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Entre MPB moderna e guitarras sujas, Cícero abre sua casa para mostrar "Canções de Apartamento"

O cantor e compositor carioca Cícero em foto de divulgação do disco "Canções de Apartamento" - Willer José/Divulgação
O cantor e compositor carioca Cícero em foto de divulgação do disco "Canções de Apartamento" Imagem: Willer José/Divulgação

MARIANA TRAMONTINA

Editora-assistente de Entretenimento

12/08/2011 06h00

O nome dele é Cícero e as portas de sua casa estão abertas. E é numa aconchegante sala com sofá vermelho e repleta de instrumentos que ele mostra onde construiu "Canções de Apartamento", um álbum tão denso quanto singelo. Cícero deixou para trás sua antiga banda Alice, saiu da casa da mãe para morar por conta própria e abandonou o sobrenome Lins para, sozinho, expor suas divagações em forma de música e poesia. 
 
As "Canções de Apartamento" de Cícero são dez pílulas confessionais sobre amores, saudades, encontros e descobertas legitimados por este carioca de 25 anos, formado em Direito, em meio a mudanças e adaptações da vida adulta. Composto e gravado inteiramente em seu ambiente caseiro, de forma independente, o disco foi disponibilizado gratuitamente em seu site. Bastaram três semanas para que mais de 10 mil downloads fossem registrados.
 
O clipe da música "Tempo de Pipa", uma festinha de carnaval com jeito de Marcelo Camelo com quase 8.000 exibições em uma semana, foi rodado em plano-sequência no bondinho de Santa Teresa, no Rio, e também impulsionou o burburinho na internet. "É um clipe solar. Queria mostrar minha cara com uma mensagem bacana. As músicas do pop e do rock alternativo são um pouco difíceis de digerir, com letras e arranjos truncados. Acho que, com essa, eu me comunico com todo mundo, não apenas com quem está ligado diretamente à música", disse Cícero em entrevista por telefone ao UOL Música.
 
Em meio a tantas referências, como a lembrança de "Dindi" de Tom Jobim em "Pelo Interfone" ou de Braguinha na marchinha arrastada "Laiá Laiá", as composições de Cícero estão na prateleira da MPB mais moderninha, encostadas no indie rock de guitarras sujas, barulhos e microfonias que por vezes agonizam em suas confissões. "Muitas das minhas referências no disco vêm de compositores que exploram uma maneira de falar na música, tipo Geraldo Azevedo, Sérgio Sampaio e Paulinho Moska".
 
Ainda que embalado por certa melancolia, Cícero não soa desperançoso. "Não quis passar uma postura prostrada e pessimista. Não estou dizendo que o mundo é uma merda, é só que é difícil. E não é feio assumir isso", disse ele, mostrando que não é o começo nem o fim do mundo, nem um manifesto da solidão, é apenas um desabafo. E como Cícero constata em "Ponto Cego", última faixa de seu disco, "mas quem se importa? É sexta-feira, amor!".
 
UOL Música - Como são feitas canções de apartamento?
Cícero - São músicas feitas durante uma transição. Foi quando saí da casa da minha mãe para morar sozinho, e que refletem essa nova forma de vida que eu estava levando. E são músicas íntimas, mas sem grandes verdades, falam de banalidades. Sempre achei a sinceridade na música um grande lance. É a sinceridade que você coloca na música que diferencia você se emocionar ou não se emocionar com o que ouve. É tipo ouvir um Tom Jobim falando suas verdades e ouvir um cara que copia o que ele faz.
 
UOL Música - Fazer música é um exercício solitário?
Cícero - Para mim é. Até vejo muitos compositores fazendo parcerias, mas eu não sei o caminho disso. Fazer música, para mim, é aquele momento em que você desliga o disjuntor, de madrugada, sozinho. Não é uma dinâmica, nunca compus com alguém. A única parceria do disco, "Eu Não Tenho Um Barco, Disse A Ávore", é com meu amigo Jorge Júnior, mas ele tinha uma frase de piano pronta e eu compus a música em cima dela. Agora, fazer junto é difícil.
 
UOL Música - Não tem alguém que você queira gravar uma parceria, então?
Cícero - Tem, vários. O Paulinho Moska me mandou um email elogiando o disco, e ele é uma influência para mim. No disco mesmo tem uns falsetes que são inspirados nele. Com ele seria legal gravar alguma coisa.
 
UOL Música - No encarte do disco há fotos de seu apartamento. Depois de se abrir nas canções, foi fácil abrir as portas de casa?
Cícero - Dá um pouco de medo, mas já estava fazendo o mais difícil, que é falar de mim, então resolvi mostrar tudo. E aí a galera pode entender ou cair em cima, né? Se for a segunda opção, pode doer, porque não tenho um eu-lírico para me defender, mas o que aconteceu foi uma avalanche de carinho. Acho até que teve gente que não gostou do disco, talvez tenha achado um saco, mas não avacalhou. Acho que respeitaram por eu ter falado de mim. 
 
UOL Música - Hoje muita gente compõe e grava música em casa. Com tanta tecnologia, o que é preciso para fazer um trabalho de qualidade?
Cícero - Acho que é relativo. Você tem os padrões da indústria, o volume da música, mixagem, essas coisas. E você tem bons equipamentos fáceis de adquirir, uma placa de som bacana e tal. Mas eu acho que o grande lance não é tecnologia, e sim dar valor ao que está cantando. Hoje você faz qualquer som, nem precisa ter um violão para tirar som de violão. Mas o que faz a diferença é o sentimento que está ali, é você como artista. O programador não vai te dar isso.
 
UOL Música - Você já pensa em tocar suas canções fora de seu apartamento?
Cícero - Sim, estou montando uma banda para o show, já que eu não tive na gravação do disco, que eu toquei quase todos os intrumentos. Vou chamar o Bruno Schulz para tocar acordeon e pianos, o Igor Ferreira para tocar bateria, vou chamar o Rodrigo Abud para o baixo, que nem sabe disso, e estou sondando guitarristas. Meu critério é mais convivência do que técnica, sou meio romântico (risos). Depois vou tentar marcar shows no Rio de em São Paulo, talvez em Curitiba. Vou começar a estudar a produção no final de agosto.

Cícero - "Tempo de Pipa"