente", e o guitarrista fundador, Paul Stanley, diz que "passou em um piscar de olhos". Mas muita coisa mudou para o Kiss e seu lugar na cultura popular nessas três décadas e meia.

Nos anos 70, o grupo foi satanizado por seus personagens demoníacos, manifestados na maquiagem macabra, em uma apresentação teatral que incluía cuspir sangue e fogo, e em canções repletas de duplos sentidos sexuais nada sutis. Atualmente, entretanto, o antes flagelo da sociedade "educada" se vê no coração da cultura popular: "Sonic Boom", o primeiro novo álbum do grupo em 11 anos, está disponível exclusivamente no supermercado Wal-Mart.

"Sabe como é, os tempos mudam", diz Stanley, 57 anos, que produziu "Sonic Boom". "Eu acho que as coisas evoluem. É duro de responder, exceto dizer que é a combinação certa no momento certo". Simmons concorda, chamando o Kiss de "vagalhão de licenciamento e merchandising", com mais de 3 mil produtos contendo o logotipo distinto do grupo e/ou a imagem de seus membros, incluindo preservativos e um caixão, o "Kiss Koffin".

O grupo nunca teve ambições modestas ou valores underground. Afinal, é auto-declarado "a banda mais quente do mundo" no início de cada show. "Eu gosto do modelo Muhammad Ali", diz Simmons, de 60 anos. "Se você é o maior, bata no peito como um animal que acabou de matar algo. Pise sobre a carcaça, bata no peito e grite ao mundo: 'eu sou o maior!', como se fosse verdade. E com o Kiss nós achamos que é verdade, sem dúvida".

Simmons e Stanley têm números para apoiar sua bravata. O Kiss já vendeu mais de 80 milhões de álbuns em todo o mundo e 19 milhões só nos Estados Unidos, onde 24 de suas canções ganharam disco de ouro. A banda lançou um hino duradouro --"Rock and Roll All Nite" (1975)-- e chegou ao Top 40 mais nove vezes, com canções como a balada não característica "Beth" (1976), "Detroit Rock City" (1976), "Shout It Out Loud" (1976) e "Calling Dr. Love" (1977), que atualmente faz parte de uma campanha publicitária de um refrigerante.

Gravação do disco "Sonic Boom"


Fonte da juventude
Os shows altamente teatrais do grupo geraram um dos fã-clubes mais dedicados da música pop, o chamado Kiss Army, cujas fileiras se tornaram uma legião de multigerações. "Nós parecemos desafiar a lógica", diz Simmons, que nasceu Chaim Witz em Israel e se mudou para Nova York em 1957, onde ele e Stanley se conheceram na banda Wicked Lester e posteriormente formaram o Kiss, em 1972.

Genne conta que, em intervalos de alguns poucos anos, o público muda. "Nós começamos a tirar fotos do público para que pudéssemos mostrar às pessoas, porque quando eu digo que nosso público tem de 15 a 25 anos, você começa a pensar: 'qualé, Gene, você tem 60!'. Isso nos surpreende, porque no rock ando roll há uma espécie de obsolência programada. Ninguém jovem vai assistir uma banda que está tocando há 30 anos ou mais, mas eles vêm assistir o Kiss. É como se tivéssemos encontrado a fonte da juventude".

É esse público jovem, diz Simmons, que levou o Kiss a pensar em gravar um novo álbum após tantos anos. "Nós começamos a receber e-mails dos fãs: 'por que vocês não gravam um novo álbum?'", lembra Simmons. "Foi realmente o que aconteceu. Havia esse sentimento de que nós devemos fazer o que eles querem que a gente faça".

Stanley, que nasceu Stanley Eisen em Queens, Nova York, reconhece que estava desanimado de gravar após a experiência de fazer "Psycho Circus" (1998), quando ele e Simmons estavam lutando com os outros membros originais, o baterista Peter Criss e o guitarrista Ace Frehley. Ambos tinham deixado a banda, mas retornaram para uma reunião em 1996, quando o Kiss, que tinha abandonado sua maquiagem em 1983, decidiu voltar a usá-la.

E velhas animosidades também voltaram e minaram o Kiss como um empreendimento criativo. "Foi uma tentativa valente", lembra Stanley. "Nós seguimos em frente, apesar dos advogados dessas pessoas estarem mais em contato conosco no estúdio do que os supostos membros da banda, exigindo cotas de composição e como deviam ser mostradas. Apesar disso, nós batalhamos para gravar o álbum. Não saiu como eu esperava e não queria passar por algo semelhante de novo".

Criss e Frehley no final deixaram a banda de novo para serem substituídos pelo baterista Eric Singer e pelo guitarrista Tommy Thayer. Isso também causou um pouco de controvérsia, já que substitutos anteriores possuíam sua própria maquiagem distinta, enquanto a de Singer agora é a de Criss e a de Thayer é da Frehley.

