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Sertanejos explicam como driblam crise nas duplas: "O segredo é respeitar o espaço do outro", diz Chitãozinho

Chitãozinho & Xororó durante gravação do DVD "Ch&X 40 anos - Entre Amigos" no Via Funchal, em São Paulo (28/09/2010) - Orlando Oliveira/AgNews
Chitãozinho & Xororó durante gravação do DVD "Ch&X 40 anos - Entre Amigos" no Via Funchal, em São Paulo (28/09/2010) Imagem: Orlando Oliveira/AgNews

ANDRÉ PIUNTI

Colaboração para o UOL

05/11/2011 07h00

O recente desentendimento entre Zezé di Camargo e Luciano, que incluiu um anúncio rapidamente retirado e até uma internação de emergência do segunda voz, reflete um problema recorrente nas duplas sertanejas: como manter uma longa parceria sem que, em algum momento, o relacionamento se torne insustentável?

Para Chitãozinho, que canta há 40 anos ao lado do irmão Xororó, a missão é possível, apesar de nada fácil. "O grande segredo é saber respeitar o espaço do outro e colocar seu trabalho acima de questões pessoais. A dupla tem que ser profissional, a vida particular do seu parceiro não interessa pra você. Eu e o Xororó aprendemos muito cedo que nós precisávamos do nosso espaço. Nós não saímos juntos o tempo todo, não viajamos juntos, não vivemos colados um no outro, e isso foi fundamental para a gente chegar aos 40 anos de carreira", defende.
 

De acordo com o segunda voz, as discussões com Xororó, que tem fama de perfeccionista, sempre existiram, mas nunca ao ponto de se pensar em separação. "Nós temos claro na cabeça que eu não mando 50,1%. Eu mando 50%. E o Xororó, os outros 50%. Ninguém fala mais alto, ninguém tem mais poder, ninguém manda mais do que ninguém. Isso foi fundamental para que essa história de separação não fizesse parte da nossa carreira."
 

 

Principal produtor da música sertaneja nos anos 1990, César Augusto trabalhou com todas as duplas de ponta daquela década, e se destacou após revelar Leandro e Leonardo. Há quase vinte anos, é responsável pelos discos de Zezé di Camargo e Luciano, e confessa que é muito mais fácil lidar com duplas formadas por irmãos. "Quando seu parceiro não tem o seu sangue, tudo fica mais difícil, existe uma competição interna que, em algum momento, pode estourar. Ser sombra do irmão é uma coisa, mas se sentir inferior a um parceiro que não é do seu sangue é outra história. Uma hora ou outra, alguém vai se sentir em segundo plano e vai dar trabalho."
 

O primeira voz é o que recebe prêmio, é o que fala na TV, é o que sai na revista, é a voz que o povo canta. É de costume dos sertanejos chamarem uma dupla só pelo primeiro nome, tipo 'vou no show do Zezé'.

César Augusto, produtor de Zezé di Camargo e Luciano

Para César Augusto, o destaque maior do primeira voz é um dos grandes problemas a ser administrado. "O primeira voz é o que recebe prêmio, é o que fala na TV, é o que sai na revista, é a voz que o povo canta. É de costume dos sertanejos chamarem uma dupla só pelo primeiro nome, tipo 'vou no show do Zezé'. Naturalmente, o segunda voz recebe menos atenção, e isso é muito complicado de ser administrado. Se ele não for preparado para enfrentar isso - e a maioria não é -, a dupla começa a ter problema. Se o cara não é seu irmão, como você vai conseguir aceitar que todos os elogios sejam feitos só pra ele, sendo que você batalhou junto?"

Em 1990, João Mineiro e Marciano, que não eram irmãos, disputavam com Chitãozinho e Xororó o posto de dupla número um do país. Três anos depois, sem dar maiores explicações, os cantores brigaram e foram responsáveis pela separação mais marcante que a música sertaneja viu, com 20 anos de carreira. Quando perguntado sobre os motivos da separação, Marciano prefere não dizer. Há disputas judiciais entre os dois até hoje, que o cantor também não comenta.

 

  • Os irmãos Edson e Hudson retornaram aos palcos em outubro após dois anos separados


Edson com Hudson, Rick sem Renner
Nos últimos dois meses, Edson e Hudson voltaram a ser destaque com o anúncio do retorno da dupla. Irmãos, os cantores ficaram dois anos separados após brigas que tinham como pano de fundo, segundo eles mesmos, o alcoolismo e a depressão.

Apesar da separação, ambos admitiram que sabiam que um dia a parceria seria refeita. Para Edson, que se diz o principal culpado, o fim temporário da dupla foi estimulado por falta de respeito mútua.

"Eu canto desde criança com o Hudson, então brigar é algo normal, apesar de que desde que voltamos, nós não brigamos, estamos tentando respeitar ao máximo o outro, pois sabemos que erramos muito nesse lance do respeito. Tudo gira sempre em torno do respeito, é ele o responsável por você se desculpar, se arrepender. Eu perdi completamente o respeito pelo meu irmão, e da parte dele foi a mesma coisa. Se você ouve pessoas de fora e não ouve o seu próprio irmão, que é a sua dupla, não tem solução".

O cantor admite que cantar ao lado de alguém com o mesmo sangue faz diferença. "Seu irmão sabe dos seus problemas, aguenta seus defeitos, suas chatices. É muito menos complicado do que você se juntar com um cara desconhecido e começar a cantar".

Em dezembro do ano passado, após quase 25 anos juntos, o cantor Rick anunciou que estava se separando de Renner. A dupla se conheceu nos anos 1980, quando Rick procurava um segunda voz para cantar ao seu lado. Desde meados dos anos 2000 a separação da dupla era cogitada.
 

Nada é mais importante que o respeito. Se ele acabar, não tem grana ou fama que segure a dupla. Se o cara para de te ouvir, começa a se achar mais importante que todo mundo e o trabalho passa para o segundo plano, não tem carreira que aguente

Rick, da extinta dupla Rick e Renner

Ao se separar de Renner, Rick alegou que seu ex-parceiro estava faltando a compromissos. A  gota d'água foi quando Renner faltou a um programa de TV no qual a dupla faria a divulgação do novo trabalho.

"Quando você se casa, faz uma sociedade ou qualquer tipo de parceria, sabe que precisa abrir mão de algumas coisas para chegar aonde você quer. Com dupla também é um casamento, e não é fácil manter o foco dos dois durante tanto tempo. As cabeças não vão pensar sempre na mesma direção", conta Rick, que descarta um retorno com Renner.

"Eu sempre assumi a postura de líder da dupla por uma característica pessoal, o Renner nunca gostou da carga de ter de administrar a carreira, então eu sempre tomei a frente, e foi assim que deu certo. O problema foi que com o passar do tempo as idéias mudaram, as prioridades, as pretensões."

Assim como Edson, Rick ainda bate na tecla do respeito. "Nada é mais importante que o respeito. Se ele acabar, não tem grana ou fama que segure a dupla. Se o cara para de te ouvir, começa a se achar mais importante que todo mundo e o trabalho passa para o segundo plano, não tem carreira que aguente."

Para César Augusto, o "amor de irmão" é o principal responsável pela vida longa da maioria das duplas. "Se você pegar na história, quase todas as duplas de irmãos que se separaram, voltaram. Taí Edson e Hudson que não me deixam mentir. O amor de irmão sempre vai falar mais alto."