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Filme de Pelé debate racismo e bullying, mas acaba caindo em alguns clichês

O ator Kevin de Paula interpreta o jogador aos 17 anos em "Pelé - O Nascimento de uma Lenda" - Reprodução
O ator Kevin de Paula interpreta o jogador aos 17 anos em "Pelé - O Nascimento de uma Lenda" Imagem: Reprodução

Rodolfo Vicentini

Do UOL, em São Paulo

17/10/2017 04h00

"Pelé - O Nascimento de Uma Lenda" conta a vida do jovem Edson Arantes do Nascimentos, o Pelé, do seu começo nos campinhos em Bauru até a consagração na Copa do Mundo de 1958. Muito além das quatro linhas, a produção aborda o racismo e a importância da figura do jogador fora do futebol, mas derrapa em alguns clichês desnecessários e uma visão ultrapassada.

Pelé sofreu bullying a vida toda mesmo quando criança. Era desprezado porque não tinha chuteiras para participar de uma campeonato do bairro, "quebrado" pelos suecos grandalhões na final da Copa de 1958, recebia olhares debochados dos torcedores no maior torneio de futebol do mundo por ser negro, "jogar bonito" e ter apenas 17 anos, além de ser rechaçado por alguns companheiros de Santos ao chegar no CT pela origem humilde.

Apesar dos preconceitos que o Rei sofreu, o filme, produzido por norte-americanos e falado em inglês (a distribuidora afirmou que o filme será dublado aqui porque dessa forma "a emoção é muito maior") acaba caindo em preconceitos contra o próprio povo brasileiro. O centro de treinamento do alvinegro praiano fica no meio de uma favela, reforçando a ideia gringa de que tudo no Brasil é uma "grande favela". É, literalmente, um campo verde no meio de construções grosseiras e uma tomada panorâmica faz questão de deixar isso claro. 

Outro trecho incômodo (e exagerado) é na final da Copa do Mundo de 1958, após o Brasil desempatar o jogo. Uma cena com os poucos brasileiros na arquibancada comemorando com a alegria tupiniquim e até um "reco-reco" antigo dá um tom sambista para se chocar com o jeitão "frio" do europeu. Dá a impressão que a produção quis demonstrar tanto a ideia do "joga bonito" -- retratado como um sistema de jogo "primitivo" pelos europeus -- e do Brasil como "a terra do samba" que acabou escorregando em certo ponto.

A importância do Rei

O ator Milton Gonçalves, em coletiva de imprensa do filme realizada na segunda-feira (16) em São Paulo, lembrou da importância da figura icônica de Edson Arantes do Nascimento: "Vocês não imaginam a importância desse cidadão para os jovens negros, brancos e pobres que não tinham condições".

O consagrado ator global vive Waldemar de Brito, o olheiro que descobriu o menino jogando em Bauru e fez questão de o levar ao Santos Futebol Clube. Aos 83 anos, Milton contou que ia ao Estádio do Pacaembu na década de 60 e 70 apenas para ver Pelé e que até "virou a casaca" e começou a torcer para o Peixe. "A importância do Pelé para o Brasil foi de mostrar o jovem negro, jogador de futebol e muito bom. Ele foi um jogador maravilhoso, fazia algumas coisas que não eram o natural de um jogador de futebol", diz o ator.

A "ginga" ou o "joga bonito", como define o filme, foi a consagração da seleção brasileira pós-derrota em casa para o Uruguai na Copa do Mundo de 1950. E os europeus não gostavam nada dos dribles, cavadinhas e habilidade com a bola. "O Pelé chegou por ser ofendido por ser negro, aquela coisa de falar 'macaco' no pé do ouvido. Ele foi machucado não só fisicamente como verbalmente", analisa Milton Gonçalves. 

Bastidores do pequeno Pelé

Leonardo Lima Carvalho estava jogando em uma escolinha de futebol quando foi visto não por Waldemar de Brito, mas pela produção do filme, que o chamou para um teste.

O garoto tinha apenas 10 anos quando as filmagens começaram, em 2012, e ficou um mês ensaiando para incorporar o Rei quando ainda era uma criança. O garoto teve que jogar com bola de meia, em campinho da várzea, sem chuteiras, mas o difícil mesmo foi fazer embaixadinhas com uma manga.

O ator Leonardo Lima Carvalho em cena de "Pelé - O Nascimento de uma Lenda" - Reprodução - Reprodução
O ator Leonardo Lima Carvalho em cena de "Pelé - O Nascimento de uma Lenda"
Imagem: Reprodução
"Tudo era ensaiado. As [cenas] da manga foram as mais difíceis, teve uma vez que eu quase quebrei a lente da câmera. Quando falaram 'corta' eu tirei o pé e a fruta caiu na lente da câmera, foi um susto", contou o garoto, aos risos, durante coletiva.

O menino garante que agora está focado em atuar -- logo ele começa a gravar a quarta temporada de "Mister Brau" --, mas o sonho de infância era ser jogador de futebol. "Eu jogo bem desse jeito mesmo [que está no filme", brincou Leonardo, que também falou da honra de representar o único jogador de futebol tricampeão mundial. "A história mesmo dele não sabia quase nada, então fui aprendendo nesse um mês de ensaio. Foi sensacional [interpretar o Pelé], porque ele é o Rei do Futebol".

"Pelé - O Nascimento de Uma Lenda" estreia nos cinemas brasileiros no dia 26 de outubro.