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Cantor e guitarrista Steve Miller revisita raízes musicais em "Bingo!"; leia entrevista

O cantor e guitarrista norte-americano Steve Miller - Divulgação
O cantor e guitarrista norte-americano Steve Miller Imagem: Divulgação

GARY GRAFF

The New York Times Sindycate

14/06/2010 10h03

Dezessete anos se passaram desde que Steve Miller lançou seu mais recente álbum, mas agora o homem conhecido como “Caubói do Espaço”, como “O Coringa” ou, para aqueles familiarizados com o último sucesso deste, como Maurice, está compensando o tempo perdido.

O novo álbum de Miller, “Bingo!”, conta com covers de rhythm & blues e blues de artistas como Lowell Fulson, B.B. King e Jimmy Reed, assim como três canções do ex-guitarrista dos Fabulous Thunderbirds, Jimmie Vaughan. Mas espere, há mais: as sessões de “Bingo!” resultaram em um segundo álbum, que Miller planeja lançar em junho de 2011, lembrando aos seus antigos fãs os seus lançamentos multiplatinados consecutivos “Fly Like an Eagle” (1976) e “Book of Dreams” (1977).

Seus fãs, que compraram mais de 50 milhões de cópias de seus álbuns desde 1968, certamente estão felizes por terem algo novo em um catálogo marcado por sucessos como “Livin’ in the U.S.A.” (1968), “Take the Money and Run” (1976), “Rock 'n Me” (1976), “Jet Airliner” (1977) e “Jungle Love” (1977). Mas Miller alega que mal notou a passagem do tempo.

“Sabe como é, passou tão rápido e eu não sentia que precisava lançar um álbum”, diz o guitarrista de 66 anos por telefone, de sua casa em Idaho. “Realmente não. Eu estava bem e me sentindo bem. Nós vínhamos tocando, tocando e tocando, realmente na estrada. As coisas apenas se encaminharam para o que parecia ser um bom momento para lançar um álbum, enquanto antes não parecia.”

“Foi assim simples, sério.”

Steve Miller Band - "The Joker"

“Bingo!” teve início há dois anos, enquanto Miller e o co-produtor Andy Johns trabalhavam no DVD ao vivo “Live from Chicago”.

“Eu planejava gravar um punhado de faixas de rhythm & blues e alguns blues, e estava selecionando material e pensando a respeito. E enquanto estávamos trabalhando no DVD, ele disse: ‘Cara, eu realmente adoraria gravar um álbum de guitarra com você’. Então eu disse: ‘Sabe de uma coisa, eu estou me preparando para gravar um...’ Logo em seguida estávamos no Skywalker Ranch e eu gravei 42 faixas.”

“Logo, foi um longo processo.”

Les Paul como mentor
O conceito para “Bingo!” remonta as próprias raízes musicais de Miller. Nascido em Milwaukee, onde o lendário guitarrista Les Paul era um amigo da família, Miller recebeu sua primeira guitarra de seu tio Dale quando tinha quatro anos. Les Paul foi um primeiro mentor, ao qual se juntaram uma série de músicos influentes, logo depois da família se mudar para Dallas –Charles Mingus, Red Norvo, T-Bone Walker e muitos outros– que tocavam na sala de estar dos Millers para serem gravados pelo pai do músico iniciante, um amador mas hábil entusiasta que possuía um gravador de última geração.

“Eu aprendi com os melhores, sério, mas era tão divertido que eu realmente nem sentia que estava aprendendo!”

Miller formou sua própria banda, The Marksmen, quando tinha 12 anos, já influenciado não apenas pelos blues e rhythm & blues, mas também pelo som country que dominava as rádios do Texas. Ele refinou essa mistura na Universidade do Wisconsin, em Madison, a qual abandonou pouco antes de se formar, com uma banda chamada The Ardells, que contava com a presença de seu amigo do Texas, Boz Scaggs.

Em Chicago, ele se juntou a Barry Goldberg para formar a Goldberg-Miller Blues Band e então, em 1966, tomou a importante decisão de ir para São Francisco, para abrir para os velhos amigos da Paul Butterfield Blues Band, no Winterland Auditorium, na mesma noite em que Grace Slick fez seu primeiro show cantando no Jefferson Airplane.

Gravação com Paul McCartney
A Steve Miller Blues Band, que posteriormente se transformou na Steve Miller Band, gravou seu primeiro álbum, “Children of the Future” (1967), em Londres com o irmão mais velho de Andy Johns, Glyn. “Livin’ in the USA”, do segundo álbum do grupo, “Sailor” (1968), chegou ao Top 50, enquanto as sessões para o terceiro álbum do grupo, “Brave New World” (1969), contaram em “My Dark Hour” e “Celebration Song” com a participação especial de Paul McCartney, que estava à toa no estúdio após uma sessão abortada dos Beatles e recebeu crédito como “Paul Ramon”. Miller retornou o favor duas décadas depois, como convidado no álbum “Flaming Pie” (1997) de McCartney.

