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O mundo depende dos artistas, não dos políticos, diz músico do Midnight Oil

Midnight Oil 2017: Bones Hillman, Jim Moginie, Peter Garrett, Rob Hirst e Martin Rotsey - Divulgação
Midnight Oil 2017: Bones Hillman, Jim Moginie, Peter Garrett, Rob Hirst e Martin Rotsey Imagem: Divulgação

Leonardo Rodrigues

Do UOL, em São Paulo

03/04/2017 04h00

Entre tantos acontecimentos bombásticos, dois fatos se destacaram em 2016. Primeiro, o mundo bateu o recorde histórico de temperatura, acendendo o alerta vermelho da causa ambiental. Segundo, o Midnight Oil voltou. Coincidência ou estaria a banda australiana, conhecida pelo hit “Beds Are Burning” e pelo engajamento ecológico, se incumbindo da hercúlea tarefa de salvar o planeta ao menos da música ruim?

UOL - Como é voltar ao Brasil e praticamente começar a turnê por aqui?

Rob Hirst - Já fomos ao Brasil duas vezes. Sempre me lembro do Brasil como um país que tem um dos melhores públicos do mundo. É parecido com a Austrália. Vocês são muito entusiasmados. É incrível com tanta gente conhece a banda e nossas músicas. Brasileiros a australianos são muito parecidos. Espero que esses shows sejam tão selvagens quanto os últimos que fizemos aí.

O que pesou mais na decisão de voltar a tocar?

Foi o fato de termos 170 músicas e percebermos que queríamos tocá-las de novo. Muitas músicas são bem conhecidas no Brasil, mas também temos muitas faixas que não tocamos há anos. Foi muito legal entrar em estúdio de novo com a mesma banda e tirar um som. Ainda há uma química forte entre nós. Ainda nos gostamos e nos damos bem. É prazeroso que a primeira parte desse nosso novo ciclo seja uma turnê.

A banda sempre ganhou manchetes por defender o meio ambiente, e vocês voltaram em uma época de recorde de temperatura no mundo e de uma nova era da direita populista. Vocês voltaram para salvar o mundo?

(risos) Talvez não. Mas isso [salvar o mundo] depende muito de nós, músicos, cineastas, escritores, dramaturgos. Depende de as pessoas dizerem a verdade. Você não pode confiar nos políticos para isso. E nós estaremos nessa batalha este ano, junto de outras pessoas. É como um empurrão musical contra a loucura do mundo, a loucura de Donald Trump nos Estados Unidos, que está batendo de frente contra a segurança ambiental. A Europa também está em um momento delicado, na Holanda, França e Alemanha, com vários candidatos populistas de direita ganhando espaço pela primeira vez. Nós precisamos encontrar vozes para combater este mundo de 2017, para que ele faça sentido.
 
Pergunta simples: o que fazer então para salvar o mundo?

(risos) Temos apenas que nos lembrar que somos mais de 6 bilhões de pessoas. Estamos no mesmo planeta. Precisamos de um lar, de ar limpo, de água limpa. Precisamos de comida, e ela não pode estar intoxicada. Independentemente da vertente política, nós todos queremos essencialmente a mesma coisa. Temos que nos esforçar ao máximo para não acabar com nosso ambiente.

Desde que viemos pela última vez ao Brasil, muitas coisas melhoraram. Na Austrália, hoje temos muito mais políticas ambientais. O mundo já entende a importância da preservação, mas alguns políticos têm sido muito lentos em captar o que as pessoas querem. Eles não refletem o desejo básico do ser humano de viver em um mundo limpo.

Hoje não temos poucas bandas básicas e melódicas como o Midnight Oil. Qual é o problema do rock? Está ficando pop demais?

Acho que sempre houve bandas de pop e rock. A diferença é que nos anos 1990 houve uma mudança massiva em direção ao pop dançante e ao hip hop. Nós começamos nos anos 1970 e 1980, e continuamos a tradição do AC/DC. O fato é que a Austrália sempre teve reputação de ter bandas fortes ao vivo. E foi por isso que nós sobrevivemos. Acho que tocar ao vivo ainda tem um grande apelo para as pessoas. Elas ainda querem sair de casa para ver uma banda forte.

Midnight Oil posa na baia de Sidney para promover a turnê mundial "Great Circle 2017" - Aaron Bunch/Reuters - Aaron Bunch/Reuters
Midnight Oil posa na baia de Sidney para promover a turnê mundial "Great Circle 2017"
Imagem: Aaron Bunch/Reuters

O que significa ser australiano para você?

Acho que os australianos nascerem com espírito da rebelião. No início, éramos uma prisão, quando os americanos pararam de aceitar receber os condenados britânicos e eles passaram a vir para cá. Ainda sentimos que somos poucos, comparados à grande população de outros países, como o Brasil. Acho que ainda há um certo “espírito” por aqui. Não o de rebelião, mas da oportunidade. De sermos um povo afortunado. Acho que é por isso que os australianos tendem a ser otimistas e felizes. Somos parecidos com os brasileiros.

Em quê, por exemplo?

Nós também amamos o surfe e sair surfando por aí. Também adoramos fazer festas e nos curtirmos. Também temos as mulheres mais bonitas do mundo. (risos) Acho que os australianos e brasileiros têm as prioridades certas. O resto do mundo parece muito preocupado com bens materiais e dinheiro. Nós somos menos preocupados. Acho que as pessoas são felizes aqui só de ter uma vida livre da pressão que você tem nos Estados Unidos e na Europa, por exemplo. A Austrália está sempre esperando pelo próximo feriado.

Virá um disco novo de estúdio por aí?

Estamos trabalhando nas nossas 170 músicas para a turnê e não tivemos muito tempo para isso ainda. (risos) Mas temos músicas novas, sim. Talvez usaremos as passagens de som para terminá-las ou tiraremos uns dias durante a turnê para gravar algo novo. Não estou certo se haverá um álbum, porque isso soa como uma promessa. De qualquer forma, teremos uma penca de músicas novas daqui a um tempo.