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Cantor inglês Jamie Lidell traz sua black music futurista ao Tim Festival; leia entrevista

FERNANDO KAIDA<br>UOL Música

17/10/2005 22h41

Último nome escalado para participar do Tim Festival (apenas em sua edição carioca), o cantor e produtor inglês Jamie Lidell, 32, vem ao país pela primeira vez com a responsabilidade de substituir a dupla Autechre, também inglesa, que cancelou sua vinda.

"Espero poder compensar a ausência deles no festival", disse o músico a UOL Música, em entrevista exclusiva. "Quem sabe eu faça uma versão beatbox de uma música deles", brincou o cantor, citando o tipo de percussão vocal utilizado às vezes no rap.

Se por um lado o público ficará sem a eletrônica experimental da dupla Autechre, por outro terá a chance de ouvir o som de um artista intrigante, que reinventou sua carreira, antes mais voltada para a música eletrônica, com seu novo disco "Multiply", um dos lançamentos mais aclamados de 2005. No álbum, seu terceiro solo, Lidell encarna uma espécie de "Prince do século 21", e, como o músico americano, compõe, produz, canta e toca instrumentos.

A revista de comportamento "Dazed and Confused" o chamou de "salvador do soul", o semanário de cultura "Observer" elegeu seu disco como um dos melhores lançamentos do ano, e a "Uncut", revista de música e cinema, disse que ele é uma "garoto-prodígio", mistura de Otis Redding, Sam Cooke, Stevie Wonder e Prince.

"Algumas comparações são engraçadas, outras são ridículas. Mas vou gostar mesmo quando começarem a dizer que a música de Fulano se parece com a de Jamie Lidell", brincou o cantor.

As comparações não se devem apenas ao resgate da sonoridade à la Motown, que lembra as gravações pioneiras da black music, que Lidell atualiza no disco, com requintes de produção de última ponta. Em "Multiply", Lidell se destaca é como grande cantor e compositor de melodias, potencialidades que até agora ele havia explorado pouco em suas produções anteriores, mais voltadas para experimentalismos eletrônicos --fossem trabalhos solo ou os dois discos que fez com o Super_Collider, dupla formada por ele e o produtor francês de música eletrônica Cristian Voguel.

"Eu acho que eu já queria isso, mas demorei pra perceber, pois eu sempre trabalhei com coisas de muito baixo orçamento, só eu e um computador", conta o cantor, "neste disco, eu tive de chamar meus amigos músicos".

Segundo Lidell, o "estalo" aconteceu em 2003, quando ele fez uma participação especial no disco "Goodbye Swingtime", do inglês Matthew Herbert (que veio ao Brasil com este espetáculo no Sónar de 2004). No disco, gravado com uma orquestra de jazz e que tem os sons trabalhados eletronicamente, ele cantava uma música com vocais à la black music. "Fiquei com vontade de fazer mais", revelou.

Bem humorado, Lidell conversou com UOL Música, por telefone, e contou quais seus planos para o show no Brasil, para sua carreira e seus próximos discos. Leia abaixo a íntegra da entrevista:

UOL: Quais são suas expectativas para o show no Brasil?
Jamie Lidell:
Fiquei sabendo que iria para o Brasil apenas há alguns dias. Foi uma grande surpresa pra mim. Eu nunca fui ao Brasil e é um lugar que eu sempre quis visitar. Espero poder compensar a ausência do Autechre no festival.

UOL: Talvez se você tocar um remix de alguma música deles...
JL:
Olha! Que idéia ótima! Eu não tinha pensado nisso! Quem sabe uma versão beatbox (risos)!

UOL: Nos seus shows, você gosta de usar roupas bem espalhafatosas, não é? (No Sónar de 2003, em Barcelona, Lidell se apresentou com um sobretudo preto, saia de tule branca e suéter laranja com ombreiras altas. Em seus shows mais recentes, o músico tem-se apresentado enrolado em fitas cassetes.) Você está programando algum visual diferente pro Brasil?
JL:
Eu sempre tento dar um sabor diferente às apresentações. Ainda não sei o quê, mas é claro que vou levar algo especial pro Brasil. Além disso, eu vou me apresentar acompanhado pelo Pablo Fiasco (designer que fez a capa do disco de Lidell), que faz umas projeções enquanto eu toco, pra dar uma magia extra à música. É um show totalmente multimídia, meu amigo!

UOL: O seu disco novo, "Multiply" (de 2005), tem uma sonoridade mais para um rhythm and blues antigo, à la Stevie Wonder e Al Green, muito diferente das suas gravações anteriores, mais para a eletrônica experimental. Como a sua gravadora, a Warp (tradicionalmente dedicada a música eletrônica), reagiu quando você mostrou o disco pronto para eles?
JL:
Eles tiveram uma reação inicial de estranhamento. Mas, no final, deu tudo certo. E acabamos numa posição muito favorável, pois as críticas têm sido ótimas até agora e o disco está vendendo bem. Todo mundo gosta de uma história de sucesso, mesmo sendo estranha, né? Mas, às vezes, a vida é estranha também, e é isso que faz com que ela seja divertida. Eu queria fazer um disco que fosse clássico e consegui com ele o reconhecimento que queria.

UOL: Você está sendo chamado de Prince do século 21. O que você acha disso?
JL:
Eu fico feliz de ser comparado com um artista tão maravilhoso como o Prince, mas eu também não posso deixar de achar isso engraçado. Eu vou gostar mesmo é quando as pessoas começarem a comparar outros artistas comigo. Tipo: "A música do Fulano parece a do Jamie Lidell". Daí, eu vou saber que deixei a minha marca na música. Mas acho que isso ainda vai demorar um pouco.

