Mary J. Blige supera má fase com CD novo e filme e diz que "aquilo que não te mata torna você mais forte"

CINDY PEARLMAN
The New York Times Sindycate

Mary J. Blige já teve sua cota de tempos ruins, mas ela prefere falar sobre os bons tempos. “Eu me lembro, durante o lançamento do meu CD ‘Breakthrough’, de uma mulher ter telefonado para uma emissora de rádio e me dito: ‘Mary J., eu estava prestes a me jogar de carro de um penhasco, mas então ouvi sua voz e suas canções. Eu não vou mais me lançar daquele penhasco’”, recorda Blige.

  • AP

    Mary J. Blige recebe prêmio de melhor interpretação de R&B feminina no Grammy Awards, em Los Angeles (11/02/2007)

E não é só isso. Ela conta: "uma menininha teve seu rosto destruído por um cachorro e precisou de uma extensa cirurgia reconstrutiva. A mãe dela me disse que ela ouviu a música ‘No More Drama’ e conseguiu falar suas primeiras palavras desde que o cachorro a feriu. Ela ouviu minha canção, abriu sua boca pela primeira vez em meses e disse: ‘eu quero viver’", conta. Blige garante que sua vida é maior do que essas canções. "Minha vida se trata dessas histórias, que fazem com que me sinta humilde e que me sinta um instrumento usado por Deus".

Seu projeto atual é um filme sobre o tema favorito da cantora/compositora/atriz: redenção. Após ter suportado uma dolorosa história pessoal --incluindo abuso de drogas, alcoolismo e ter sido molestada por um amigo da família aos 5 anos de idade-- e ter se recuperado para conquistar nove prêmios Grammy e vender mais de 40 milhões de álbuns em todo o mundo, Blige acredita piamente na redenção e apresenta essa filosofia no filme “I Can Do Bad All By Myself”, de Tyler Perry.

A comédia será lançada nos cinemas americanos em 11 de setembro, com Blige atuando e também contribuindo para a canção-tema. “Este filme tem uma mensagem poderosa”, diz Blige. “Ele fala de como você pode dar uma virada em sua vida, a qualquer momento, com a ajuda de pessoas queridas e que lhe dirão a verdade, mas o principal jeito de mudar sua vida é você mesmo estar disposto a se olhar no espelho e enfrentar a si mesmo".

Enfrentando os problemas
Em “I Can Do Bad All By Myself”, Blige interpreta Tanya, uma dona de boate. Sua melhor amiga é April (Taraji P. Henson), uma cantora da boate que bebe demais e que é sustentada pelo seu namorado casado (Brian J. White). Enquanto isso, Madea (personagem feminina interpretada por Perry) flagra Jennifer (Hope Olaide Wilson), de 16 anos, e seus dois irmãos mais novos saqueando sua casa, e entrega as crianças para a única parente viva delas: a tia April.

“Eu amo o Tyler Perry. Ele é o motivo para eu estar neste filme”, diz Blige. “Ele é meu amigo e um sujeito fantástico, que me faz rir até chorar. Quando ele ligou para meu empresário e perguntou seu eu podia estar em seu filme, eu disse: ‘fico feliz por poder participar’". Perry também ficou contente. “Não havia dúvida na minha cabeça de que Mary J. Blige era quem poderia interpretar Tanya”, disse o cineasta em uma outra entrevista. “Ela é a maior cantora de sua geração e tem muita presença e força pessoal".

MARY J. BLIGE: "JUST FINE"

Após suas próprias lutas contra o álcool e as drogas, Blige pôde se relacionar com os problemas de April. E ela acha que é vital enviar uma mensagem de esperança a outras mulheres enfrentando demônios semelhantes. “Agora eu ouço mulheres que me dizem: ‘eu era alcoólatra, mas por sua casa e do que fez em sua vida, eu parei’”, diz a cantora. “Eu ouço: ‘eu saí de um casamento abusivo quando você me fez perceber que eu devia me divorciar daquele homem, por causa de uma canção que você compôs sobre um amor que dá errado’. Essas coisas são muito grandes".

Blige, de 38 anos, nasceu em Nova York. Suas lembranças da vida no Bronx, onde ela cresceu como a segunda de quatro filhos, são tão doces quanto amargas. “Cresci vendo mulheres sofrendo. Eu estava na cama à noite e ouvia mulheres gritando por socorro porque estavam sendo espancadas por homens. Já na infância eu jurei que faria tudo o que pudesse para ajudar as mulheres. Eu tenho empatia com a dor dos outros".

