Com canções sobre o fim, Tim Bernardes se tornou uma das revelações de 2017
O paulista Tim Bernardes chega ao fim de 2017 com status de descoberta do ano, embora ele circule por aí desde 2009, quando formou a banda O Terno com os amigos Guilherme D'Almeida e Gabriel Basile.
O que fez esse garoto de 26 anos se tornar o compositor mais promissor de sua geração, e um dos mais elogiados pela crítica este ano, no entanto, aconteceu de forma mais íntima possível.
Sozinho, Tim derramou canções sobre ciclos que se encerram: um relacionamento no fim, uma perda ou até mesmo uma situação política, como ele canta nos versos doloridos de “Tanto Faz”: “Tanto faz quem saiu, quem entrou / Tanto faz de que lado ficou / Tanto faz eu vou sempre perder”.
“Tem tanto sentimento de um término, de não ter forças, de olhar o contexto e perguntar: onde eu me coloco? Pode ser sobre política ou pode não ser”, observa.
Foi dessa forma, com voz potente e peito aberto, que ele lançou em setembro “Recomeçar”, um dos discos mais delicados e sinceros desse ano. Uma espécie de suíte em que os sentimentos são expostos, sem firulas, sob o holofote. Algo que Tim chama de “auto-ajuda hipster”. Afinal, por trás de um, também bate um coração.
“Tem essa coisa de refletir sobre um sentimento ou tentar organizar ou traduzi-lo, sem medo de entrar a fundo. É uma exposição total de despir as travas, as máscaras”, explica Tim, do outro lado do telefone.
O tom pode parecer de desesperança para um jovem de 26 anos, mas “Recomeçar” aponta para frente até mesmo na canção-título, que encerra o disco, apontando justamente para bonança após a tempestade: “A dor do fim vem para purificar”, ele canta.
“Não é para expressar raiva. É fazer de uma coisa triste algo bonito, um retrato de algo que aconteceu e vai passar” defende. “Existe a esperança no novo”.
Encontrando a própria voz
Tim nasceu em berço extremamente musical. Filho do cantor e compositor Maurício Pereira, ex-integrante da dupla Os Mulheres Negras e autor de “Trovoa”, uma das canções mais emblemáticas da cena alternativa de São Paulo, Tim se integrou ainda criança com os instrumentos. A necessidade de escrever chegou mais tarde de forma mais irônica, questionando justamente o ofício e sua intenção de não soar mais do mesmo – ou justamente evitar ser mirabolante à toa.
A síntese aparece na divertida “66”, canção do primeiro disco de O Terno: “Então não sei o que eu devo fazer, pois se eu não posso inovar. Eu vou cantar o que já foi e vão dizer que é nostalgia”.
Mas aos poucos, uma desilusão aqui, um término ali, fez brotar outros sentimentos. “Eu olhava para O Terno como uma banda tem algum flerte com o humor, com uma maluquice, algo mais animado, muitas vezes eu guardava elas, para um momento que na época eu não sabia o que seria”, conta.
O disco acabou com uma unidade única. “É como se fosse só uma música gigante de 40 minutos, queria apostar mesmo em uma onda só”. Muita gente embarcou nessa onda e Tim, que já havia colaborado com Tom Zé e uma parceria à distância com David Byrne (na canção “All Around You”, do repertório da cantora Tiê), passou a escrever também para outros artistas, como Paulo Miklos. No novo álbum do ex-titã, duas canções, “Samba Bomba” e “Eu Vou”, tem o dedo de Tim.
Acostumado a dar vazão aos próprios sentimentos, ele diz que essas colaborações funcionam de forma mais misteriosa. “Quando alguém vem e pede, ‘ah estou fazendo um disco’, não sei se funciona assim. Às vezes rola, às vezes não rola também.”
O show do disco “Recomeçar” volta no ano que vem e Tim já pensa que rumo seguir nessa entressafra: “Minha vontade a princípio é alternar, fazer um [disco] do Terno, depois um meu.”
Se o tom após “Recomeçar” vai ser mais otimista ou não, pouco importa. O lance é manter o fluxo sem filtro do coração. “Posso seguir fazendo músicas sobre o que eu estou sentindo porque o mundo anda para frente, as coisas vão para frente, e o resultado de eu falar do que estou sentindo e pensando vai ser sempre diferente, vou me transformando também”, diz.
3 vezes Tim
"Não, não desliga, por favor
Nós dois sabemos que a gente
Não vai mais se encontrar
Nem se quiser é muito deprimente
Não chora mais, vai, por favor
Eu sei que você também sente
Mas se não é igual, não leve a mal
Vou fazer diferente"
(“Não”)
O medo e o desejo de entregar a liderança
Da cabeça ao coração
O pensamento prende, o pensamento não é bom
Quis desligar sua razão
Faltou coragem de arriscar
A vida sem cautela
Era muito incerta
Perdido de um lado da moeda quis o outro
Mas pensou um pouco
A mente e o sentimento são uma combinação
Interessante de se ter
A luz do ser humano e o instinto animal
Talvez não devam se dar mal
("Incalculável")
"E chegou no fim do filme
De volta aonde começou
Um minuto de silêncio
De quem riu, de quem chorou
E quem esqueceu da vida
Volta agora a se lembrar
Vendo os créditos descendo
A hora em cada celular"
("As Histórias do Cinema")
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