Músicos e plateia passam sufoco e Theatro Municipal oferece novos ingressos
Um problema no ar-condicionado do Theatro Municipal de São Paulo, desde novembro do ano passado, tem causado desconforto em músicos, maestros, convidados e na plateia. No último domingo (28), por exemplo, o maestro John Neschling sofreu um mal súbito durante a regência da OSM (Orquestra Sinfônica Municipal), e o concerto foi interrompido logo após a volta do intervalo. Segundo a Fundação Theatro Municipal, um ato de vandalismo prejudicou os cabos do aparelho, mas a entidade informou que o funcionamento foi restabelecido na última segunda-feira.
Para o público presente no concerto do último domingo, o Theatro oferecerá ingressos para outros eventos da programação. A retirada das novas entradas poderá ser feita diretamente na bilheteria, de segunda a sábado, das 10h às 17h, e aos domingos, das 10h às 15h. O cliente deverá apresentar documento de identificação e levar o ingresso ou comprovante de aquisição.
A próxima apresentação da orquestra no local, com regência de Neschling, está prevista para o dia 12 de março, às 20h. "Só acredito [no conserto do ar-condicionado] vendo. Vamos ensaiar no Municipal antes dessa data [no dia 8], aí será possível saber", disse ao UOL um dos músicos da OSM, que pediu anonimato por receio de retaliação. Segundo o instrumentista, a alta temperatura tem atrapalhado a execução dos movimentos. "No início do problema, ainda usávamos terno e casaca, mas, com o tempo, passamos a vestir camisas pretas. No fim, as brancas já estavam liberadas. As mulheres da orquestra têm mais opção, porque podem ir de vestido".
O problema vai além da vestimenta, já que o calor prejudica também a afinação dos instrumentos. "Acontece com os instrumentos de corda, como violino e violoncelo, e também com os de madeira, como oboé, clarineta e flauta. Nas cordas, a afinação geralmente desce, enquanto nos sopros sobe. Há uma dilatação. O ar-condicionado ajuda a retirar a umidade do ar, o que favorece a estabilidade dos instrumentos". Segundo o integrante da orquestra, os músicos conseguem corrigir a desafinação enquanto tocam. "O público leigo nem percebe [a desafinação], mas isso nos desgasta demais fisicamente", disse ele, acrescentando que as luzes do palco também ajudam a aquecer ainda mais o ambiente.
Outro músico da OSM ouvido pelo UOL, que pediu para não ter seu nome revelado, disse que o problema foi protelado diversas vezes. "Fomos avisados de que o ar havia sido consertado no sábado, mas chegamos para tocar no dia seguinte e estava tudo igual. Há meses nos dizem que os reparos vão ocorrer 'em breve'". De acordo com ele, o teatro esteve sempre cheio durante esse tempo. "Os concertos regidos por Neschling vendem com meses de antecedência. Talvez as pessoas não estejam cientes dessa falha, ou talvez pensem que, até a próxima apresentação, já estará solucionada".
Um dos músicos contou que, no último domingo, também passou mal durante a apresentação da orquestra. "Não sei se eu ia piorar, porque o concerto foi interrompido. O maestro não desmaiou, como disseram, ele ficou tonto, foi um mal-estar momentâneo. Ele foi se confundindo com as viradas das músicas, estava meio confuso. Daí ele se segurou na estante de música, que não suportou seu peso, e caiu para a frente", lembrou. "Ele se levantou com a ajuda de alguns músicos e saiu andando, amparado, até o camarim".
O outro integrante da OSM relatou que os quatro ares-condicionados instalados recentemente no fundo do palco para amenizar o calor não fizeram diferença. "Eles não são potentes o suficiente para um espaço grande como aquele. Além disso, liberam ar quente diretamente nos bastidores, onde afinamos os instrumentos e aguardamos a entrada". Segundo ele, a organização tentou abrir as portas do teatro para ventilar, "mas há o problema do barulho e um forte cheiro de maconha que vem da rua".
Três noites de sufoco
Não é só no palco do Municipal que o calor atrapalha: a plateia também tem sentido. O jornalista Eduardo Ribeiro, 32, foi três vezes ao teatro entre 5 dezembro e 28 de fevereiro, enquanto o equipamento estava quebrado. "Lembro do Claudio Cruz, o regente de dezembro, suando muito. Nesta última vez, já fui com roupas mais leves e vi muitas mulheres de leque e alguns homens de bermuda, o que não é proibido, mas também não é comum. Os aparelhos instalados no palco davam uma aliviada para quem estava mais à frente na plateia, mas o ar quente sobe, então esquentou muito do camarote para cima. Na galeria estava insuportável".
Eduardo estava presente na apresentação de domingo e contou que o concerto parou durante a segunda obra da noite, no meio do primeiro movimento da sinfonia "Manfred em Si Menor, op. 58", de Tchaikovsky. Segundo o espectador, a produção do teatro anunciou um novo intervalo, de 20 minutos, e após esse período o público foi informado de que o maestro estava bem, mas que a apresentação havia sido cancelada.
Já o estudante de agronomia da UFPR (Universidade Federal do Paraná) João Pedro Alves Neto, 19, foi pela primeira vez a um concerto no Municipal no dia 30 de janeiro. "Foi frustrante. Um dos pontos turísticos mais lindos de São Paulo foi roubado e ninguém fez nada". Para suportar o calor, João tirou os sapatos, dobrou as calças jeans e se abanou com folhetos do concerto, mas o som incomodou uma senhora à sua frente, que pediu silêncio. "O teatro também ficou com as portas abertas, mas não adiantou. O pianista famoso [o russo Roustem Saïtkoulov] estava ensopado de suor. No intervalo, havia uma fila imensa para comprar água, que chegava a 15 minutos de espera, e os atendentes não davam conta da demanda".
O produtor de vídeo Alexandre Gomes do Nascimento, 38, também esteve no concerto do dia 30 de janeiro, regido pelo maestro Carlos Moreno. "Minha atenção se dividia entre a música, o calor e o barulho das pessoas se abanando. Quando o sinal para o início do segundo ato tocou, olhamos uns para os outros como se estivéssemos indo para uma sala de tortura. Infelizmente, a melhor parte daquele espetáculo foi o instante em que pudemos deixar o teatro e tomar um ar na rua".
Nota da Fundação
O UOL entrou em contato com o maestro John Neschling, mas a assessoria de imprensa do Theatro Municipal informou que ele não concederia entrevistas. Em nota, a Fundação Theatro Municipal de São Paulo informou que "o furto de 763 metros de cabos de cobre que ligam a máquina de ar condicionado --Chiller--, localizada galerias subterrâneas do Theatro, foi identificado em janeiro. Em função do crime, diversos equipamentos foram danificados e a central ficou sem energia elétrica, o que resultou também no não funcionamento dos motores de drenagem. Com as chuvas, parte das instalações ficou submersa, ocasionando ainda mais danos a componentes como bombas e painéis elétricos. Os reparos, que duraram quase dois meses, envolveram a solução dos problemas decorrentes do furto e do alagamento e ainda a atualização do sistema e o reforço da segurança no local".
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