Topo

Lista da Forbes confunde números com arte e coloca a atriz Larissa Manoela como destaque da literatura nacional

Rodrigo Casarin

22/03/2017 14h20

"Para o filme 'O Palhaço', do Selton Mello, fiz teste também. Me ligaram depois para me chamar para um call-back, que é tipo um novo teste com o diretor. Falaram que o Selton queria me conhecer. Conhecer o Selton foi incrível. Nós nos conhecemos, ele disse que gostou bastante do teste, me elogiou e falou com os meus pais. Só não disse se eu havia passado. Fiquei no suspense, kkkkk!"

Esse é um trecho de "O Diário de Larissa Manoela – A Vida, As Histórias e Os Segredos da Jovem Estrela", relato autobiográfico da atriz mirim Larissa Manoela, 16 anos, publicado no ano passado pela Harper Collins Brasil. Segundo a prestigiada revista Forbes, que acaba de lançar uma edição com "destaques brasileiros abaixo dos 30 anos", a garota é expoente da literatura nacional. Sim, repito, da literatura. Parece que estamos mais uma vez diante da confusão que muitos fazem entre o objeto livro e a arte literária.

A suposição é reforçada pela justificativa que a revista dá para a escolha da garota: "Em 2016, outro talento da menina foi apresentado ao público: o de escritora. O livro é o segundo no ranking dos autores brasileiros mais vendidos do ano, com 179 mil exemplares. E esse é somente o início de sua carreira: ela já começou a preparar a segunda obra, uma continuação do trabalho de estreia".

Ora, e daí que vendeu um monte e apareceu bem colocada nas listas dos mais vendidos? Isso representa uma vitória comercial, não necessariamente qualidade artística – e literatura, o nome da categoria em questão, é arte, não vendas. Procurei por alguns grandes méritos literários no livro da garota, mas não achei, tudo segue o tom do trecho que abre este post.

O nome de Larissa na relação causa ainda mais espanto se comparado aos outros autores ali presente, gente como Sheyla Smanioto e Victor Heringer. Estes costumam passar longe da lista dos mais vendidos, mas possuem textos bem trabalhados, que almejam um grande valor estético e simbólico, algo bem diferente do encontrado no diário da atriz – pelo que me pareceu, aliás, o título sequer tinha a pretensão de alcançar tal patamar, o que não é um problema.

Sei que a Forbes é uma revista focada em "pessoas de sucesso" e que para eles sucesso é sinônimo de dados e cifras impactantes. Esses, no entanto, jamais foram bons parâmetros para avaliar a arte. Então, uma Larissa Manoela pode até ser o nome certo para esse tipo de sucesso dentro do mercado editorial, mas isso, por si só, nunca significará qualidade literária. Na literatura o que importa é o texto, não os números.

Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.