Kiss toca "Modern Day Delilah"

Stanley argumenta que as semelhanças são apropriadas. "Esses são os rostos ícones do Kiss e são maiores do que as pessoas que os usam. Esses são os rostos do Kiss, e independente de quem esteja no Kiss na época deve usá-los". Mas apesar das reclamações, o novo Kiss foi abraçado pelo Kiss Army e também pelos dois fundadores restantes. "Não há pessoas reclamando, não há nuvens negras, não há drogas e nem álcool", diz Simmons, "apenas pura alegria".

Retomada de Stanley-Simmons
A tarefa de produzir "Sonic Boom" coube a Stanley, que teve uma experiência de gravação relativamente recente com seu álbum solo, "Live To Win" (2006). "Foi uma decisão fácil de tomar", diz Simmons. "Nós já percorremos esta estrada juntos. Eu sei que Paul sabe como chegar lá. Eu fico perfeitamente feliz em dizer: 'ei, pegue a direção'. Sem problema".

Sua meta, diz Stanley, era "capturar o espírito que a banda tem ao vivo. São realmente quatro personalidades distintas criando uma banda de muito explosiva. O Kiss sempre foi assim nos seus melhores momentos. Como produtor, busquei explorar isso de novo, a combinação das quatro pessoas e dessa colaboração".

O projeto também buscou reviver a dupla de composição Stanley-Simmons, que estava dormente há muitos anos. "Inicialmente ele não estava muito disposto a fazê-lo", lembra Stanley, "porque sentia que tínhamos nos desenvolvido como indivíduos, criativamente. Mas nós nos tornamos grandes bebês querendo as coisas do nosso modo. E assim que Simmons se comprometeu com isso, ele se dedicou totalmente. Compor juntos foi mais fácil do que nunca".

Os dois colaboraram em quatro das 11 canções do álbum. "A esta altura do nosso relacionamento, realmente não há muitas questões", diz Stanley. "Gene e eu somos uma família que já passou por muitos obstáculos por 40 anos. Assim que nos sentamos para compor, não havia ego envolvido naquilo. Era puramente uma colaboração e uma reafirmação do que esta banda se trata".

"Sonic Boom" foi gravado em cerca de seis semanas em Los Angeles, e faz parte de um pacote que também inclui um segundo disco de sucessos regravados em 2008 pela atual formação --inicialmente sob o título "Jigoku-Retsuden" para o mercado japonês-- assim como um DVD de um show de abril de 2009 em Buenos Aires.

  • Ayrton Vignola/Folha Imagem

    O baixista e vocalista do Kiss Gene Simmons durante show em São Paulo (07/04/2009)

Novos projetos do Kiss
Stanley e Simmons disseram que o processo de gravar o álbum os animou a fazê-lo de novo, e não daqui a 11 anos, mas outros projetos potenciais também aguardam no universo Kiss: o grupo é tema de um documentário da rede A&E, "Kissteria", e está planejando documentar a etapa norte-americana de sua turnê "Kiss Alive 35" com outro DVD.

Simmons gravará partes de seu reality-show "Uma Família Joia" na estrada, apesar de Stanley notar que haverá limites sobre o que a equipe poderá mostrar no que se refere aos demais membros da banda. "Eu acredito em manter essas coisas separadas", diz o guitarrista. "Eu respeito o gosto de Gene de ficar sob os holofotes, mas pode muito bem se transformar em uma área nebulosa a respeito do que é aquele programa e o que é o Kiss".

Por sua vez, Simmons está explorando outros espaços para o Kiss, incluindo um musical "jukebox" para a Broadway, desenvolvido em torno das canções do grupo, e um desenho animado para a televisão. Ambas as ideias estão sendo trabalhadas há alguns anos. "Tudo leva tempo", diz o baixista. "O show Kiss Broadway está em desenvolvimento há 15 anos e o desenho há quase o mesmo tempo. Como em qualquer coisa, você continua olhando para as coisas e trabalhando em ideias".

E enquanto isso? "Enquanto isso o Kiss apenas continua crescendo", diz Simmons. "A sensação é de ter nascido de novo, de certa forma, recebemos um chute no traseiro. Passamos por muitas encarnações diferentes e formações, e ainda estamos aqui, apesar das pessoas que faziam objeção e de quem mais nós enterramos de lá para cá, nos quintais das mansões imensas que as críticas ruins nos construíram. E nós agradecemos a todos vocês por isso".

*Gary Graff é um jornalista free-lance baseado em Beverly Hills, Michigan

Tradutor: George El Khouri Andolfato