"Andam fazendo muita gozação com o feminismo", diz vocalista do Garbage
Sonho ruivo favorito de 9 em cada 10 adolescentes da década de 1990, a escocesa Shirley Manson, 49, escolhe a modéstia para falar de si. Recém-saída da turnê que celebrou os 20 anos do primeiro e homônimo álbum do Garbage, a vocalista não se enxerga como sex symbol nem pop star.
No entanto, arenas lotadas e êxtase reinaram em todas as plateias até o início do giro recente, que passou por 27 cidades nos Estados Unidos e Europa entre outubro e novembro, o que surpreendeu a autora dos hits "Only Happy When It Rains" e "I Think I'm Paranoid".
Uma espécie de recado: a mensagem Garbage, que serviu de plataforma de afirmação para garotas tímidas e jovens excluídos dos anos 1990, ainda é relevante para muita gente. “Mal posso acreditar em tudo que aconteceu. Todos sabiam cantar todas as músicas. Foi arrebatador. Me senti uma superstar”, diz Manson, humildemente, em entrevista por telefone ao UOL, antes de soltar uma de suas gargalhadas —igualmente arrebatadoras.
Na entrevista que você lê abaixo, Shirley relembra a primeira, única e tardia passagem do Garbage pelo Brasil, em 2012, quando a banda fez um show memorável no festival Planeta Terra, em São Paulo. “Se eu fosse uma apostadora, apostaria que voltaríamos em 2016 com o novo álbum. Esse é o desejo da banda."
Distribuindo sua conhecida simpatia, a cantora afirma que envelhecer é um privilégio, além de eleger os momentos mais especiais da carreira, adiantar o tema do novo do trabalho (“o mais romântico que já gravamos”) e criticar a forma como o feminismo, que sempre abraçou, é tratado pela mídia e por críticos em geral.
“Acho que andam fazendo muita gozação com a palavra ‘feminismo’, algo que, para mim, significa apenas igualdade”, diz ela.
UOL - Garbage foi apenas a sua a terceira banda, e já são mais de 20 anos desde o primeiro disco. Imaginava chegar a tudo isso?
Shirley Manson - Definitivamente, não. Comemorar esses 20 anos foi uma das experiências mais surreais da minha vida. Não consigo acreditar em tudo que aconteceu. Sempre havia um momento do show em que eu parava e tirava um tempo para me sentir grata por essa carreira incrível na música. Todos sabiam as letras de todas as músicas. Foi arrebatador. Eu me senti uma superstar (risos).
Mas você é!
Mas nunca me senti uma, sabe? Foi muito especial. Acho que minha cabeça está prestes a explodir de felicidade (muitos risos).
Se tivesse que escolher agora seus momentos mais memoráveis no Garbage, qual seriam?
Duas coisas vêm à mente de imediato. Uma seria quando emplacamos nosso primeiro single no rádio [a faixa “Vow”]. Essa memória fica impregnada no seu DNA para sempre. A primeira vez que você ouve sua própria música é o momento que começa a sua carreira, e o rádio tornou isso oficial. Pessoas do mundo todo estão te ouvindo. É mágico.
O segundo, para mim e minha família, foi ter sido convidada [em 1999] pela minha cidade, Edimburgo, para representar o meu país, a Escócia, quando nós finalmente asseguramos nosso primeiro governo em 300 anos. Fomos convidados a tocar no show de comemoração, no Princes Street Gardens [parque que ladeia o histórico Castelo de Edimburgo, na capital escocesa].
Você já disse em entrevistas que o novo álbum falará sobre envelhecer. Sobre o que exatamente será o disco?
Acho que, de certa forma, eu venho brincando muito com jornalistas sobre isso, mas há um lado sério. Nós o estamos chamando de algo como um “romance gótico”. Porque é o disco mais romântico que já gravamos. Quando falo de romance, não falo só de músicas de amor sobre homem e mulher, sobre amigos, sobre animais. É sobre um caso de amor com a vida. E essa experiência inclui envelhecer, que, para mim, é um privilégio enorme.
Vocês só tocaram uma vez no Brasil, em 2012. Como foi?
Oh, meu Deus. Nós nos apaixonamos. Não conseguíamos acreditar. Nós conversamos entre nós, e todos nos sentimos ultrajados por nunca termos tocado no Brasil antes. Em muito, foi porque nossa gravadora não nos deixava ir. Eles achavam que poderiam ganhar mais dinheiro em outro lugar. O fato é que as gravadoras tomam decisões baseadas apenas na parte econômica. São Paulo é uma cidade gloriosa, e o Brasil é um país incrível. Estamos todos determinados a voltar. Se eu fosse uma apostadora, apostaria que voltaríamos em 2016 com o novo álbum. Esse é o desejo da banda.
Você sempre abraçou o movimento feminista, e esse tema nunca esteve tão presente nas discussões, inclusive em Hollywood. Sente que seu recado foi bem entendido?
Eu não vejo isso como um movimento feminista. Eu vejo como uma nova batalha pelos direitos civis. Acho que andam fazendo muita gozação com a palavra “feminismo” ultimamente, o que, para mim, significa apenas igualdade. Acho que essa palavra vem sendo pisoteada pela mídia, por razões que eu não entendo muito bem. As mulheres ainda estão em uma posição de desvantagem terrível. E é muito pior no mundo oriental. Eu sou muito política nesse caso e pressiono pelos direitos civis.
Quando vejo mulheres no comando agora, eu ainda as sinto distantes da ideia de igualdade feminina de uma década atrás ou mais. De entender porque elas precisam ser proativas e guardiãs dos direitos civis. Mas elas estão ficando mais ativas, o que é fantástico. Acho que é bom para todo mundo. Bom para todas as pessoas desse planeta. Todos os homens também. Temos uma sociedade mais feliz quando todos estão felizes (risos).
Recentemente, você retomou a carreira de atriz, participando da série “O Exterminador do Futuro: As Crônicas de Sarah Connor”. Por quê?
Eu preciso fazer música. Mas uma coisa que eu acabei percebendo é que eu também tinha de ser atriz. Eu sou boa atuando. Eu queria fazer e fiz. Ser atriz é uma coisa que veio num período negro da minha vida, que me trouxe muita tristeza e me tirou da zona de conforto. Interpretar uma exterminadora foi incrível, e, se eu tiver a sorte de receber outra proposta de papel como essa, eu estou dentro. Mas eu sou musicista. Uma cantora que é atriz nas horas vagas (risos).
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