Topo

Guitarrista do New York Dolls diz que morreria se não houvesse reunião da banda, que completa 40 anos

Os integrantes do New York Dolls durante apresentação no Henry Fonda Theatre, em Los Angeles (21/05/2009) - Getty Images
Os integrantes do New York Dolls durante apresentação no Henry Fonda Theatre, em Los Angeles (21/05/2009) Imagem: Getty Images

GARY GRAFF*

The New York Times Sindycate

12/04/2011 08h00

Há poucos anos, o vocalista David Johansen e o guitarrista Sylvain Sylvain não imaginavam que sua banda New York Dolls estaria na ativa em seu 40º aniversário. Afinal, a primeira encarnação do grupo personificava o etos da brevidade que transformou o grupo em uma lenda do rock and roll. 
 
A banda esteve junta por pouco menos de cinco anos, lançando dois álbuns e estabelecendo tendências com seu visual glam e atitude punk. Os Dolls se separaram em 1976 por causa de conflitos internos e vício em drogas.
 
E parecia que se limitaria a isso até 2004, quando o ex-vocalista dos Smiths, Morrissey, convenceu Johansen e Sylvain a se reunirem para o Meltdown Festival na Inglaterra. Depois disso os dois, os únicos integrantes originais dos Dolls, decidiram manter o grupo unido. Mais três álbuns de estúdio se seguiram, incluindo o novo "Dancing Backward in High Heels", assim como dois álbuns ao vivo.

The New York Dolls - "Fool For You Baby"

 
Resumindo, a celebração do passado dos Dolls se transformou em um presente crível. "Nós nunca planejamos nada", diz Sylvain, de 60 anos, cujo nome verdadeiro é Syl Mizrahi. "É como tem sido nossa existência desde o início. Nunca planejamos nos distanciarmos por tantos anos e, ao nos reunirmos, nós achávamos que a coisa toda duraria apenas uma semana ou duas. É assim que trabalhamos".
 
Ele diz que está na banda porque precisa estar. "Se eu fosse realmente rico, eu ainda assim faria isto. E se não fosse [rico], eu também faria isto. É preciso ter esta atitude: 'cara, tenho que fazer isto ou eu vou morrer'. É assim que nos sentimos a respeito dos Dolls", ele conta.
 
Johansen, de 61 anos, diz que está satisfeito com a trajetória dos Dolls nos últimos sete anos. "Todo mundo na banda está realmente empolgado e dando o melhor de si, e o público está entrando na onda. O principal é ser sensível a respeito disso e não se apressar. Queremos continuar nos divertindo".
 
Caminho aberto para o movimento punk
Esta não é a banda dos anos de 1970, é claro. Quatro outros integrantes morreram: o baterista original, Billy Murcia, de overdose durante uma turnê europeia em 1975; o guitarrista Johnny Thunders de overdose em 1991, no mesmo ano em que o segundo baterista, Jerry Nolan, morreu de um derrame; e o baixista Arthur "Killer" Kane de leucemia em 2005, pouco depois da reunião dos Dolls. 
 
Johansen, que após a separação dos Dolls levou uma vida dupla, se apresentando com seu próprio nome e como Buster Poindexter, entende aqueles que desdenham a banda atual como sendo os Dolls apenas no nome. "Acho que elas têm direito de pensar assim, mas estávamos em Los Angeles certa noite, e Clem Burke (o baterista do Blondie) estava lá e me disse: 'David, é incrível, são os Dolls!' Comecei a pensar, quem sou eu para contrariar? Somos os Dolls para uma nova geração".
 

Decidimos que deveríamos despojar a música e começar de novo. E não éramos os únicos, descobrimos que existiam bolsões de tédio por todo o mundo pensando da mesma forma que nós

Os New York Dolls foram fundados em 1971, devido ao repúdio dos fundadores à pretensão do rock progressivo e aos jams pesados da era psicodélica. "A cena toda era como rock de estádio", lembra Sylvain. "As canções eram como óperas. Não existiam mais as canções bacanas de blues de três acordes com riffs sensuais, as coisas que realmente gostávamos. Então decidimos que deveríamos despojá-la e começar de novo. E não éramos os únicos, descobrimos que existiam bolsões de tédio por todo o mundo pensando da mesma forma que nós".
 
