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Após briga com gravadora, Joss Stone lança "Colour Me Free" e defende que a música não é um produto

Joss Stone durante show com Bens Brothers na O2 Academy Islington, em Londres (29/05/2009) - Getty Images
Joss Stone durante show com Bens Brothers na O2 Academy Islington, em Londres (29/05/2009) Imagem: Getty Images

GARY GRAFF*<br>The New York Times Sindycate

30/11/2009 17h13

Liberdade é um dos sentimentos preferidos de Joss Stone --seu novo álbum se chama "Colour Me Free" (algo como "Pinte-me Livre")--, mas ela às vezes se vê forçada a ter que defender isso. E a liberdade nunca foi mais verdadeira para a cantora e compositora de soul britânica do que neste seu quarto álbum de estúdio, que estreou em 10º lugar na parada Billboard 200 em outubro.

Stone e seus companheiros gravaram o disco no início de 2008 na cidade inglesa Somerset --próximo à cidade natal dela, Devon. O álbum então permaneceu na gaveta enquanto ela brigava com sua gravadora, a EMI, para lançá-lo como ela desejava. "Eu gosto de pensar que me liberto por meio da arte", diz a cantora de 22 anos, falando por telefone de Colônia, na Alemanha, durante uma parada promocional para "Colour Me Free".

"Ser sufocada e ficar presa é a coisa mais horrível para mim, por isso escolhi ser livre por meio da arte. E agora percebo que essa liberdade nunca é dada a você. Você precisa tomá-la. Foi o que fiz", ela conta. Não foi fácil. A EMI hesitou diante do álbum quando Stone --cujo "Introducing Joss Stone" (2007) vendeu 1,3 milhão de cópias em todo o mundo-- o entregou.

Joss Stone - "Right To Be Wrong"

Os executivos da gravadora disseram que "não era bom e que não ia vender nada", ela lembra. Eles queriam que Stone trouxesse colaboradores de renome e fizesse mudanças que ela sentiu que "extrairiam a música e a alma do álbum". Então ela bateu o pé e, olhando para trás, sente que a batalha envolveu mais a metodologia do que a música.

"Eu acho que foi por não ter envolvido (a empresa)", explica Stone. "E por que precisaria? Eu não os conheço, mas eles não são músicos. Eles diziam 'como você ousa compor suas próprias canções e gravá-las sem nos perguntar? Nós somos sua gravadora. Você deve cantar as canções que dizemos para você cantar!", ela conta.

Joss lembra que, ao final do dia, ela não devia ter que pedir permissão para fazer música. "Para eles, é apenas outro produto, mas para mim essa é minha vida. Como empresária eu entendo, de certa forma, que gostariam de ter controle completo sobre seu produto, e eu sou o produto deles. Não significa que concorde, mas eu entendo".

Inspiração sem planos
A individualidade está na essência da arte de Joss Stone desde que ela surgiu em 2003, como uma novata de 16 anos com uma voz que desafiava sua idade, refletindo uma dieta constante de rhythm and blues. Suas favoritas pessoais incluíam Aretha Franklin e Dusty Springfield, que ela cresceu ouvindo como a terceira de quatro filhos criados em Dover.

Stone fez sua estreia nacional aos 14 anos, cantando "On the Radio" de Donna Summer para o show de calouros da BBC, "Star for a Night". Ela continuou a cantar músicas de outras pessoas em seu álbum de estreia, "The Soul Sessions" (2003), que foi um sucesso e uma surpresa tanto nos Estados Unidos quanto no Reino Unido.

"Mind, Body, Soul", do ano seguinte, chegou ao topo das paradas britânicas e vendeu mais de 7,5 milhões de cópias em todo o mundo, e Stone ganhou elogios ao se juntar a Melissa Etheridge em um tributo a Janis Joplin na cerimônia do Grammy de 2005. Mesmo assim, ela considerou "Introducing Joss Stone", produzido pelo renomado Raphael Saadiq, como sendo "meu primeiro álbum de verdade, em que senti que fiz um álbum a meu respeito e que refletia o que queria fazer na música".

A gravação do disco também alimentou rumores de que ela e Saadiq eram um casal, o que Stone minimiza, mas não nega. "Eu o amo muito, isso eu posso dizer. Ele é uma pessoa adorável e achei que seríamos bons companheiros por muito tempo. Nós inspiramos um ao outro a fazer música, mas não deu em nada. A música é definitivamente o nosso lance e devemos nos ater a isso".

Joss Stone - "You Had Me"

Joss Stone não tinha um plano formal de gravar músicas novas quando começou "Colour Me Free". Ela estava em casa em Devon e fez uma visita a Mama Stone's, um clube que sua mãe estava construindo em uma casa velha na cidade de Wellington, usando o piso inferior como espaço para apresentações e o andar superior como salas de composição e um estúdio de gravação.

