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Estradeiros: Como é o trabalho dos roadies das bandas do Rock in Rio

Felipe Branco Cruz

Do UOL, no Rio

26/09/2017 12h02

Em inglês, "roadie" é uma gíria que remete a um cara que é seu amigo e te acompanha na estrada. Em português, poderia ser traduzida como "estradeiro". Mas no meio musical roadie é o braço direito dos músicos da banda. É aquele cara que fica ali na lateral do palco resolvendo todos os pepinos que aparecem durante um show.

Nos sete dias de Rock in Rio, o trabalho destes caras garantiu que nenhum artista passasse vexame. Eles cuidaram dos equipamentos, prepararam o palco, a montagem dos instrumentos, a iluminação, os amplificadores, enfim, toda a parte técnica das apresentações.

Acompanhamos de perto o trabalho dos roadies do Sepultura, Skank, Elba Ramalho, República e Digital Dubs para saber como eles fazem para resolver os inimagináveis perrengues que aparecem durante as apresentações.

Um olho no peixe e o outro no gato

Dedé Moreira é o roadie do Sepultura e no Rock in Rio cuidou dos instrumentos do Paulo Jr. e da bateria de Eloy Casagrande - Marcos Hermes/UOL - Marcos Hermes/UOL
O roadie do Sepultura, Dedé Moreira
Imagem: Marcos Hermes/UOL
Com 22 anos de estrada, o roadie do Sepultura, Dedé Moreira, 42, afirma que o trabalho vai além de um mero carregador de instrumentos. "Tem bandas em que o roadie é também compositor de algumas músicas", garante. Ele trabalha com o Sepultura há seis anos, mas já foi roadie de Pitty, Pavilhão 9, Titãs e Fresno. "Os artistas confiam em nós. Durante a montagem do show, nós que os representamos no palco". 

No Rock in Rio, ele auxiliou o baixista Paulo Junior e o baterista Eloy Casagrande. Logo no começo da apresentação, já surgiu um pepino para ele resolver. Paulo reclamava por meio de gestos da fuga do sinal do fone de ouvido. "Ensaiamos muito para este show então eu soube resolver rapidamente", contou.

No caso de Dedé, por coincidência, o estilo de música do Sepultura é o que ele tem mais afinidade, porém nesse meio, não tem dessa de escolher em qual banda vai tocar. "O trabalho é o mesmo no rock ou no sertanejo. São mundos diferentes, mas a função é a mesma".

Foi o que percebeu o roadie Alex Cunha, 45, que trabalha com Elba Ramalho e no Rock in Rio foi roadie do show O Grande Encontro. "Anos atrás, eu fui trabalhar com a Beth Carvalho. Ela me chamou no camarim e disse: 'Você é do rock, né? Mas gosta de samba?'. Eu respondi que sim e então ela perguntou as cores da Mangueira e da Beija-Flor. Eu acertei e fui contratado".

No caso da Elba Ramalho, seu trabalho vai além do palco. Ele também a acompanha em apresentações ao vivo em programas de TV e rádio. Recentemente, ela fez show em uma rádio e a corda do violão arrebentou bem na hora de "Chão de Giz". Elba improvisou outra música enquanto ele trocava a corda. "Demorei só dois minutos e o público nem percebeu", lembrou.

Douglas e Bruno, roadies da banda República, afinam os instrumentos antes do show - Felipe Branco Cruz/UOL - Felipe Branco Cruz/UOL
Douglas e Bruno, roadies da banda República, afinam os instrumentos antes do show
Imagem: Felipe Branco Cruz/UOL

Psicólogo de palco

Thiago Linden Ferreira, o Slash, 33, trabalha como roadie do grupo Digital Dubs, que no festival fez show com o Cidade Negra em homenagem ao Gilberto Gil. Cheio de frases de efeito, Slash usou o futebol para explicar a importância de um roadie em uma banda. "Eu sou o meio de campo e só rolo a bola para o artista marcar. Nosso trabalho é dar tranquilidade para ele entrar no palco relaxado e se preocupar só em tocar".

Slash vai além e diz que o roadie é o psicólogo de palco do artista. "Sou eu que estou ali no dia a dia. É muito mais do que carregar caixa. O artista não vai chorar para o produtor. Vai chorar para o roadie", brincou.

Os roadies da banda República, Douglas Lima, 29, e Bruno Gobi, 33, além de músicos também são luthiers (profissionais que constroem violões e guitarras) e entendem muito bem como funciona o equipamento. "Tem muito roadie que toca melhor do que o artista, mas prefere trabalhar com a parte técnica do show por afinidade com os equipamentos", disse Bruno.

"No começo do rock, o roadie era só um amigo da banda que estava lá para dar uma força. Essas coisas mudaram e agora somos profissionais. O roadie, no entanto, não precisa ser um virtuoso da guitarra, e sim deixar tudo pronto para o artista", contou Douglas que além da guitarra da banda, fica de olho para que os 15 pedais e 30 cabos do instrumento não deem problemas. 

Sandro Ramos, roadie do Samuel Rosa, do Skank, prepara o violão para entregar para o artista no Palco Mundo, do Rock in Rio - Marcos Hermes/UOL - Marcos Hermes/UOL
Sandro Ramos, roadie do Samuel Rosa, do Skank, prepara o violão no Palco Mundo, do Rock in Rio
Imagem: Marcos Hermes/UOL

Atenção total

Sandro Ramos, 46, roadie do Samuel Rosa, no Skank, lembra que o trabalho do roadie não é só diversão. "Se ficamos ali no palco só olhando, é porque deu tudo certo. Mas eu não posso me distrair nem um minuto", disse.

O roadie conta que passa o show inteiro do Skank olhando apenas para o Samuel, pois consegue perceber se algo deu errado e se antecipar para arrumar. "Se eu olhar para o lado e uma corda arrebentar ou um fio se soltar, eu não vou perceber. O Samuel conversa comigo durante a apresentação por meio de sinais. Não dá para descuidar".

No Rock in Rio, Sandro chegou no palco Mundo às 9h e só saiu de lá às 19h. "Primeiro os roadies da Fergie passaram o som, depois do Shawn Mendes. Em seguida nós subimos para organizar tudo. Só fui parar de trabalhar depois que o show do Skank acabou".

Sandro conta que a função no Brasil ainda não está tão difundida quanto no exterior. Por aqui, a maioria dos técnicos que ficam no palco são chamados apenas de roadie. Lá fora, a expressão roadie está dando lugar para termos mais profissionais como guitar tech e bass tech (técnico da guitarra e técnico do baixo).

"Acho que em comum com o artista nós temos a mesma paixão pelo instrumento. Toco guitarra desde os 15 anos, mas fazer shows não era a minha praia. Sempre gostei de fazer manutenção, de montar e desmontar a guitarra".