Com produtor sueco, Sepultura se renova e acerta a mão em "Machine Messiah"
Maior nome do metal nacional, o Sepultura lançou nesta sexta-feira (13) o 14º álbum, “Machine Messiah”, que apresenta uma banda tentando fugir da zona de conforto. “Se você não arriscar, tentar alguma coisa nova, você vai copiar alguém ou a si próprio. Estamos no melhor momento da carreira”, analisa o guitarrista Andreas Kisser ao UOL.
O grande responsável pela mudança sonora é o produtor sueco Jens Bogren, que incorporou outros aspectos e instrumentos ao álbum, dando atenção às mudanças rítmicas e à versatilidade dos músicos sem deixar o groove de lado. “Ele trouxe a ideia de colocar violinos da Tunísia, uma orquestra fantástica, que abriram várias possibilidades musicais. O produtor nada mais é do que o 5º elemento da banda e tem total liberdade para opinar”.
“Já queríamos fazer um disco que explorasse a nossa musicalidade no mais alto nível, e foi importante porque ele deu uma marca sonora para o trabalho. Foi uma gravação bem difícil, falando especificamente da parte técnica, mas estávamos preparados emocionalmente para fazer o álbum”.
O conceito de uma sociedade escravizada pela tecnologia sugere uma visão quase religiosa de um salvador robótico da humanidade. “A ideia é que você tem que assumir suas limitações e tentar resolver seus próprios problemas, e não esperar por um Messias. Hoje em dia a gente vê os smartphones fazendo parte da mão das pessoas. Você vê nos shows a galera filmando e se esquecendo de fazer parte daquele momento”, critica o músico.
É em um ambiente caótico que o Sepultura entrega as 10 faixas do álbum. “É uma coisa triste e infelizmente essas coisas acontecem e parecem cada vez piores. Você vê o desleixo com tudo. O Maracanã está totalmente abandonado, imagina os presídios? Eu faço uma analogia com a lei Cidade Limpa, em São Paulo, que quando tiraram os outdoors deu para ver a podridão. E isso acontece com a política brasileira, está caindo a placa. O negócio é podre e está desmoronando”.
O recente massacre no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus, serve como comparação à chacina do Carandiru, que a banda musicou na faixa “Manifest”, do raivoso trabalho “Chaos A.D” (1993)
“E vemos que desde o “Chaos AD” até hoje as coisas não mudaram nada, pelo contrário. Eu acho que é legal que a música tem essa possibilidade de dar uma chamada ou de chamar atenção que isso não é normal, são coisas brutais que deveriam ser evitadas”.
Entre a cadência e o thrash
A faixa “Iceberg Dances”, a 1º instrumental composta por Andreas, Paulo Jr. (baixista) e Eloy Casagrande (baterista), é o exemplo de uma banda sólida que soube unir o lado pesado com o violão clássico, que incorporou até um teclado lembrando algumas passagens do Deep Purple.
“O disco foi planejado no formato vinil. Então pensamos qual seria a melhor música para abrir, qual viria na sequência, qual abriria o lado B e essa termina o lado A. Chamei meu amigo Renato Zanuto, que é arranjador e maestro, para gravar os teclados. E também teve a mão do Jens nisso”.
Derrick Green também merece destaque no trabalho, principalmente na arrastada faixa homônima que abre “Machine Messiah” e em “Cyber God”. Ora com o vocal gutural pelo qual é conhecido ora com um tom mais limpo e bonito, o norte-americano mostrou, novamente, que é o cara certo para o Sepultura.
O quarteto se prepara para uma extensa turnê europeia ao lado do Kreator, que lança ainda em janeiro o esperado “Gods of Violence”. ”Já temos uma ideia do que vamos tocar. Queremos mostrar muitas músicas do álbum novo, parece que elas estão com vontade de estar no palco”, brinca o guitarrista.
Para os que ainda fecham os olhos para o Sepultura pós-saída de Max e Iggor Cavalera, Andreas tem um recado. “Para mim não importa. A gente tem feito coisas durante 32 anos, as pessoas têm suas ambições, suas expectativas, mas a gente não está aqui para ficar alimentando as expectativas de ninguém”.
“É só ver que Megadeth, Slayer, Metallica e Anthrax lançaram materiais recentes e que os shows têm muita coisa desses trabalhos. Mas é claro que há um balanço. Acho que o metal está muito mais atual que outros gêneros musicais e por isso é o estilo mais popular do mundo”, completa Andreas.
Confira abaixo as impressões iniciais de cada faixa de “Machine Messiah”:
. Machine Messiah
Um novo Sepultura? Com tom pesado e vocal arrastado de Derrick, a faixa é uma grata surpresa e serve como introdução para o álbum. Destaque para o trabalho mais melódico de Andreas.
. I Am The Enemy
A agressiva e rápida faixa divulgada em dezembro do ano passado mostra que o Sepultura ainda tem lenha para queimar no thrash metal.
. Phantom Self
Voltando a usar as influências de Chico Science, o maracatu soa no 1º minuto como introdução à faixa que ganhou um clipe dirigido por Mauricio Eça. Como sugestão do produtor Jens Bogren, violinos dão um toque diferente ao tema.
. Alethea
Eloy rouba a cena na faixa, uma das melhores de “Machine Messiah”. Com um refrão pegajoso, é uma aposta certa para os shows. Atenção para os vocais sensacionais de Derrick.
. Iceberg Dances
A única música instrumental do álbum, “Iceberg Dances” mostra a qualidade do trio de músicos. Com detalhes de teclado, criando um lance que remete ao Deep Purple, o Sepultura passa do acústico à distorção na bela peça de quase 5 minutos.
. Sworn Oath
É a melhor junção Sepultura e Jens Bogren. Não deixando de lado o groove característico do grupo brasileiro, a faixa lembra os trabalhos do produtor com outros grupos como Opeth e Moonspell.
. Resistant Parasite
Uma das melhores músicas de “Machine Messiah”. O baixo marcado de Paulo e a potência vocal de Derrick encaixam com o trabalho melódico de Andreas e a fúria de Eloy.
. Silent Violence
A quebra de ritmo no meio mostra a qualidade da banda novamente, mas a faixa se perde ao ser comparada às demais.
. Vandals Nest
Que paulada! Mesmo estilo agressivo de “I Am The Enemy”, com Eloy destruindo as baquetas e boa alternância de estruturas vocais de Derrick ao lado das guitarras duplicadas de Andreas.
. Cyber God
As notas dissonantes de Andreas, em destaque desde o final da década de 1980, estão na faixa que encerra “Machine Messiah”. Com Derrick mais uma vez em excelente forma, o fade out encerra um trabalho coeso (e surpreendente) da banda brasileira.
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