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Living Colour fala de Carlinhos Brown, racismo e Bolsonaro antes de shows no Brasil

Living Colour toca hoje no Rio e amanhã em São Paulo - Divulgação
Living Colour toca hoje no Rio e amanhã em São Paulo Imagem: Divulgação

Maurício Dehò

Do UOL, em São Paulo

13/06/2019 04h00

A relação do Living Colour com o Brasil data de 1992, quando o quarteto se apresentou pela primeira vez no país, no Hollywood Rock. Hoje e amanhã, o grupo toca seu metal cheio de funk no Rio de Janeiro e em São Paulo, respectivamente, com os laços estreitados com os brasileiros e muito a falar sobre os panoramas quentes nos campos social e político.

O baterista Will Calhoun, de 54 anos, falou ao UOL por email e revelou que, além dos shows, virou um grande conhecedor do Brasil por conta de algumas visitas mais longas que fez, aprendendo detalhes da música brasileira, inclusive com Carlinhos Brown. Além disso, mostrou que se manteve antenado com o que rola por aqui, seja na música - é fã de Karol Conka -, seja na política, como crítico de conservadores e do atual presidente Jair Bolsonaro.

Tempero brasileiro no Living Colour

Will Calhoun não é apenas baterista, mas um estudioso de música. Formado na Berklee College of Music, ele aproveitou suas passagens no Brasil para ampliar seu estudo em ritmos.

"Nunca vou esquecer de nossa primeira vez no Brasil. O país de vocês é um dos melhores do mundo para a música. Depois dessa primeira apresentação, eu fui para o Nordeste para visitar Carlinhos Brown. Eu fiquei duas semanas com ele, aprendendo sobre a história da música africana no Brasil e sobre a Timbalada", relembra o baterista.

Will - Getty Images - Getty Images
Will Calhoun, baterista do Living Colour, em ação
Imagem: Getty Images

"Depois disso, eu dirigi até o Recife e fui estudar a percussão do maracatu por um mês. Também tive a oportunidade de conhecer os Fôjo e tocar com eles. Foi uma experiência que mudou minha vida", conta ele, citando uma comunidade quilombola de Itacaré, na Bahia. "O Brasil tem uma mistura de pessoas e culturas muito ricas e uma cena artística e musical diversa, que permite um olhar inacreditável sobre a pobreza, mas aonde ainda se vive de uma forma linda."

O Living Colour é conhecido por suas misturas sonoras, com uma base no metal, mas influências do funk norte-americano, jazz, hip hop e punk, além deste tempero brasileiro de Will, que cita entre seus artistas preferidos do Brasil "Pixinguinha, Caetano Veloso, Djavan, Hermeto Pascoal, Chico Science e, mais recentemente, amei Karol Conka".

"Arte é política"

Formado por quatro negros, o Living Colour desde o começo não se esquiva de falar sobre racismo e tocar na ferida, para tentar mudar o panorama do rock, hoje dominado por brancos quando se pensa nas bandas de sucesso.

"Os brasileiros estão ligados: foram os afro-americanos que criaram o rock n' roll", salienta o baterista. "Tem gente que parece desconfortável ao ver nossos shows ao vivo, ainda assim, ficam lá por duas horas. Não há pontos negativos em falarmos sobre esse assunto e há muitos pontos positivos: as pessoas sempre têm oportunidade de mudar."

Questionado sobre casos como o de Roger Waters, criticado por misturar política e música em sua turnê no Brasil, no ano passado, e do Dead Kennedys, que cancelou sua vinda ao país por polêmicas no campo político, ele é bem direto: "Música e arte são políticas!".

"Nós temos um trabalho importante como artistas. É importante para nós continuar passando a verdade. Conservadores sempre existiram, de todas as formas, mas muitos foram derrotados. Se seguirmos sendo honestos, pesquisando e entendendo o passado, conseguiremos criar um futuro mais equilibrado", diz Will.

O baterista vê o Brasil em um momento político de mudanças cruciais, acompanhando o que acontece ao redor do mundo. "Conheço Bolsonaro, o comportamento dele é algo que ressurgiu nestes tempos de mudança. Como o Public Enemy diz, há 'medo de um planeta negro'. Os conservadores não querem abraçar as mudanças do mundo. Eles estão fazendo tudo para manter seus sistemas rígidos e de apartheid."

Álbum Vivid e doc inédito

O Living Colour vem ao Brasil na mesma toada de outras bandas que apresentam discos completos. No caso deles, é Vivid que será tocado na íntegra. O álbum foi lançado em 1988 e rendeu o clássico Cult of Personality, por exemplo.

"Este disco representa muito pra gente. É a vida e a história de quatro caras negros e de muita gente de cor neste mundo. Foi o início de nossa jornada artística e tocar essa música é nos expressar sem medo. Infelizmente, muitos dos tópicos que falamos no disco ainda são relevantes", lamenta.

O grupo também promove o álbum Shade, de 2017, antes de voltar a pensar no sucessor deste trabalho.

Antes disso, Will planeja levar uma de suas experiências no Brasil para as telas. "Na minha segunda visita ao Brasil, estive com uma escola muito especial no Recife, o Centro de Educação e Cultura Daruê Malungo, no Recife. Eu gostei tanto que fiz um documentário sobre o centro e o maracatu. Vou lançar sozinho no próximo ano. Ver as crianças aprendendo sobre as heranças de Angola, seus costumes e sua música foi incrível. Nunca vou me esquecer."

Serviço:

Living Colour no Rio
Data:
Hoje (13/6)
Abertura da casa: 20h
Local: Circo Voador
Endereço: rua dos Arcos, sem número - Lapa/RJ
Ingressos: no site do Circo Voador e na bilheteria física.

Living Colour em São Paulo
Data: Amanhã (14/6)
Abertura da casa: 20h
Local: Tropical Butantã
Endereço: Av. Valdemar Ferreira, 93
Ingressos: no site da Ticket Brasil