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Após morte de Cybele, Quarteto em Cy gravará 1º álbum em oito anos

Patrícia Colombo

Do UOL, em São Paulo

29/08/2014 07h00

Com Vinicius de Moraes e Carlos Lyra como padrinhos de carreira, as irmãs Cylene, Cynara, Cybele e Cyva formaram o Quarteto em Cy e integraram a era de ouro da música popular, fortalecendo o cenário de grupos vocais no Brasil junto a conjuntos como Os Cariocas, MPB4 e Trio Irakitan. Uma semana após a morte de Cybele, que há um ano já estava afastada das canções para passar mais tempo com sua família, o quarteto --hoje com Cynara, Cyva, Sonya e Keyla Fogaça--, segue em turnê que celebra os 50 anos de trajetória e prepara álbum com canções inéditas de João Donato, Roberto Menescal, Marcos Valle e Carlos Lyra.

Ao longo das décadas, o Quarteto em Cy teve diversas formações com a entrada e saída das irmãs em períodos diferentes, substituídas por outras cantoras que de alguma forma adotavam o "Cy" em seu nome, como Regina Werneck, que virou Cyregina em 1966 no lugar de Cylene. Em 1967, Cybele e Cynara deixaram o grupo e juntas defenderam "Carolina" (Chico Buarque) no Festival da Canção de 1967, ficando em terceiro lugar. No ano seguinte, elas levaram o “Galo de Ouro” na competição com "Sabiá" (Tom Jobim e Chico Buarque).

As duas canções integram a atual turnê do Quarteto em Cy, que além de comemorar as cinco décadas, celebra também os 70 anos de Chico Buarque, grande parceiro das irmãs que já havia sido homenageado em 1991 com o disco “Chico em Cy”. “Cantar essas duas músicas agora vai ser barra demais para mim, é tudo muito doloroso”, comenta Cynara ao UOL. “Ao mesmo tempo é a maneira de lembrar dela ali no palco, onde mais gostava de estar. Perdemos o chão com a morte da Cybele. Sempre fomos muito unidas e temos uma história juntas. Perder um pai e uma mãe faz parte da vida, se despedir de uma irmã maravilhosa é muito difícil.”

Há cerca de um ano Keyla assumiu o posto de Cybele em show em Belo Horizonte, e no próximo dia 20 o grupo retorna à cidade, desta vez com a turnê “Olhos nos Olhos” – que ainda acontece em 26, 27 e 28 em Salvador e no dia 23 de outubro no Rio de Janeiro, com mais datas em negociações. Nas apresentações atuais, canções do compositor são intercaladas por causos da carreira do quarteto e da relação de amizade com Buarque.

A história das irmãs de Ibirataia, na Bahia, é conhecida. Foi por meio do projeto sociocultural intitulado “Hora da Criança” que elas começaram a cantar de forma despretensiosa. Em viagem ao Rio de Janeiro no início da década de 60, contudo, Cyva ficou amiga de Vinicius e de Lyra. Ambos acabaram posteriormente conhecendo também Cylene, Cynara, Cybele e incentivando a criação do conjunto vocal. O primeiro disco, homônimo, com arranjos de Eumir Deodato e Luís Carlos Vinhas, e arranjos vocais de Carlos Castilho, saiu em 1964 e deu início a uma sólida carreira estruturada no talento das Cys somado a parcerias com grandes compositores, entre eles Edu Lobo, Baden Powell, Vinicius, Lyra, Buarque, Tom Jobim e Billy Blanco.

Novos Tempos
Cynara, no entanto, não nega as dificuldades de manter o grupo em constante produção em um cenário musical bastante distinto ao de anos atrás. Com uma discografia que conta com quase 40 álbuns, o último, “Samba em Cy”, foi lançado em 2006. Ela argumenta que o Quarteto em Cy nunca quis se submeter às regras do mercado em detrimento de valores próprios. 

“Jamais fizemos concessões e sempre respeitamos nossas escolhas como grupo. Acreditamos nesse caminho da boa música brasileira. Hoje anda tudo muito chulo”, diz. “Sempre tivemos coerência no nosso repertório. E bom gosto tanto nas escolhas das composições, quanto em harmonia, melodia. Os anos 60 nos deram ídolos que continuam os mesmos e sempre representamos essa leva de grandes compositores.”

Segundo ela, “a turma dos anos 60 não grava mais como antigamente”. “Temos que correr atrás de coisas independentes porque as gravadoras hoje em dia só querem saber de hit e sucesso imediato.” Para o álbum que interromperá o hiato de oito anos longe dos estúdios, o quarteto teve o projeto aprovado via Lei de Incentivo ISS e agora está em negociações em busca do patrocínio.

“As canções do Donato, Menescal, Marcos Valle e Carlos Lyra são todas novas e foram compostas para nós”, comenta, exemplificando o laço do Quarteto em Cy à “velha guarda”. Por ora sem data de lançamento, as gravações terão início ainda este ano. 

Outra novidade que deve chegar ao mercado em algum momento de 2015 é o box da série “Tons”, da gravadora Universal, com a reedição em CD dos títulos “Som Definitivo” (1966) - que Cynara aponta como o melhor da carreira do grupo -, “Antologia do Samba Canção” (1975) e “Quarteto em Cy Interpreta Gonzaguinha, Caetano, Ivan, Milton” (1980).

Fã de grupos vocais mais recentes, como o Mulheres de Hollanda, Cynara não abre mão de elogios ao ofício - ainda que o formato não alcance mais o mainstream como antigamente. “Você se sente muito vivo cantando com outras pessoas para tornar aquela junção de vozes um timbre único. Não há espaço para ego. É união e muito ensaio. Os grupos vocais nunca vão acabar porque existe garra, e quem permanece nisso é porque gosta muito. Veja nós, Os Cariocas e o MPB4.”