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Phil Collins lança regravações da Motown e diz que agora pode ver "como eu era irritante" nos anos 80

O músico britânico Phil Collins em show no Festival de Montreux, na Suiça (01/07/2010) - Reuters
O músico britânico Phil Collins em show no Festival de Montreux, na Suiça (01/07/2010) Imagem: Reuters

GARY GRAFF*

The New York Times Syndicate

02/11/2010 17h20

Phil Collins não está exatamente "livrando-se de tudo", como já cantou em "Throwing It All Away" com sua banda Genesis. Mas com o lançamento de seu disco de covers de R&B, "Going Back", sua carreira chega a um ponto que poderia ser chamado por outra canção do Genesis: "Los Endos". "Se este álbum não saísse, eu não estaria fazendo nada agora", diz Collins, de 59 anos.

Se os comentários de Collins se confirmarem --e esta não é a primeira vez que ele fala sobre aposentadoria--, ele certamente deixaria um legado formidável no mundo da música pop. O cantor, compositor, músico e ator nascido em Londres, mas que atualmente reside na Suíça, é um dos únicos três artistas a vender mais de 100 milhões de álbuns com uma banda e por conta própria --os outros são Paul McCartney e Michael Jackson.

Ele ganhou sete prêmios Grammy e emplacou 20 sucessos no Top 40, incluindo o maior número de sucessos entre qualquer artista nos anos 80, com "In the Air Tonight" (1981). Ganhou um Oscar de melhor canção por "You'll Be in My Heart" do desenho animado da Disney "Tarzan" (1999), e ajudou na adaptação do filme como musical da Broadway. Ex-ator infantil, ele também atuou em vários filmes, com maior destaque para "Buster - Procura-se um Ladrão" (1988) e emprestou sua voz para vários desenhos animados.

"Expandi minhas fronteiras pessoais mais do que muitas pessoas provavelmente se lembram. Sempre existem coisas que você gostaria de ter feito diferente, mas em geral eu me orgulho do que fiz e não há muita coisa que eu não tenha tentado". Mas essa ambição teve seu preço. Ele reconhece um pouco de saturação de Phil Collins. "Sei que estive onipresente nos anos 80", ele diz rindo. "Você percebe que começa a enervar as pessoas porque você está sempre lá. Na época eu não sentia isso, tive oportunidades maravilhosas para fazer coisas diferentes, e disse sim para tudo. Mas agora posso ver como eu era irritante".

A boa notícia é que o tempo tem sido bom para a reputação e legado de Collins, produzindo melhores críticas, notas favoráveis na imprensa, seu trabalho sendo usado por rappers e produtores e até mesmo a incluscão do Genesis no Salão da Fama do Rock and Roll neste ano. Sem esquecer da versão hilariante de "In the Air Tonight" pelo campeão de boxe Mike Tyson, no filme do ano passado "Se Beber, Não Case". "Ironicamente, quando estou prestes a encerrar tudo, ocorre uma espécie de reavaliação. Talvez seja por não lançar um álbum em oito anos. É revigorante isso acontecer próximo do que considero o fim do que quero fazer".
 

Phil Collins - "Heatwave"

Participação dos músicos da Motown
Se ele está baixando a cortina em sua carreira musical, Collins partirá com um aceno reverente e alegre ao seu passado. "Going Back", cujas 18 faixas são basicamente covers da Motown, representa "as coisas que eu escutava quando estava crescendo", diz Collins. "Fora os Beatles, este era o outro lado da minha coleção de discos. Eu queria cantar essas canções, mas nunca estive em uma situação na qual pudesse. Depois entrei no Genesis com 19 anos, mas nós nunca tocamos canções de outras pessoas. Acho que sempre foi algo que quis fazer".

