João Carreiro ignora moda universitária e faz sucesso com sertanejo de raiz
Quando começou a cantar, o mato-grossense João Carreiro recebeu um conselho insólito pai, um admirador ortodoxo das modas caipiras. Para ter sucesso, deveria abrir mão das raízes e apostar em algo mais moderno, condizente com o sertanejo atual.
João bateu o pé. Como canta em um das faixas de seu recém-lançado primeiro álbum solo, após desfazer a dupla João Carreiro e Capataz, ele já nasceu peão.
“Sempre escutei bastante disso. Até do meu próprio pai. Mas, como diz o outro, eu sou bem cabeça dura, e sigo firme no propósito”, diz ao UOL João, em entrevista por telefone.
As fotos escolhidas para o álbum já entregam a natureza de Carreiro –nome emprestado do ídolo Tião Carreiro. Em vez do topete e gel, um portentoso chapéu de boiadeiro. Nos ombros, no meio do mato, a viola caipira, com a qual constrói paisagens bucólicas e de amores sinceros.
“Meu pai tinha uma fazendinha, lá pros lados de Primavera do Leste, no Mato Grosso. Todos os feriados e férias de escola a gente ia pra lá. Sertaneja mesmo, não tinha luz elétrica nem água encanada. Essa influência é muito grande na minha vida.”
Da solidão poética do campo até a música de raiz foi um pulo. “Cresci ouvindo Ronaldo Viola e João Carvalho, João Mulato e Pardinho. Mas, quando me apaixonei pela viola decidi que iria cantar, não tinha pretensão nenhuma de seguir profissionalmente. Era apenas para aprender as coisas que eu gostava.”
Com o sertanejo onipresente nas paradas na última década, Carreiro teve a chance de se lançar como um tradicionalista, com forte influência da moda caipira. Voz grave, feições sérias, é um ponto fora da curva universitária. Pode não ser um pop star como Luan Santana e Lucas Lucco, mas nem por isso deixa de lotar seus shows, a maioria deles em cidades de interior.
“O nome sertanejo nunca teve tão forte. E isso só tem lado bom. Acho que é a qualidade que diferencia cada artista. Mas a gente não pode falar que a música que fulano ou ciclano faz é fraca. Cada um tem seu sonho.”
A verdade da vez para Carreiro é a da renovação. Não só musical. Entre 2014 e 2015, ele ficou mais de um ano afastado, realizando um tratamento contra depressão e Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC). Hoje, se diz totalmente curado.
“Foi um ensinamento. Acabou me fortalecendo mais ainda. Está sendo legal perceber isso agora, pude refletir bastante. Eu estava deixando o compromisso profissional tão grande que ele estava ofuscando minha beleza para a música.”
"Sucessor" de Zé Rico
De volta aos holofotes, João repete como um mantra na entrevista que sua vocação caipira é um dom, algo ao qual não pode renunciar. E durante quase dez anos de carreira, mesmo nadando contra a maré, não faltaram incentivos. Um deles de uma figura especial: José Rico, da dupla Milionário & José Rico, que morreu em março.
“Ele sempre trilhou o caminho dele e acreditou na verdade dele. Sempre gravou coisas bonitas. Um dia até a gente se encontrou no aeroporto, e ele me aconselhou: ‘João, nunca grave porcaria, o artista morre e a arte fica. Você veio aqui na Terra para fazer coisa bonita.”
Em junho, João foi escolhido pelos leitores do UOL como o novo parceiro ideal para Milionário, que atualmente se recupera de uma cirurgia cardíaca.
“Fico feliz. De certa forma, eu tenho coisas em comum com o Zé. Ele sempre acreditou naquele trabalho dele. Não é o artista mais tocado nas FMs do Brasil, mas você ia no show e via velho, criança, todo mundo chorando e se emocionado.”
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