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Esperanza Spalding diz que Grammy não mudou sua vida e planeja trabalho com Milton Nascimento

Esperanza Spalding posa para foto com o prêmio de artista revelação no Grammy 2011, em Los Angeles (13/02/2011) - Getty Images
Esperanza Spalding posa para foto com o prêmio de artista revelação no Grammy 2011, em Los Angeles (13/02/2011) Imagem: Getty Images

GARY GRAFF*

The New York Times Sindycate

22/04/2011 16h21

Esperanza Spalding estava confiante sobre suas chances de vencer o Grammy 2011 de artista revelação: um dia antes da cerimônia de premiação, em fevereiro, a baixista, cantora e compositora deu um "almoço de celebração" para os amigos da banda, para brindar sua indicação.
 
"Ninguém tinha ideia de que eu pudesse mesmo ganhar o Grammy", lembra Spalding, que enfrentava os candidatos multiplatinados Justin Bieber e Drake. "Estávamos empolgados por sermos indicados, mas não parecia possível eu ganhar". E a cantora de 26 anos não apenas ganhou, mas também foi a primeira artista de jazz a receber o prêmio.
 
O resultado chocou a plateia no Staples Center, em Los Angeles, a audiência internacional na televisão e uma legião de fãs de Bieber, que prontamente invadiram a página de Spalding na Wikipedia. O executivo Steve Stoute a atacou em uma propaganda de página inteira no "New York Times", dizendo que ela era indigna ao prêmio, usando a conquista da baixista como símbolo de tudo o que ele via de errado no Grammy.
 
A própria Spalding ficou surpresa, mas ela não viu todo esse quadro porque, imediatamente após o prêmio, ela partiu para shows no Japão, a deixando desatenta para a reação sísmica que sua vitória causava em casa. "Não mudou muito meu cotidiano", ela diz, apesar de ter recebido "e-mails bacanas de pessoas que admiro", incluindo outros artistas de jazz como Jack DeJohnette, Joe Lovano e Pat Metheny, assim como do cantor pop Paul Simon.
 
"Isso foi um privilégio agradável, mas não muda muito o que faço, meu trabalho e meu emprego. Eu já tinha planejado meus últimos dois anos. Algumas pessoas agora me reconhecem quando vou a um café, eu acho. Eu gostaria de poder dizer algo mais empolgante, mas não houve nenhuma grande mudança", ela fala.  
 
Jazz: música comunitária
Uma das maiores críticas à premiação de Spalding é que, após dez anos de carreira e três álbuns próprios, ela não é realmente uma "artista nova". Ela própria rejeita essa afirmação. "Na verdade, é apropriada para o jazz", diz a artista natural de Portland, Oregon. "São necessárias décadas para se tornar ótima nesta arte e é o que eu estou fazendo, por isso me considero uma artista nova. Sou nova no jazz e nova como arranjadora e compositora, e há muito que quero fazer. E pretendo fazer isso até o dia em que deixar de respirar", ela se defende.
 
Produto de uma linhagem galesa, latina, nativo-americana e afro-americana, Spalding cresceu no distrito King de Portland e seu interesse pela música veio de sua mãe, que era cantora profissional, e após assistir ao mestre do violoncelo, Yo Yo Ma, tocar "Mr. Rogers' Neighborhood" quando ela tinha 4 anos. 
 
Não muito depois disso, Spalding, que foi educada em grande parte em casa, aprendeu sozinha a tocar violino e se juntou à Sociedade de Música de Câmara do Oregon. Ela também aprendeu a tocar oboé e clarinete, em parte escutando sua mãe recebendo aulas de guitarra de jazz, e cantando em inglês, espanhol e português. Depois recebeu uma bolsa da Academia do Noroeste, um colégio de artes onde ela escolheu o baixo após experimentar aleatoriamente o instrumento na sala de aula.
 
Na adolescência, Spalding começou a escrever letras com uma banda de rock local, a Noise for Pretend, mas após deixar a Academia do Noroeste e concluir o ensino médio quando tinha 16 anos, ela se comprometeu a estudar jazz, se matriculando na Universidade Estadual de Portland e depois na Faculdade de Música de Berklee, em Boston. 
 
Após o primeiro semestre, Spalding foi contratada pela cantora Patti Austin para participar de seu show "For Ella" (2003), um tributo a Ella Fitzgerald. Lovano, que foi um dos instrutores de Spalding em Berklee, também a contratou para sua banda de turnê. "Não há artistas solo no jazz", diz Spalding, que lançou seu primeiro álbum, "Junjo", em 2006 e colaborou com Stanley Clarke, Fourplay, Donald Harrison, Nicholas Payton, Christian Scott e muitos outros. 
 
Ela também trabalhou como instrutora em Berklee. "O jazz é uma música comunitária. Você se torna grande graças às contribuições, ao apoio e gravações de todos que estão à sua volta. Eu fui muito afortunada por ter trabalhado com tantas pessoas incríveis", atesta.
 
Colaboração com Milton Nascimento
O segundo álbum de Spalding foi "Esperanza" (2008). Então veio "Chamber Music Society" (2010) de inclinação clássica, a primeira parte de um projeto abrangente que também rende o futuro "Radio Music Society". "Felizmente os compositores sempre têm mais música do que podem colocar em um álbum, e percebi que meu repertório teria que ser dividido em discos diferentes. Então me concentrei na música de câmara e deixei para o próximo as canções mais alegres e mais agitadas".
 
Além de suas composições originais, Spalding diz que "Radio Music Society" incluirá dois covers, uma música de autoria do saxofonista de jazz Wayne Shorter e a outra "God Only Knows" (1966), dos Beach Boys. Isso é um sinal de quão ampla é a vista musical na qual ela está trabalhando e quão poucos parâmetros limitam sua criatividade.
  
“Vejo um álbum como uma oportunidade para explorar um conceito. Artisticamente, sinto que extraí muita coisa dos últimos dois anos de exploração de algo diferente, e então você passa para a próxima coisa. Eu planejo e espero fazer isso por toda a minha vida. É dessa forma que gosto de fazer música".
  
Spalding já sabe o que virá depois de "Radio Music Society": uma colaboração com o brasileiro Milton Nascimento, que participou de "Esperanza" e uma pessoa da qual ela se tornou mais próxima recentemente, resultando numa parceria que será vista ao vivo no Rock In Rio 2011.
 
"Ah, eu amo Milton", ela diz com entusiasmo. "Ele é fenomenal, um ser humano lindo. É realmente um prazer poder conhecê-lo. Ele é uma daquelas pessoas que são tão maravilhosas e de bom coração em pessoa quanto transparece pelo seu trabalho. Essa é mais uma das bênçãos. É outra oportunidade de aprender, compartilhar e criar. É para isso que estamos aqui. Os prêmios, as vendas, tudo isso é ótimo, mas vêm em segundo plano".
 
*Gary Graff é um jornalista free-lance baseado em Beverly Hills, Michigan