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Ex-bailarinos de Madonna revelam que tinham medo de demissão por terem HIV

Na Cama com Madonna - Reprodução - Reprodução
Capa do DVD "Na Cama com Madonna" (1991)
Imagem: Reprodução

James Cimino

Colaboração para o UOL, em Los Angeles

19/08/2016 06h00

Chamado por Madonna de "o primeiro reality show da história", o documentário "Na Cama com Madonna" (1991), que retratava todo o universo de sua polêmica turnê "Blond Ambition", completa 25 anos de seu lançamento e de uma inovação para a época: mesclar cenas de bastidores com imagens de show. Algo tão comum hoje em dia que fez com que, na época, conseguisse a marca de documentário mais assistido da história.

O filme trazia duas cenas que atraíam a audiência. Uma é o momento em que todos brincam de "verdade ou sacanagem" (ou "truth or dare", em inglês) e Madonna é desafiada pelo bailarino Luis Camacho a mostrar, com uma garrafa, como pratica sexo oral. Na mesma brincadeira, dois dos bailarinos são desafiados a dar um beijo de língua que, para aquela geração, teria sido o primeiro beijo gay a ser visto na TV e no cinema.

Junte-se a isso as performances emblemáticas, como a de "Like a Virgin" em que a cantora simula masturbação em uma cama para logo depois ser exorcizada numa igreja ao som de "Like a Prayer". Todo o burburinho em torno do documentário de Madonna transformou os bailarinos e as vocalistas Niki Harris e Donna Delory também em estrelas internacionais.

Agora, outro documentário chega aos cinemas sobre os bastidores dos bastidores: "Strike a Pose", que está correndo o circuito de festivais de cinema pelo mundo e contando a história da vida dos bailarinos Kevin Stea, Carlton Wilborn, Luis Camacho, Gabriel Trupin, Salim Gawloos, José Gutierrez e Oliver Crumes 3º.

Lançado em Los Angeles durante o Outfest, o maior festival de cinema LGBT da cidade, o filme precisou de uma sessão extra para acomodar todos os fãs (não apenas da cantora, mas também dos dançarinos).

No debate após a sessão de lançamento do filme, Kevin Stea disse que a recepção do filme e os depoimentos que recebem pelas redes sociais o fizeram perceber, pela primeira vez, que sua participação em "Na Cama com Madonna" marcou a vida de muita gente. "O tempo todo as pessoas vêm e dizem que ver a gente sendo gays assumidos os ajudou a se assumirem também.”

Medo da demissão

Uma das histórias mais tocantes no documentário é a de que três deles já tinham HIV. Na época, não havia coquetel de medicamentos como hoje e ser diagnosticado com o vírus era uma sentença de morte. Gabriel Trupin e Salim Gawloos, que dão o famoso beijo, eram dois deles. Wilborn era o terceiro. Turpin é o único que sucumbiu à doença e morreu em dezembro de 1995.

Sem saber dos seus bailarinos, Madonna fazia discursos e mais discursos durante suas apresentações falando do drama da Aids, da morte de seu amigo, o artista plástico Keith Haring, alertando seus fãs a praticarem sexo seguro e sempre destacando seu compromisso de combater o preconceito contra gays e pessoas soropositivas. Ainda assim, Carlton Wilborn, que participou da primeira turnê de Madonna a passar pelo Brasil em 1993, "The Girlie Show", lembrou sobre o medo que tinham de que a doença fosse descoberta pela produção de Madonna.

"Eu não sei [se ela me demitiria], mas meu medo era autêntico, eu já tinha sofrido bastante preconceito quanto a isso de pessoas muito mais próximas, minha família. Meu irmão mais velho morreu de Aids e vi meu pai surtar. Eu não queria arriscar. Meu médico disse que eu tinha seis meses de vida na época. Mas, ao mesmo tempo, eu acho que ela sempre foi muito autêntica sobre o que dizia [em relação a isso]", disse Wilborn.

Madonna: legal ou real?

Os dançarinos contam que muita gente, quando conversa com eles sobre o filme ou sobre a turnê, espera que eles pintem Madonna como uma pessoa má e impiedosa. "Porque ela desafia nosso mundo. A maioria das pessoas não está disposta a ser questionada ou a olhar com profundidade para dentro de si. E o trabalho dela é exatamente sobre isso", analisa Wilborn.

Já Kevin Stea, que chegou a processar Madonna por não ter recebido o suficiente pelo documentário, destaca o jeito real de Madonna. "Eu acho que as pessoas a odeiam porque ela não faz questão de ser fofa. Todas as celebridades, como J.Lo, Beyoncé, estão sempre posando de boazinhas. A Madonna não faz esse jogo. Ela nem sempre é legal, mas ela é sempre real."

Relevância da cantora

Para Luis Camacho, que aparece na performance de "Like a Virgin" usando um sutiã pontudo como o da cantora, Madonna pode não ter como agenda prioritária o direito dos LGBTs, mas continua fazendo um trabalho social importante. "Neste momento em que estamos dando esta entrevista, ela está na África inaugurando um hospital infantil. Mas é óbvio que isso não chama tanto a atenção quanto quando ela está namorando um homem mais novo", analisa.

Já Stea diz o que gostaria de ver Madonna fazendo hoje em dia. "Eu acho que ela faz uma discussão sobre o que é apropriado para esta ou aquela idade que eu acho muito interessante. Mas eu gostaria de vê-la se deixando ser velha e feia. Sem todo aquele aparato em volta dela. Mas, também, se ela está feliz fazendo o que faz, ótimo. Como diz o José Gutierrez no nosso filme: 'Tenha orgulho! Não importa quem você seja, tenha orgulho.'"