Steve Miller Band - "Abracadabra"

Miller teve sucessos pop substanciais –nove singles Top 40, três deles chegando ao 1º lugar– mas “Bingo!” o levou de volta a algumas das primeiras composições que tocou.

“Este é um álbum de festa, cara. É para levantar e dançar. É como os shows em festas universitárias que eu costumava fazer na faculdade. Eu escolhi todas as minhas canções favoritas, as que realmente amo.”

“Eu queria ficar gravando este álbum para sempre. Começou meio que por brincadeira e então ficou realmente sério.”

“São canções que foram grandes sucessos nos anos 50 e 60, mas as pessoas meio que esqueceram a maioria delas. ‘You Got Me Dizzy (de Jimmy Reed) foi um enorme sucesso no Texas quando eu era garoto. ‘Ooh Poo Pah Doo’ foi um sucesso monstruoso... Todas foram grandes sucessos no Sul quando eu era garoto no Texas, nos anos 50 e início dos anos 60.”

“O engraçado é que nós levamos o álbum para alguns executivos de gravadora em Nova York, e eles disseram: ‘Uau, são ótimas! Steve compôs todas elas?’” diz Miller rindo. “Isso foi perfeito.”

Em “Bingo!”, Miller e sua banda contaram com a participação do guitarrista virtuoso Joe Satriani, que tocou os solos em “Rock Me Baby” de Walker e “Sweet Soul Vibe” de Vaughan, assim como do percussionista original do Santana, Michael Carabello. A certa altura Miller trouxe todos os amplificadores que possui e os ligou juntos, criando tamanha cacofonia que teve que tocar fora da sala.

As sessões também foram as últimas de Miller com o antigo gaitista Norton Buffalo, que morreu de câncer em outubro de 2009.

“Nós concluímos uma turnê por 30 cidades em 20 de agosto e em 1º de setembro ele recebeu o diagnóstico. Ele partiu 60 dias depois. Foi realmente rápido. Foi uma pena e um choque, e foi algo que apareceu do nada.”

“Norton toca alguns solos ótimos nestas gravações. Dá vontade de voltar e escutar tudo o que ele já fez, tendo isso em mente. Nós realmente sentimos a falta dele.”

Trabalho com artistas jovens
“Bingo!” e seu sucessor ainda sem título, que incluirá canções de Roscoe Gordon, Jimmy McCracklin, Robert Johnson, Muddy Waters e Junior Wells, não são as únicas coisas nas quais Miller está trabalhando. Ele tem trabalhado como mentor de jovens da San Francisco School of the Arts, incluindo uma dupla feminina chamada Danger Babes e um guitarrista de 16 anos que vem do Texas, provocando comparações com Joni Mitchell e Crosby, Stills & Nash para as primeiras, e Led Zeppelin e Moody Blues para o segundo.

“Nós já gravamos algumas faixas e temos algumas coisas prontas, e tudo soa fantástico. Isso é algo muito inesperado, porque nunca me interessei por produzir álbuns de outras pessoas. Nunca foi algo que tenha aspirado, mas estou me divertindo com esses garotos.”

E apesar de “Bingo!” o ter levado de volta ao rhythm & blues e blues, Miller também retomou seu lado country neste ano, ao se juntar a Kenny Chesney para o especial “CMT Crossroads”. As gravações acabaram atravessando a rua, do histórico Ryman Auditorium ao clube noturno Tootsie’s, em Nashville, para uma ruidosa jam pós-gravação.

“A banda de Kenny lembra muito a minha banda nos anos 70, tocando em estádios de futebol e tudo mais. Ele se considera um astro de rock caipira é uma ótima banda de rock and roll. Há muita harmonia nela e muita energia boa, positiva, que eu gosto, muito mais energia do que a maioria das atrações country possui.”

“Então nós casamos perfeitamente. Era basicamente a mesma cultura, exceto que eu aprendi alguns licks realmente bacanas de country e eles aprenderam alguns licks realmente bacanas de blues.”

Agora que Miller voltou às gravações, seus fãs estão fazendo a próxima pergunta óbvia: quando ele lançará um álbum de canções próprias?

“Sabe como é, eu não estou compondo muito”, confessa o guitarrista, que também está passando algum tempo em Nova York, tocando jazz com os membros da antiga banda de Les Paul. “Eu estou trabalhando em umas 10 ou 11 músicas. Eu ainda não escrevi letras para nada, de forma que não sei quando terei algo pronto.”

“O principal é que estou tocando rock and roll com minha banda de rock and roll todo verão”, conclui Miller. “Essa é a principal coisa que faço e eu adoro.”

(Gary Graff é um jornalista free-lance baseado em Beverly Hills, Michigan.)