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Com novo disco, Skank defende: "Vai ter Copa e vai ter manifestação"

Tiago Dias

Do UOL, em São Paulo

05/06/2014 17h16

Longe do estúdio há seis anos, o Skank retorna agora com um disco de inéditas no meio do furacão de Copa do Mundo e dos protestos Brasil afora. As duas primeiras canções de "Velocia", que será lançado oficialmente na próxima terça-feira (10), a dois dias do início do Mundial, abordam os dois mundos.

Enquanto "Alexia" analisa, com poesia, o balé nos gramados, "Multidão" dá voz aos descontentes na rua. Em um papo regado a água e pão de queijo, a banda mineira se posicionou sobre a polarização. Afinal, vai ter Copa ou não vai? "Vai ter Copa e vai ter manifestação", disse o vocalista, Samuel Rosa, em conversa com o UOL em um estúdio na Bela Vista, em São Paulo.

Impactada pelas cenas das manifestações que pipocaram nas ruas do Brasil em junho passado, "Multidão" foi a primeira canção escrita da nova safra, há um ano. O "povo" aparece na letra de Samuel com Nando Reis (em versos como: "A multidão não quer papel de bobo / E o jogo vai virar / Ninguém aqui é bobo / Nós vamos engatar esse trem / Vamos embarcar nesse trem") e há um dragão no rap feito por B. Negão, que completa a música ("E pede aos céus e a Oxalá coragem pra vencer / Vencer esse dragão / Dragão gigante da pura maldade e opressão").

A preocupação da banda não é estar ao lado do "povo" e contra o "dragão": "Nós relutamos em cair em um discurso populista de 'não vai ter Copa'. Na minha cabeça, dá para fazer tudo, hospital, escola e estádio", pondera Samuel.

Capa do disco "Velocia"  - Divulgação - Divulgação
Capa do disco "Velocia"
Imagem: Divulgação


Com a fama de bons moços do pop rock nacional, os mineiros guardam suas críticas ao evento. "A própria subserviência com a Fifa também tem incomodado muito. A arrogância dos caras. Esse que vem aqui com carinha de blasé [secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke], está sempre com o Ronaldo, chega aqui e diz que vai chutar a bunda do pessoal. A coisa começa errada daí. Não poderia ter essa subserviência toda, a gente não vai fazer uma Copa nos moldes da Alemanha e ponto final", defende.

O baterista Haroldo Ferretti diz que não anda animado com o Mundial, mas mantém a visão positiva, após visitar a África do Sul, nas últimas viagens da banda ao país depois de 2010. "Eles também tiveram gastos exorbitantes em construções de estádios que são usados hoje para culto religioso. A gente viu e ouviu de sul-africano a palavra 'legado' para coisas básicas depois da Copa, um aeroporto decente, um trem que liga o aeroporto ao centro da cidade".

Para Samuel, o legado por essas bandas já chegou. "Pela primeira vez eu vi no semblante dos prepotentes e arrogantes políticos brasileiros certo medo. Já é um legado da Copa", acredita. "Os políticos estavam aí, no limite da impunidade. Eu acho que é uma curva de aprendizado que vem acontecendo desde o ano passado", continua o tecladista Henrique Portugal.


O bom e velho hit

"Velocia", no entanto, passa longe de ser um disco político. No que importa para o Skank, é o disco que os fãs querem ouvir, passando pelo reggae do primeiro single "Ela Me Deixou" e "A Noite" --que guardam resquícios dos primeiros álbuns, quando eles flertavam com ska-- ao folk em "Esquecimento", que remete a mudança na carreira em 2003 com "Cosmotron".

Com novos parceiros musicais --o vocalista da Fresno, Lucas Silveira, assina "Do Mesmo Jeito" com Samuel, e Lia Paris canta em "Aniversário"--,  Samuel Rosa diz que a razão da demora de seis anos para se lançar um material inédito foi a falta de inspiração.

"A banda tinha que estar mais inspirada. Às vezes você grava um disco a cada dois anos e pega uma banda e uma fórmula desgastadas. O Skank agora tem certo legado e não usufruir disso seria um erro, não dar ao luxo de ficar seis anos sem inéditas sem prejudicar a carreira. Ninguém é tão inspirado para fazer um disco há cada dois anos".


Os hits, que fizeram --e fazem-- dos fãs da banda uma torcida de futebol, estão presentes no álbum. Quase todas podem figurar no dial das rádios, enquanto as bandas novas de rock preferem distâncias dos veículos de massa. 

"A banda escolheu esse universo para transitar. Não somos uma banda alternativa. Uma parte do pop rock brasileiro vive no underground e há uma recusa de boa parte desses grupos que dizem: 'Nós não vamos fazer isso'. Parece que chega a ser ofensivo para eles participar de programas de TV. Nós escolhemos esse perfil", conta Rosa, antes de morder mais um pão de queijo.

Existe então a preocupação em criar sucessos populares cada vez que o Skank entra no estúdio? "Claro que tem. Não é uma obsessão, mas se eu falar que não temos a menor preocupação, que tocamos o que queremos e fazemos uma ou duas musiquinhas para tocar no rádio, seria muita hipocrisia. É uma preocupação nossa. Quer uma [música] para tocar na rádio? Tá aqui", diz Samuel, batendo na capa do disco. O baixista Lelo Zanetti resume: "O Skank sempre foi assim, essa é nossa vocação."