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De volta ao país, Zucchero quer combater ódio com música: "Brasil tem alma"

O cantor italiano Zucchero Fornaciari, que fará show no Brasil - Reprodução/Facebook
O cantor italiano Zucchero Fornaciari, que fará show no Brasil Imagem: Reprodução/Facebook

Lucas Rizzi

De São Paulo

23/10/2017 22h44

Com mais de 60 milhões de discos vendidos em quase 40 anos de carreira, o cantor e compositor Zucchero Fornaciari, 62, chega ao Brasil no início desta semana para uma série de shows no país. Em quatro apresentações, o músico passará por Rio (26/10), São Paulo (27/10), Porto Alegre (28/10) e Curitiba (29/10), revendo um povo que, em suas próprias palavras, tem "alma".

"É um público que sente a música de modo particular, um público caliente", conta Zucchero em entrevista à agência de notícias Ansa.

Os shows fazem parte da turnê mundial do álbum "Black Cat" (2016) e incluem um dueto virtual com o tenor italiano Luciano Pavarotti, morto em 2007, e a canção "Street of Surrender", uma parceria com o amigo Bono, do U2, que simboliza os sentimentos provocados pelos atentados de 13 de novembro de 2015 em Paris.

Na entrevista, Zucchero falou sobre suas expectativas para os shows no Brasil e os planos para o futuro, incluindo aquele de escrever o "álbum mais belo" de sua carreira.

Ansa - O que você espera de suas apresentações no Brasil?

Zucchero - Espero tocar para um público que tenha vontade de ouvir boa música, de entrar um pouco no espírito do soul, do blues, do rock, com sabor italiano. Apresentarei meu novo álbum, que se chama "Black Cat", quase inteiramente, e minhas músicas mais conhecidas, como "Senza una Donna", "Baila", "Miserere". Também haverá um dueto virtual com Pavarotti. É um show que dura mais de duas horas e que percorre toda a minha carreira.   

Não é sua primeira vez no Brasil, certo?

Não, vim outras vezes, mas essa é a primeira vez que toco em lugares importantes, como os teatros em que tocaremos. Nas outras vezes, foram em locais pequenos. 

Nas outras vezes em que esteve aqui, que impressão você teve do público brasileiro?

O brasileiro é muito caloroso, muito musical, sempre respondeu muito bem. Em geral, o público brasileiro sente a música de modo particular, é um público de alma, caliente. É sempre prazeroso voltar a tocar no Brasil. 

Você conhece algo da música brasileira, além de Djavan e Sérgio Mendes, com quem já trabalhou?

Sim, há os grandes, como Vinicius de Moraes, Toquinho, Gilberto Gil, Marisa Monte. Conheço, digamos, aqueles mais famosos no exterior.   

Como nasceu a ideia para a música "Street of Surrender", que passou a ser associada aos atentados de Paris?

Tinha composto essa música, depois encontrei Bono e a levei para ele. Perguntei se ele queria fazer a letra em inglês e disse apenas que gostaria de manter a palavra "surrender", porque os tempos me inspiravam essa palavra. Depois, parti para Los Angeles, e ele continuou sua turnê. Passados 20 dias, ele me ligou e disse que estava em Paris, dois dias depois da tragédia do Bataclan, e disse: "Vi uma cidade que amo, como Paris, aterrorizada, sinto uma vibração muito ruim, aquilo que aconteceu me atingiu, e gostaria de escrever uma canção". Ela acena a Paris, mas em geral fala de não combater o ódio com outro ódio. Uma espécie de rendição, não como quando se está em uma guerra, mas quando alguém precisa parar de odiar o outro. Uma mensagem de amor, solidariedade. Saiu essa canção, que me agradou muito logo de cara, e decidi gravá-la.

Em meio a um mundo tão dividido, é cada vez mais difícil passar essa mensagem de combate ao ódio?

É muito difícil. Às vezes penso até que não há uma solução. Não vejo ainda uma luz no fim do túnel. Vejo também pouca força e pouca vontade por parte dos poderosos da Terra de resolver, de se comprometer totalmente com essa questão. Não se sabe até que ponto há vontade de colocar fim a esses conflitos.   

Zucchero, você passeia pelo blues, pelo soul, pelo pop, pelo rock. É possível definir seu estilo?

Eu nunca gostei de rótulos. Para mim, como dizia Pavarotti, existe música boa e música ruim. Dito isso, minha música seguramente tem o soul, o blues, o R&B, a música afro-americana em geral, mas há um componente muito italiano, no sentido melódico. Há um groove, um som, um ritmo afro-americano, sobre melodias muito mais latinas, italianas. Venho de uma terra, a Emília-Romana —Modena, Parma, Bolonha, Reggio Emilia—, onde a ópera sempre foi muito forte. Nasceram ali Giuseppe Verdi, Pavarotti, Mirella Freni, então tenho essas duas coisas dentro de mim: a mistura de música negra com melodia mediterrânea.   

O que podemos esperar do Zucchero para o futuro?

Entre o disco [Black Cat] e a turnê, os últimos dois anos foram muito desafiadores. Acho que o próximo será dedicado a pensar no que fazer mais para frente. Meu desejo é escrever o álbum mais belo da minha vida. Não quero parar sobre os elogios, não quero entrar no automático. Quero que o fogo continue sempre muito vivo. Até para autoincentivar minha criatividade. 

Depois de tanto tempo na estrada, o que ainda te motiva? 

Sempre fiz isso na minha vida. Desde quando tinha 11 anos, com pequenas bandas na escola, sempre vivi minha vida em função da música. Amo muito esse trabalho, gosto de me expressar, gosto de escrever, gosto de fazer shows. Até quando durar essa curiosidade, essa vontade de estar no jogo, esse permanece sendo o melhor trabalho do mundo.