Após ela ter revelado no programa de televisão de Oprah Winfrey o abuso que sofreu na infância, Blige ouviu muitas histórias de pessoas que sofreram agonia semelhante. A pergunta mais frequente que faziam era como ela conseguiu perdoar o homem que a molestou. “Minha resposta é que você não está sozinha. Há celebridades e pessoas comuns que estão sofrendo como você. Eu quero ajudar as pessoas a lidarem com isso como eu, a seguirem em frente, e isso envolve perdão. Você precisa perdoar alguém".

Segundo a cantora, é um dia de cada vez, passo a passo. "Eu não acordei certa manhã e disse: ‘ok, acabou’. Eu precisei chegar a um entendimento interior de que não devia me sentir culpada ou envergonhada por algo que não fiz. A pessoa que me feriu era doente".

Atriz, cantora, compositora e jurada
Blige abandonou a escola no ensino médio e aos 17 anos gravou sua própria versão de “Caught Up in the Rapture”, de Anita Baker, em um estúdio de gravação em um shopping local. O namorado de sua mãe tocou a fita para um diretor da Uptown Records, que prontamente a enviou para seu presidente-executivo. Em 1989, Blige assinou com a gravadora como a mais jovem artista da empresa e sua primeira artista do sexo feminino. Mas não foi sua grande projeção, porque ela inicialmente foi contratada apenas como cantora de apoio para outros artistas.

Em 1991, entretanto, um jovem executivo da Uptown chamado Sean “Puffy” Combs passou a cuidar da carreira de Blige e acelerou a produção de seu álbum de estreia, “What’s The 411?”. O disco foi lançado em 1992 e chegou ao primeiro lugar nas paradas de rhythm and blues. De lá para cá, ela decolou com uma mistura de soul à moda antiga com R&B e hip-hop, em CDs de sucesso como “No More Drama” (2002), “Love & Life” (2003), “My Life” (2004) e “The Breakthrough” (2005).

Em 2007, enquanto seu álbum “Growing Pains” (2007) vendia um milhão de cópias em apenas três semanas, Blige lançou sua carreira como atriz. Ela já tinha feito incursões ocasionais nas telas e nos palcos no passado, mas agora está dando uma atenção séria a isso. Ela começou com uma participação especial no seriado “Ghost Whisperer” (2007) e depois interpretou a si mesma em “Entourage” (2007), onde trocava comentários sarcásticos com o agente Ari Gold (Jeremy Piven).

Ainda em 2007 ela fez uma participação especial no seriado “30 Rock”, como ela mesma, e gravou uma participação em “American Idol”, que deverá ir ao ar no próximo ano. “Eu fui jurada em Atlanta durante os testes, mas não sou a nova Paula Abdul".

MARY J. BLIGE E GEORGE MICHAEL

Enquanto isso, ela está trabalhando em um novo álbum, ainda sem título. “É um CD sobre como aquilo que não te mata torna você mais forte. Por meio dessa nova música eu falo de um lugar verdadeiro, de tristeza, de amor e de vida. Fico feliz por ser vulnerável na minha música. Eu não tenho medo de ir àquele lugar, sou corajosa e me mantenho firme com as canções. Quando componho e canto, eu sempre sou honesta a respeito de onde estou no momento".

Volta por cima
Atualmente Blige está solteira, após um relacionamento tumultuado de seis anos com o vocalista do Jodeci, Cedric “K-Ci” Hailey, que terminou em 1997, e um casamento de seis anos com o executivo de gravadora Martin Kendu Isaacs, a quem ela dá crédito por tê-la ajudado a se livrar dos seus vícios em álcool e drogas, mas de quem está atualmente separada.

“As mulheres realmente precisam olhar para suas próprias inseguranças quando se trata de homens. Não precisamos de ninguém. A única coisa que precisamos é amar a Deus e a nós mesma. Nós não precisamos de um homem que faça nos sentirmos bem. Não precisamos que ele nos dê um abraço, nós queremos que ele nos dê um abraço. Nós queremos, mas não precisamos".

Ela suspira. “As mulheres têm uma construção muito diferente dos homens. Nós somos construídas para sofrer muita dor. Qualé?", ela acrescenta com uma gargalhada. “Nós temos cólicas, dores de parto... as coisas que sofremos, física e emocionalmente, a maioria dos homens não conseguiria suportar. É uma coisa mental, que somos assim fortes, e não é culpa deles".

“Uma mulher já me disse: ‘você é tão forte. Você é capaz de lidar com tudo’. Mas eu também tenho momentos de fraqueza. Eu tenho muitos momentos de fraqueza que as pessoas não veem. Eu apenas não permaneço ali tempo o suficiente para que infeccione. Há dias em que eu nem quero sorrir, mas então me lembro de quão bom Deus é comigo".

(Cindy Pearlman é uma jornalista free-lance baseada em Chicago)

Tradutor: George El Khouri Andolfato

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