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Rosanne Cash diz que não queria divulgar lista com canções essenciais do country escolhidas por seu pai

A cantora norte-americana Rosanne Cash em foto de divulgação - Deborah Feingold/Divulgação
A cantora norte-americana Rosanne Cash em foto de divulgação Imagem: Deborah Feingold/Divulgação

GARY GRAFF

The New York Times Sindycate

26/01/2010 12h05

Quando ela tinha 18 anos, o pai de Rosanne Cash, o lendário cantor country Johnny Cash, deu a ela uma lista de 100 canções country essenciais para ajudar a fortalecer seu talento artístico no início à sua carreira.

"A Lista” se transformou em uma lenda, uma espécie de mito, após ela mencioná-la casualmente para alguns jornalistas, e ganhou mais peso após a morte de seu pai em 2003. Mas a lista em si permaneceu privada até outubro de 2009, quando Cash lançou “The List”, um álbum com uma dúzia de canções da lista de seu pai e a primeira vez em que ela identifica algumas das canções que Johnny Cash tinha em alta estima.

“A verdade é que eu não queria compartilhar a lista”, diz Cash, 54 anos, por telefone da casa em Nova York que ela divide com seu marido e produtor, John Leventhal. “Tanta coisa do meu pai foi explorada e não foi Johnny Cash que me deu a lista –foi meu pai quem me deu a lista, de forma que quero mantê-la para mim mesma. Eu não quero colocá-la na Internet e deixar que todo mundo saiba o que está nela ou algo assim.”

Rosanne Cash, a filha mais velha de Johnny Cash e sua primeira mulher, Vivian, diz que manter a lista privada também faz parte de uma longa luta com sua linhagem musical e do desejo de ser uma artista por conta própria, em vez de simplesmente a filha de Johnny Cash.

“Eu ainda tenho uma ação por reflexo contra fazer algo tão ligado ao meu pai”, até que Leventhal “apontou que, ‘esta não é a lista do seu pai, é a sua lista. Ele a deu para você. Agora ela é sua’”.

“Eu então pensei um pouco e disse: ‘Não só é minha, como devo me apropriar dela’. É muito importante. Eu já passei da idade de me preocupar com isso. Não tem mais graça. E minha própria filha (Chelsea Crowell) já lançou seu primeiro disco. Faz parte de uma história em andamento. Seria terrível rejeitar isso.”

É fácil entender a luta de Rosanne Cash. Além da enorme sombra da fama de seu pai, o divórcio amargo de seus pais em 1966 –narrado em muitos livros, artigos e no filme “Johnny e June” (2005)– a deixou em conflito a respeito da simples ideia de seguir carreira na música. Mesmo assim, após se formar no colégio, ela se juntou ao seu pai na estrada, primeiro como assistente de figurino e depois como vocalista de apoio. Ela o deixou no final dos anos 70 para estudar inglês e teatro na Universidade Vanderbilt, em Nashville, e depois foi para o Instituto de Teatro Lee Strasberg, em Hollywood.

Mas a música ainda era sua vocação e, após gravar algumas demos com Rodney Crowell em 1978, ela assinou com a Ariola Records na Alemanha e, dois anos depois, com a Columbia Records.

A estreia norte-americana de Rosanne Cash, “Right or Wrong” (1980), produziu três singles country Top 25, incluindo “No Memories Hangin’ Around,” um dueto com Bobby Bare. A faixa título de “Seven Year Ache” (1981) chegou ao primeiro lugar nas paradas country, enquanto o álbum recebeu um disco de ouro. Ao todo, Cash, que se casou com Crowell em 1979 e teve três filhas com ele antes de se divorciar em 1992, conseguiu 11 singles de country que chegaram ao topo da parada e conquistou um prêmio Grammy por “I Don’t Know Why You Don’t Want Me” (1985).

Ela também escreveu livros, incluindo a coleção de contos “Bodies of Water” (1996) e o livro infantil “Penelope Jane” (2000), além de ter editado a coleção “Songs without Rhyme: Prose by Celebrated Songwriters” (2001). Ela sobreviveu a debilitantes pólipos na garganta em 1998, enquanto seu álbum “Black Cadillac” (2005) fez as pazes com seu passado, após as mortes de seu pai e de sua madrasta, June Carter Cash, ambos em 2003, e sua mãe, em 2005.

Carreira interrompida
Em 2007, Cash foi diagnosticada com malformação de Chiari tipo 1, uma rara condição benigna mas que exigia cirurgia no cérebro, o que interrompeu sua carreira musical por tempo indeterminado.

“O primeiro ano após a cirurgia foi realmente difícil”, diz Cash, que ainda realiza fisioterapia. “Eu fiquei incrivelmente sensível ao som. Eu não queria ouvir muita música com letras. Eu podia ouvir música clássica... mas não queria ouvir ninguém falando. Isso voltou lentamente, de forma que tenho escutado obsessivamente os compositores, como se tivesse perdido algo!”