UOL: Por que você decidiu fazer um disco com essa sonoridade de black music?
JL:
Tudo começou por causa de uma gravação que eu fiz para o Matthew Herbert, que tinha um som meio Motown (gravadora de black music americana de onde saíram artistas como as Supremes, Stevie Wonder e Al Green, entre outros). Eu adorei fazer. E fiquei com vontade de fazer mais coisas nessa linha. Eu acho que eu já queria isso, mas demorei pra perceber, pois eu sempre trabalhei com coisas de muito baixo orçamento, só eu e um computador. Pra este disco, eu tive que ir atrás dos meus amigos músicos, como Gonzales (produtor e tecladista) e Mocky (baixista), para criar um disco com uma sonoridade "quente", que desse suporte pra minha voz.

UOL: As músicas do "Multiply" têm letras tristes, mas com uma levada pra cima. Qual foi sua motivação para fazer isso?
JL:
Muitas coisas... Minha vida em Berlim, onde moro há cinco anos, meus relacionamentos com meus amigos, com minhas namoradas... meus relacionamentos com as pessoas que são importantes pra mim... Eu sou só um ser humano. Fico confuso como todo mundo, feliz como todo mundo. Eu só estou tentando fazer um apanhado dessas experiências. No geral, acho que sou uma pessoa reflexiva, então talvez as letras sejam assim. Ao mesmo tempo, as músicas são pra cima. Mas não acho que isso seja um paradoxo, é só o jeito como minha vida é.

UOL: Como é um show ao vivo de Jamie Lidell?
JL:
Sou eu, os computadores e o Pablo, fazendo os visuais. Eu consigo fazer um som incrível assim, porque eu já estou acostumado com esse formato, eu já toco assim há uns três ou quatro anos.

UOL: Mas isso te dá espaço para improvisação?
JL:
Claro! É tudo muito espontâneo. Eu tento ficar com os ouvidos abertos e perceber os sons que aparecem.

UOL: No Sónar, em 2003, você tocou uma versão de "I Wanna Be Starting Something", do Michael Jackson. Você tem algum cover especial para tocar no Brasil?
JL:
Yeah! Eu toquei mesmo! Mas não estava planejado. Foi uma coisa que veio na hora. Agora... eu não posso contar os segredos que estou guardando para os shows do Brasil --principalmente porque não sei ainda o que vou fazer!

UOL: Você pretende tocar só músicas do "Multiply" ou coisas mais antigas que você fez com o produtor Matthew Herbert e com o Super_Collider (dupla formada por Lidell e o produtor francês de música eletrônica Cristian Vogel)?
JL:
Ontem, em Nova York, eu ainda estava num show, num clube, e comecei a tocar uma música do Super_Collider que as pessoas acharam legal. Às vezes, eu esqueço de tocar músicas antigas... Eu tenho umas boas... Talvez eu faça um medley com as antigas...

UOL: E você pretende continuar produzindo músicas mais pop, como as que estão em "Multiply", ou também quer trabalhar com coisas experimentais?
JL:
Eu gosto de todos os tipos de música. Eu não sou desses artistas que ficam fixados num só estilo. O próximo disco será completamente diferente. E espero que tenha boas canções. A coisa de que mais gosto em "Multiply", afora a sonoridade, é que há boas canções. Eu adoro cantar. Eu adoro mudar as músicas quando canto. E as canções têm que ser fortes pra suportar qualquer tipo de arranjo maluco que você faça. A canção tem de se manter, por si, e se comunicar com clareza. Foi isso o que eu aprendi fazendo o "Multiply".

UOL: Você já está trabalhando num disco novo?
JL:
Eu estaria se não estivesse viajando e tocando tanto. Toquei na Europa, acabei de terminar minha turnê americana, vou tocar de novo na Inglaterra, depois no Japão, na Austrália, no Rio... Tudo está indo muito depressa. Eu precisaria de uns meses para poder me concentrar (em um novo disco). Em novembro eu devo começar a gravar de novo com o Supercollider... Ou seja, estou muito ocupado agora pra pensar num disco novo meu. Mas vou encontrar um tempinho...

UOL: E você tem algum plano de trabalhar com o Matthew Herbert de novo?
JL:
Sim, eu adoro o Matthew! Ele será o produtor executivo dessas gravações que vamos fazer com o Supercollider. Vamos dar uma agitada nas coisas. O grupo agora vai ser o Cristian (Vogel), o Matthew e eu: um supergrupo.

UOL: E vocês já têm uma data para um disco novo do Super_Collider?
JL:
Não quero prometer nada. A gente vai começar a gravar juntos. Mas não sei se teremos um EP, um compacto ou um disco inteiro. Vamos ver...

(Com Marcelo Negromonte, editor de UOL Cinema)



JAMIE LIDELL NO TIM FESTIVAL
Data: 21/10, sexta-feira
Local: Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (Av. Infante D. Henrique, 85, Parque do Flamengo)
Horário: a partir das 23h (palco Tim Lab)
Preço: R$ 70 (pista)

A noite começa com a apresentação do brasileiro Maurício Takara, do M. TAKARA 3, e termina com o americano Vincent Gallo. Leia também|Veja a programação completa do Tim Festival e saiba como comprar ingressos|http://musica.uol.com.br/ultnot/2005/09/30/ult89u5946.jhtm|"Só o jazz e a música indiana têm o improviso no coração", diz John McLaughlin|http://musica.uol.com.br/ultnot/2005/10/18/ult89u6035.jhtm|Só até quarta: Ganhe ingressos para show dos Strokes, M.I.A., Arcade Fire e Kings of Leon em SP|http://showlivre.uol.com.br/promocoes.php?promocao_id=1390 target=_blank