Fado pleiteia título de patrimônio da humanidade
O fado pleiteia em uma reunião da Unesco (braço da ONU para a cultura) o status de manifestação artística considerada patrimônio imaterial da humanidade. Os preparativos para o dia da votação indicam que, para os portugueses, a escolha do fado como patrimônio é considerada praticamente certa, em votação que ocorrerá na madrugada de sábado para domingo durante o encontro da Unesco em Bali, na Indonésia.
Durante a votação, o Museu do Fado, em Lisboa, vai estar aberto, apresentando cantores de fado durante praticamente toda a noite. Na próxima sexta-feira, está agendado um grande show para comemorar a eventual nomeação numa das principais salas de espetáculos de Lisboa, o Coliseu, com os principais fadistas do país.
Sara Pereira, diretora do Museu do Fado e parte da comissão da candidatura do gênero musical a patrimônio da humanidade, explica que 49 manifestações culturais foram apresentadas na Unesco pleiteando o título de patrimônio da humanidade. "Sete delas foram consideradas pelo comitê de avaliação da Unesco como um exemplo de como deve ser organizada uma candidatura, e o fado é uma delas", conta.
Entre os que também pleiteiam entrar na lista de patrimônio imaterial está um ritual de um povo indígena brasileiro, voltado para "manter a ordem social e cósmica". O yaokwa é a principal cerimônia do calendário ritual dos enawenê-nawê, povo indígena cujo território tradicional fica no noroeste do Mato Grosso.
Raízes brasileiras
Segundo alguns especialistas, a canção portuguesa mais tradicional, espalhada pelo mundo por Amália Rodrigues, tem raízes brasileiras.
"Havia a dança do fado no Rio de Janeiro, que foi trazida quando a corte portuguesa que acompanhou D. João 6º ao Brasil retornou a Portugal", conta Sara Pereira. Ela diz que quem identificou a origem brasileira da música mais portuguesa foi o crítico e historiador musical brasileiro José Ramos Tinhorão.
As relações do fado com o Brasil têm sido estreitas. Amália Rodrigues gravou seu primeiro disco no Rio de Janeiro.
Em 1961, depois de casar com o brasileiro César Seabra, foi morar durante um período no Brasil. Um de seus grandes sucessos foi a transformação em fado da música sertaneja Mãe Preta, criada por Piratini e Caco Velho. Caetano Veloso, na música Língua, cita a fadista portuguesa Maria da Fé. Além desses nomes famosos, há outros fadistas no Brasil, cujo trabalho está sendo reunido como consequência do processo de candidatura a patrimônio, num trabalho realizado pelo Museu do Fado.
"Estamos neste momento trabalhando com algumas pessoas no Brasil para reunir a história do fado no século 20 no território brasileiro. Há um espólio enorme, de fadistas que viviam em Santos, São Paulo, Rio de Janeiro, Belém do Pará e Porto Alegre", conta Carlos do Carmo, o segundo fadista vivo com mais discos vendidos.
"São portugueses que emigraram e não são conhecidos em Portugal. Temos já 50 a 60 fados feitos no Brasil por gente muito interessante", acrescenta. "Vai ser ótimo para o nosso país fazer com que o fado seja mais respeitado. O fado vai entrar no plano educativo e passará a ser ensinado às crianças nas escolas", diz Cuca Roseta, fadista
Segundo Carlos do Carmo, a maior parte desses fadistas era pouco conhecida fora da comunidade portuguesa das cidades em que viviam.
Fadistas
Patrocinada pela prefeitura de Lisboa, a candidatura a patrimônio da humanidade animou os fadistas portugueses. "Acho que faz todo o sentido. Uma vez que o tango e o samba de roda estão nessa lista, o fado tem todo o direito de estar lá também", afirma o fadista Antônio Zambujo.
Vinda da música pop e convertida ao fado há seis anos, a cantora Cuca Roseta acredita que a decisão da Unesco não vai beneficiar apenas o gênero de música, mas Portugal. "Vai ser ótimo para o nosso país fazer com que o fado seja mais respeitado. O fado vai entrar no plano educativo e passará a ser ensinado às crianças nas escolas."
A candidatura prevê um plano de salvaguarda para preservar a memória do fado, com a participação de instituições acadêmicas, museus, arquivos, associações e os clubes onde várias vezes por semana se pode ouvir o fado, muitas vezes cantados por amadores.
Também haverá um programa educativo para formar músicos e construtores de instrumentos usados no fado, como a guitarra portuguesa – instrumento aparentado com o violão, com caixa de ressonância arredondada e seis cordas de metal.
Os especialistas explicam que tem como origem a cítara grega (kítara) e inicialmente recebia o nome de guitarra mourisca, por ter semelhanças com o alaúde – ainda que o som seja muito distinto.
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