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Em show sem área VIP, Rolling Stones volta a Buenos Aires após 10 anos

Stones abriram sua turnê na América Latina no Chile, e agora estão na Argentina - Getty Images
Stones abriram sua turnê na América Latina no Chile, e agora estão na Argentina Imagem: Getty Images

Dean Goodman

Colaboração para o UOL, em Buenos Aires

08/02/2016 09h47

Assim como a maioria dos muçulmanos costuma fazer a Hajj (peregrinação) a Meca, muitos admiradores argentinos do Rolling Stones começaram a fazer na noite de ontem a peregrinação até a Buenos Aires para ver a banda tocar para seus fãs mais malucos –neste caso, muitos jovens cheios de energia, e que não têm lembrança da última visita dos Stones a Argentina, há uma década.

O primeiro dos três shows dos Stones no Estádio Unico em La Plata, neste domingo (7), foi marcado por uma massa caótica de corpos se movendo e cantando. E também parecia haver um aspecto espiritual no ar, quando os deuses da chuva pararam as três horas de aguaceiro constante, pouco antes dos Stones tomarem o palco, às 21h14.

Mick Jagger e companhia sabiam imediatamente, desde as primeiras notas de "Start Me Up" que não estavam mais nos Estados Unidos, onde os "baby-boomers" (a geração pós-Segunda Guerra Mundial) gritam com você por estar em pé na frente deles durante uma canção lenta, ou seguranças asseguram que você não dance tão agitadamente em seu local.

Diferentemente da primeira parada da turnê "Olé", em Santiago, na última quarta-feira (3), a pista em La Plata não estava dividida em setores, tendo os mais VIPs e endinheirados à frente do palco. Era um mar totalmente democrático --apesar de anárquico-- de argentinos agitados se movendo para frente e para trás, com uma intensidade assustadora. Você não sabe se acabará com uma perna quebrada ou tornozelo torcido.

"Keep on pushing" (continue empurrando) --parte da letra de "Tumbling Dice"-- parecia ser o tema do show desde o início. Foi provavelmente o público mais barulhento e participativo desde que os Stones visitaram Madri, em junho de 2014. A plateia "caliente" até mesmo conseguiu abafar o coro local que cantou a introdução de "You Can't Always Get What You Want".

"Eu te amo, Buenos Aires", disse Keith Richards a certa altura, provocando um canto prolongado de "Olê, olê, olê, olê, Rii-chard, Rii-chard". Desde que chegou à América do Sul, o guitarrista não parou de exibir seus novos dentes, estranhamente brancos. De fato, a banda toda deve estar arrependida por ter ignorado a América do Sul até 1995 e tê-la visitado apenas três vezes desde então.

Quanto ao show, que durou cerca de duas horas e 20 minutos, a banda manteve o alto nível de consistência exibido em Santiago. Parece haver pouco espaço para melhorias, musicalmente falando. Os destaques incluíram "It's Only Rock 'n' Roll" e "Paint It Black".

Como esperado, houve pouca mudança no setlist. "Street Fighting Man" foi a adição popular, após ser escolhida pela Internet, uma honra que coube a "She's a Rainbow" em Santiago. Também adicionada foi a menos amada "Anybody Seen My Baby", onde Jagger e o cantor de apoio Bernard Fowler buscaram cair nas graças da plateia ao adicionarem os nomes de várias cidades locais, como Córdoba e Mendoza. Ela substituiu "Let's Spend the Night Together", e Richards trocou uma de suas duas canções, cantando "Can't Be Seen", faixa do álbum "Steel Wheels", de 1989, em vez de "You Got the Silver".

Tradicionalmente a banda não muda seu setlist de forma radical. Mas alguém poderia se perguntar por que não na Argentina? Os fãs conhecem cada canção gravada pela banda. Será que se revoltariam se Jagger deixasse de lado clássicos datados como "Sympathy for the Devil" ou "Miss You", uma canção da época da discoteca? É claro que não. E, a propósito, eles amaram essas canções, assim como os brasileiros amarão. Com Jagger, Richards e o baterista Charlie Watts septuagenários, mas ainda tocando como se estivessem em 1966, é suficiente ser grato por continuarem existindo.