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O "povo está cobrando o Governo", diz Milton Nascimento sobre protestos

23/06/2013 10h56

Testemunha de vários momentos políticos que marcaram a história do Brasil nos últimos 50 anos, o cantor Milton Nascimento disse estar emocionado com os protestos no país e comentou que o povo passou a "cobrar" do Governo problemas como "corrupção e omissão".

Milton elogiou as manifestações em entrevista à Agência Efe e admitiu que não esperava que algo com tamanha proporção ocorreria no Brasil após a queda do então presidente Fernando Collor, que renunciou depois que milhares de pessoas saíram às ruas para pressioná-lo por conta de um escândalo de corrupção.

"Estava em Curitiba, onde participei de um evento com estudantes e professores universitários, quando percebi tudo o que estava ocorrendo no país. Achei que depois da renúncia do Collor isso não voltaria a ocorrer no Brasil", disse.

"As pessoas que estão nas ruas sabem muito bem o que necessitamos. Na verdade, sabemos há séculos. A exploração, a corrupção e a omissão... tudo segue igual desde que estas terras foram ocupadas. Não é novidade para ninguém. Só que agora ocorreu o que os políticos não esperavam: o povo está passando da conta e, mais importante, vai cobrar caro por isso", acrescentou.

As manifestações contra os aumentos das tarifas no transporte público em todo o país ganharam novas reivindicações, como melhorias na saúde e na educação, e críticas à corrupção e aos altos custos para realizar a Copa do Mundo de 2014.

Os protestos tiveram seu auge na quinta-feira, quando cerca de 1,2 milhão de brasileiros se manifestaram em 100 cidades, e ainda não pararam apesar das principais cidades já terem anunciado a redução no preço das passagens de ônibus e o convite ao diálogo feito ontem pela presidente brasileira Dilma Rousseff.

O cantor lembrou que, desde o começo de sua carreira, sempre se envolveu em temas políticos e sociais e que por isso se identifica com os protestos.

"Se diz muito pouco, mas minha militância começou ainda durante a ditadura (1964-1985), quando viajava por todo o país para fazer apresentações em universidades e apoiar o movimento estudantil mediante minha atuação como músico, inclusive em centenas de manifestações", afirmou.

"Eu não poderia ajudá-los fora do Brasil, por isso que decidi ficar aqui durante os 20 anos da ditadura", acrescentou, ao lembrar que vários outros músicos preferiram o exílio quando começaram a ser perseguidos.

O cantor lembrou que o período foi muito difícil, especialmente pelas perseguições e o cerco que sofria, e que chegou a dizer que do Brasil só sairia morto.


Milton lembrou também outros momentos em que esteve envolvido como militante, como o projeto Missa dos Quilombos, em 1982, quando uma inédita aliança entre o episcopado da Igreja Católica e os movimentos de defesa de negros, índios e camponesas que lutam pelos descendentes dos africanos no Brasil.

"Também atuei na campanha das Diretas Já (movimento político para pedir que a ditadura convocasse eleições diretas para presidente) e até na luta contra o apartheid na África do Sul", assegurou.

Milton acrescentou que sua última ação como militante foi em um evento no estado do Mato Grosso do Sul a favor dos índios Guarani, que considerou um dos povos mais explorados em toda a história da América Latina.

"Sempre que vejo algo pelo qual vale a pena lutar, me inscrevo", assegurou.

Além de Milton Nascimento, muitos outros artistas e personalidades manifestaram apoio às manifestações.

Em declarações à Efe, o músico Otto assegurou que enquanto as manifestações de 1992 eram para derrubar um Governo corrupto, as de agora são para "tirar a corrupção do poder".

O cantor Caetano Veloso manifestou em seu blog sua identificação com os manifestantes e disse que os protestos estão dando voz aos sentimentos ainda não articulados, mas servem para os brasileiros pensarem.

"Viva a democracia. Finalmente o povo brasileiro despertou e resolveu tomar para si o poder que é seu. Sonhei com este momento", afirmou a cantora Daniela Mercury em sua conta em Twitter.

Daniela Mercury citou a música "Canção com todos", famosa na voz da cantora argentina Mercedes Sosa: "Todas as vozes, todas, todas as mãos todas, todo o sangue pode ser canção no vento, canta comigo, canta, irmão americano".