Os Dolls tinham seu próprio som e também seu próprio visual. Eles exibiam moda glam, estilo drag, incluindo cabelos armados, e tocavam canções --"Looking for a Kiss" (1973), "Personality Crisis" (1973), "Puss 'n' Boots" (1974)-- que invocavam o rock dos anos 50 e o pop dos anos 60. Eles eram em grande parte ignorados pelas massas. 

The New York Dolls - "Trash"

 
Nem "New York Dolls" (1973), produzido por Todd Rundgren, e nem "Too Much Too Soon" (1974) entraram nas paradas. Todavia, segundo a "The Rolling Stone Encyclopedia of Rock & Roll", eles foram um grupo influente, "abrindo caminho para o movimento punk que ocorreria cinco anos depois". A influência deles também chegou ao heavy metal, segundo Tommy Lee do Motley Crue, que fará turnê com os Dolls neste ano. "Eles foram uma das nossas primeiras inspirações quando tínhamos 17 e 18 anos", disse Lee em uma entrevista separada.
 
Johansen ainda se sente ambivalente em relação à atenção dada ao visual do grupo. "Quando os Dolls surgiram, eu achava que éramos mais musicais do que a maioria", ele diz. "Costumávamos receber ótimas críticas por fazer música sofisticada, mas acho que as pessoas se esqueceram disso com o passar dos anos. O que ficou registrado nos livros de história foi "The Dolls, eles eram trash, ostentosos. Eram viciados. Eles soavam como um descarrilamento de trem'".
 
O cantor reconhece que essa visão acabou penetrando em sua consciência. "Por muitos anos eu senti que não podia mais me incomodar com isso. Aquela foi minha adolescência rebelde ou algo assim. Então, quando voltamos, eu comecei a desconstruir essas canções e percebi que a coisa era realmente musical, realmente boa e única. Isto é o que penso a respeito hoje".
 
Morrissey: presidente do fã-clube
A gravadora rompeu com o grupo em 1975, o que acabou contribuindo para seu fim. Thunders e Nolan partiram durante uma turnê pela Flórida, com Blackie Lawless substituindo Thunders nas datas que restavam. Johansen e Sylvain persistiram por mais alguns meses, mas finalmente desistiram. E essa foi a última vez que pensaram nela até que Morrissey, que comandou o fã clube dos Dolls no Reino Unido nos anos 70, telefonou com a oferta do Meltdown.
 
"Eu disse: 'você tá maluco'", lembra Johansen rindo. "Ele disse: 'não, por favor, eu quero que vocês façam isso', e eu disse: 'mas não vai ser legal. Não dá para fazer isso sem o Thunders'. Ele disse: 'sim, vocês podem. Vocês podem!' Ele estava falando pelo ponto de vista de um fã. Então pedi para pensar a respeito", ele lembra.
 
Durante a noite Johansen viu as coisas de modo diferente e decidiu aceitar. "Na verdade eu acabei me divertindo mais do que poderia imaginar. E então nós começamos a receber telefonemas..." Infelizmente o baixista Kane não pode desfrutar o que viria a seguir, após morrer poucas semanas depois do show de reunião.

The New York Dolls - "Looking For a Kiss"

 
"Aos meus olhos, eu nunca o tinha visto com a saúde tão boa", diz Johansen. "Se há algo que possa ser dito de positivo sobre sua morte, é o fato da reunião ter sido a última coisa que ele fez. Aquilo era o sonho dele e o deixou muito feliz. Acho que em seu subconsciente ele, de alguma forma, manteve (a leucemia) acuada até realizarmos o show. Então ele meio que relaxou e a deixou tomá-lo".
 
Johansen e Sylvain levaram sua banda reconstituída, com o ex-baixista do Hanoi Rocks, Sammi Yaffa, no lugar de Kane, ao festival texano South By Southwest de 2004, onde conversaram com as gravadoras sobre um novo contrato. O resultado foi "One Day It Will Please Us to Remember Even This" (2006), seguido por "Cause I Sez So" (2009), uma reunião com o produtor Rundgren que foi gravada no estúdio dele em Kauai, Havaí.
 
"Eu sabia, assim que chegamos lá, que a música seria muito boa", diz Sylvain, "mas eu sempre vou com o público. O público é que escolhe se você vai chegar lá ou não. Para mim essa é a decisão mais honesta já tomada, se estão dispostos ou não a pagar para ver você. E descobrimos que ainda existiam pessoas que queriam ouvir os New York Dolls".
 
*Gary Graff é um jornalista free-lance baseado em Beverly Hills, Michigan

Tradutor: George El Khouri Andolfato