Collins já acenou para essas influências antes, tanto em faixas do Genesis como "No Reply at All" (1981) quanto em suas próprias "I Missed Again" (1981) e "Sussudio" (1985), além do cover de sucesso de "You Can’t Hurry Love" das Supremes, em 1982, e o primeiro lugar nas paradas, "Two Hearts" (1988), que ele compôs em parceria com o grande compositor da Motown, Lamont Dozier.

Desta vez ele foi ainda mais fundo no gênero. "Os músicos nas gravações originais eram muito modernos, isso sempre teve um apelo para mim. Havia um som que você podia identificar imediatamente, porque eram os mesmos músicos no mesmo estúdio, com os mesmos engenheiros e às vezes os mesmos compositores. Nem todas as canções eram ótimas, mas certamente havia uma boa quantidade de material excelente".

Collins também conseguiu trazer para seu disco alguns dos mesmos músicos, contando com alguns integrantes dos famosos Funk Brothers da Motown --o baixista Bob Babbitt e os guitarristas Ray Monette e Eddie 'Chank' Willis-- na maioria das faixas e na série de shows para divulgar o álbum na metade do ano. "Todos eles se mostraram interessados pela ideia e foi ótimo estar por perto e escutar algumas de suas histórias. Foi ótimo contar com esses caras que as tocaram da primeira vez. Quando eles sorriam ao término da faixa era possível dizer que tivemos sucesso naquilo que buscávamos fazer".

Um momento particularmente memorável ocorreu quando Willis, de 74 anos, escutou a base para "Standing in the Shadows of Love", dos Four Tops, antes de acrescentar sua parte. "Ele se virou para mim e disse: 'Quem tocou a bateria nisto?'", lembra Collins. "E eu disse 'bem, fui eu'. E ele disse: 'Muito bom, cara. Muito bom!' Para mim, aquele momento fez tudo valer a pena".

Foi particularmente gratificante porque nos últimos anos Collins tem enfrentado uma lesão nos nervos que prejudicou severamente sua capacidade de tocar bateria. "Sentado aqui, não consigo sentir a ponta dos meus dedos da mão esquerda", diz Collins, que começou no Genesis como baterista. "Esta foi a primeira vez que tentei tocar bateria desde a reunião do Genesis. Foi frustrante porque, na primeira vez, uma baqueta voou da minha mão, então percebi que precisava fixá-las com fita adesiva na minha mão, porque não tinha força suficiente nos dedos para segurá-las".

Livro sobre Revolução do Texas
Collins admite que não parou de compor, mas diz que não tem ideia do que fará com elas. Ele descarta qualquer atividade futura com o Genesis, mesmo se o vocalista original, Peter Gabriel, finalmente concordasse em participar. Seu foco atual, na verdade, não é a música, mas um livro --e não um livro de memórias ou algo ligado à música, e sim sobre a Revolução do Texas do século 19.

Fascinado na infância por "Davy Crockett" da Disney (1954-1955), Collins passou anos colecionando memorabilia do cerco ao Álamo, fazendo visitas frequentes a San Antonio com essa finalidade. Ele adquiriu várias armas e roupas do forte, assim como um recibo para quase três dúzias de cabeças de gado assinado pelo comandante do Álamo, William B. Travis, e outro recibo assinado por uma sela de propriedade de John W. Smith, um sobrevivente do Álamo e prefeito de San Antonio.

"É uma coleção imensa de memorabilia do Álamo, de antes e depois dele, basicamente a Revolução do Texas em geral", diz Collins, que planeja publicar seu livro em 2012. "É basicamente a história de todas as coisas que colecionei, as colocando no contexto da revolução. É um trabalho em andamento e me entretém". Também é um primeiro passo para uma vida além da música. "Não sou daqueles que ficam pensando 'e se...'. Esta é a situação atual. Na vida, uma porta fecha e outra abre, e tenho sorte de ter uma pela qual passar que parece ser bastante interessante".

*Gary Graff é um jornalista free-lance baseado em Beverly Hills, Michigan

Tradutor: George El Khouri Andolfato