Ao ver uma cabine de voz recentemente construída, Stone foi tomada por inspiração. "Eu acordei no dia seguinte pensando 'eu quero gravar um álbum e não quero pensar a respeito, eu não quero reunir canções. Eu quero fazê-lo já!' Então telefonei para minha assistente, que mora nos Estados Unidos, e perguntei se ela poderia telefonar para minha banda e ver se eles estavam disponíveis para vir a Devon por uma semana. Ela disse: 'claro, para quando você quer a presença deles?' E eu disse: 'No próximo voo'. Todo mundo pensou algo como 'ela pirou!'".

Os músicos da banda de turnê de Joss Stone estavam todos disponíveis. Em pouco tempo, com um punhado de equipamento de estúdio alugado e com os produtores e compositores Conner Reeves e Johnathan Shorten a bordo, o grupo tomou conta do Mama Stone's para uma semana intensa de criação. "Nós compúnhamos a canção, ensaiávamos por um minuto e então gravávamos, então compúnhamos outra e gravávamos".

Segundo ela, a banda não se sentava para pensar como queriam que aquele álbum representasse a Joss Stone. "Não tinha nada de 'que canções vamos escolher?' e bla bla bla. Nós apenas fizemos música. Por mais louco que possa parecer, não é loucura. É a forma como deve ser, aos meus olhos. Foi a maior diversão que já tive gravando um álbum na minha vida. Eu adorei, e todo mundo adorou também".

"Se não gostam do que faço, me demitam"
"Colour Me Free" inclui "Big Ol' Game", uma faixa das sessões de "Introducing Joss Stone" com Saadiq, assim como o single "Free Me", que Stone considera um "manifesto" do espírito desafiador com que fez o álbum. O disco adquire um tom político em "Governmentalist", cujos rumores dizem ter sido oferecida à campanha presidencial de Barack Obama, apesar de Joss Stone dizer que ela foi composta em resposta às autoridades britânicas, que a atacaram após ela ter criticado o tratamento dados aos soldados que voltavam do Iraque e do Afeganistão.

  • Alex Almeida/UOL

    Joss Stone durante show em SP (22/11/2009)

Stone conta que as autoridades britânicas a inspiraram a compor a canção, "porque não é certo sermos repreendidos por usarmos nossa liberdade de expressão. No final do dia, nós todos temos nossas opiniões, independente de estarmos certos ou errados. Um integrante do governo quis me telefonar e consertar a situação, então lhe dei meu número, mas ele nunca ligou. Para que isso? Sério, por que se importar com o que eu penso? Eu sou uma cantora. Eu não vou afetar o trabalho deles de forma nenhuma. Eu estou apenas falando".

"Governmentalist" conta com um rap de Nas, enquanto outras faixas de "Colour Me Free" trazem participações especiais do guitarrista Jeff Beck, da percussionista Sheila E. e do saxofonista David Sanborn. "O que aconteceu na verdade é que gravei um álbum que foi mantido no limbo por muito tempo, e não pude evitar acrescentar coisas. E as pessoas que o ouviam ficavam dizendo: 'uau, isso está realmente legal', então participavam. Quando as pessoas gostam da música, elas querem fazer parte dela. Essas pessoas são artistas de verdade. Isso não é um negócio para elas. Trata-se de música".

Mas o lado dos negócios continua ofuscando "Colour Me Free", mesmo após Stone e a EMI terem chegado a um acordo para lançá-lo. Ela está plenamente comprometida em promovê-lo, mas também lamenta o que considera um fracasso da gravadora em dedicar recursos apropriados para o esforço, como fica evidente pela falta de um videoclipe para "Free Me". "Eu não quero bancar a difícil. Eu disse que lamento se eles não o consideram bom. Eles não precisam gastar muito dinheiro nele. Se não gostam do que eu faço, então me demitam. Obviamente, não é tão simples, mas gostaria que fosse".

Por ora, Stone, que também está testando seu lado de atriz ao interpretar Ana de Cleves na popular série "The Tudors" do canal Showtime, está fazendo o máximo que pode por conta própria para divulgar "Colour Me Free". Ela planeja fazer turnê em 2010, passando pela América do Norte em janeiro e pela Europa em fevereiro, e espera que isso levará a mais oportunidades para provar que realmente há um público para essa música.

"É isso o que me anima. Eu amo tanto a música e acho que se fizesse o que me foi pedido para fazer (pela EMI), eu a estaria desrespeitando. Não dá para simplesmente colocar a música em uma caixa. É preciso deixá-la livre e bela, e torcer para que as pessoas gostem. E promovê-la da forma como prometeu que faria, com estou fazendo. E se vender 10 mil cópias, estarei feliz. Desde que as pessoas gostem, então sou uma menina feliz".

*Gary Graff é um jornalista free-lance baseado em Beverly Hills, Michigan

Tradutor: George El Khouri Andolfato