Cash tinha o desejo de gravar o mais rapidamente que pudesse, então imaginou que um álbum de covers seria o mais fácil.

“E como (Leventhal) disse, o único álbum de covers a fazer viria da lista.”

Escolher as canções, ela diz, foi a parte mais divertida de todo o projeto. Tendo o biógrafo de Cash, Michael Streissguth, para narrar o processo para um livro relacionado, “Always Been There: Rosanne Cash, the List and the Spirit of Southern Music”, ela e Leventhal estudaram suas opções até chegarem a 12 canções para o álbum, que chegou ao 5º lugar na parada country Billboard e ao 22º lugar na parada Billboard 200.

“Foram partes iguais de erudição e intuição. Estas canções estão todas na lista por um motivo. Elas todas são canções realmente ótimas que podem ter muitas interpretações diferentes e merecem muitas interpretações.”

Por causa disso, ela diz, ela e Leventhal foram cuidadosos em relação aos arranjos para as versões dela, que variam do standard de domínio público, “Motherless Children”, até “Girl From the North Country” (1963) de Bob Dylan e “Silver Wings” (1969) de Merle Haggard, passando por canções da Carter Family, Harlan Howard, Hank Snow e mais.

“Não há sentido em fazer cópias das versões originais”, explica Cash. “Eu não acho que se copiasse a versão de Ray Charles de ‘Take These Chains from My Heart’ eu a faria melhor. Era preciso algo meu nelas, caso contrário não haveria sentido em fazê-las.”

Cash recebeu a aprovação de Elvis Costello –que participa de “The List”, juntamente com Bruce Springsteen, Jeff Tweedy e Rufus Wainwright– após ele ter ouvido o álbum.

“Elvis me enviou um e-mail dizendo: ‘Para mim, havia apenas duas versões de “Take These Chains...” Agora há três’. Eu chorei quando li isso, porque era exatamente o que eu buscava. Pensar que uma das minhas interpretações dessas canções poderia ficar lado a lado com outras interpretações é emocionante.”

Cash, entretanto, diz que sua meta era a expressão artística, não um serviço público.

“Eu não o abordei dessa forma, mas foi um subproduto. Eu achei que seria mortal se tentasse converter as pessoas –‘Agora vou ensinar isso a você!’ Mas muita gente me abordou perguntando, ‘Você compôs “Sea of Heartbreak”?’ Você está brincando?”

“E não foram apenas jovens. São pessoas de todas as gerações. Pessoas também da minha idade. Mas, mesmo que não as conheçam, elas meio que as reconhecem. Essas canções estão no DNA, na experiência cultural americana, de forma que mesmo que você nunca as tenha escutado, você meio que as conhece assim mesmo.”

Rosanne Cash passará parte de 2010 na estrada promovendo “The List”, mas ela diz que ela e Leventhal já estão planejando um segundo volume, que incluirá uma versão de “I’m So Lonesome I Could Cry” de Hank Williams, que eles gravaram para o álbum atual mas que ficou de fora –o que, diz Cash, “meio que partiu meu coração”.

Isso não significa que devemos esperar mais sete álbuns que explorem a lista completa. Algumas canções simplesmente não são certas para ela –“Great Speckle Bird”, de Roy Acuff, “não faz sentido para mim”, diz Cash, de forma que ela provavelmente não gravará toda a lista, mesmo que as vendas estimulem isso.

Quando à lista em si, ela não a guardará para si mesma para sempre. No final, Cash promete, ela a dará para o Salão da Fama da Música Country, para o Instituto Smithsoniano ou alguma outra entidade adequada.

“No momento certo, eu farei a coisa certa e a arquivarei de forma apropriada. Após ela deixar de ser essa coisa maravilhosa que meu pai me deu, ela precisa passar a ser essa coisa maravilhosa que agora faz parte do acervo musical americano. Logo, a certa altura, eu farei a coisa certa –mas ainda não.”

Autobiografia
Cash também tem outros projetos em mente. No final deste ano ela planeja publicar sua autobiografia, que ela diz não ser “estritamente cronológica, tipo: ‘Eu nasci em uma terça-feira e então, na semana passada...’ É um pouco mais subjetivo que isso”.

Ela também começou a compor novas canções, muitas delas derivadas, sem causar surpresa, de sua recente crise de saúde.

“Eu agora me tornei uma favorita dos neurocientistas que são especializados em música”, diz Cash rindo, “então comecei a compor canções sobre ciência. É realmente interessante –como partículas e ondas e mundos paralelos, todas essas coisas, como uma metáfora, é claro. Será interessante ver no que isso tudo resultará”.

“Certamente é diferente.”

(Gary Graff é um jornalista free-lance baseado em Beverly Hills, Michigan.)