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Hoje é dia de protestar, bebê! Rock in Rio catalisa indignação política

Alexandre Matias

Colaboração para o UOL

18/09/2017 07h47

O primeiro fim de semana do Rock in Rio deste ano foi marcado por protestos. Puxados principalmente pelos artistas, as manifestações eram reações diretas à onda conservadora que assola o mundo e especificamente aos desgovernos da gestão Temer. O esconjuro “Fora, Temer” era um grito constantemente preso na garganta, esperando apenas a deixa para ganhar força pelo ar. E essa deixa podia vir de discursos no palco, de citações musicais ou da simples vontade do público de gritar.

Ela é parente de uma outra indignação, a que reuniu jovens de todo o Brasil no primeiro Rock in Rio. Mas em 1985 o vetor estava invertido em comparação com 2017: a censura estava no fim, a ditadura também seguia pesarosa, os presos políticos tinham sido soltos e em pouco tempo todos os brasileiros poderiam voltar a votar. Em 2017 a ditadura se avizinha, bem como a repressão e as vozes de prisão. O primeiro Rock in Rio é contemporâneo da recém-falecida Nova República, pacto nacional feito para ultrapassar a ditadura militar. O Rock in Rio 2017 pode ficar marcado como o último realizado durante este período da redemocratização - quando finalmente assumirmos que somos um país preconceituoso e autoritário e voltamos a viver em uma ditadura sem indisfarçada.

Blitz, Frejat e Skank fizeram discursos contra a classe política do Brasil; Alicia Keys trouxe uma líder indígena brasileira para falar sobre a destruição da Amazônia, Liniker e Johnny Hooker esfregaram que qualquer maneira de amor vale à pena na cara do conservadorismo e até a aparição-relâmpago de Pabllo Vitar no Palco Mundo pode ser entendida como um protesto e uma vingança contra a ausência de Anitta e de drag queens no festival.
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É sintomático - e por um lado irônico - que o Rock in Rio funcione como catalisador desta indignação pública, que busca alternativas para sua sobrevivência. E por mais que o excesso de marcas e de lojas nos lembrasse constantemente que estávamos em um shopping center temático sobre rock, eram justamente os artistas que mostravam que um outro mundo era possível para além daquela redoma de irrealidade que paira sobre os diferentes palcos do festival.

Talvez possa ser o início da reação popular que estamos esperando. O Brasil vive uma de suas piores crises políticas e ninguém mais sai às ruas, seja de desânimo ou de vergonha. E por melhor que seja sua atual produção musical, poucos artistas brasileiros arriscam-se a queimar contatos protestando contra empresas ou governos. A sociedade está apenas assistindo calada aos desvarios da classe política em relação ao futuro do Brasil, esperando a sua hora de falar. E esse é o papel da cultura e da música, iluminar cabeças para mostrar que é possível mudar o que parece inevitável. Mas antes é preciso fazer.