Rodrigo Silveira
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Jan Fjeld
Eve e Kelis têm vinte e poucos, são bravas e querem invadir seu estéreo com um pop sacolejante. Em seus álbuns recentes, Eve com "Scorpion" e Kelis com "Wanderland", as duas levam as frustrações com o estado das coisas para além da ira, do machismo e da violência.
Com uma mistura de rock, funk, hip hop e heavy metal, as duas criam uma poderosa massa sonora retrô, numa afirmação de que a vida é boa e vale a pena. A mensagem é de paz, mesmo que Eve às vezes se deixe levar pelo
gangsta rap.
Cansadas do discurso dos rappers -sobre as desigualdades de um mundo sem saída- e das lamentações dos artistas de rhythm and blues -que só tratam de amores impossíveis-, as norte-americanas Eve e Kelis escrevem as suas próprias letras sobre possibilidades: na vida e no amor.
Dão um banho de criatividade na mesmice sonora de contemporâneas como Mariah Carey e Britney Spears, sem tentativas de suicídio nem poses de virgem do pau oco.
Com a força e a vaidade da juventude, cada uma à sua maneira encontra ressonância entre o público adolescente, segundo mostram os números de vendagem. Nos EUA e Europa, os dois lançamentos figuram entre os dez mais vendidos e ambas encerraram 2001 com turnês bem-sucedidas. Eve se apresentou junto com o grupo
Ruff Ryders e Kelis abriu shows do U2.
Amparadas por um poderoso time de produtores -Eve com
Swizz Beatz e Kelis com a dupla
The Neptunes-, os dois lançamentos têm direito a sirenes, batidas pesadas, solos de guitarras, backing vocals e refrões acessíveis.
As similaridades entre elas não param por aí. As duas lançaram os seus primeiros trabalhos em 2000, Eve com "Eve: Ruff Ryder's First Lady" e Kelis com "Kaleidoscope", e ambas venderem milhões de CDs nos dois lados do Atlântico.
Além disso, os dois lançamentos atuais contam com uma bem articulada colaboração dos integrantes do
No Doubt. Na faixa "Let Me Blow Ya Mind", a vocalista Gwen Stefani divide o serviço com Eve numa produção lenta de
Dr. Dre onde o tema é tocado numa guitarra de verdade e acompanhado de um teclado bem bagaceiro. Stefani canta o refrão numa espécie de duelo com Eve. Inusitado, bem humorado e agradável.
Em "Perfect Day", de Kelis, composta por Stefani e os Neptunes, os músicos são, embora sem crédito, Kanal (baixo), Dumond (guitarra) e Young (bateria) do No Doubt. A voz do Kelis se dá bem com rock entrecortado com breaks e efeitos sonoros. É para tocar em FMs e. Chove no molhado pois soa como No Doubt.
Mas chega de comparação. Kelis tem a elegância do Prince psicodélico das batidas leves, secas e
funkeadas. Ela tem voz rouca, grave e sexy, cachos encaracolados, e cara de menininha hippie.
Chegou às paradas de sucesso com
"Caught You Out There" em 2000, literalmente berrando o refrão: "I hate you so much right now". Era uma adolescente frustrada com sua TPM e com o namorado. Um ano e um álbum depois, o primeiro single, "Young, Fresh n'New", sugere uma solução para os problemas: não adianta gritar, é melhor fugir de tudo, já que você é jovem, puro e novo ("just leave it all behind / you've got to get away") acompanhado de burbulhantes e arrastados efeitos de sintetizador.
As faixas "Flash Back", "Scared Money" e "Junkie" têm batidas quebradas com esparso arranjo de teclados e efeitos sintetizados. "Junkie" é uma cantiga sobre o vício de amar, onde ela admite: "sou viciada no seu amor, não consigo trabalhar. Cada vez que ele me olha, a minha boca seca. Quero a minha vida de volta". Soa chique e o refrão é hiper-pop.
Eve, por sua vez, pesa mais nas batidas, muitas vezes puxa para o ragga. É um
rap mais do sul, mas não menos funkeado. Ela usa um linguajar mais sujo, mais gangsta rap nas letras.
Embora esteja em seu segundo lançamento, como Kelis, Eve tem um
peso maior no cenário musical dos EUA.
O que sobrou do cabelo é pintado de vermelho gritante, e o visual é de muito couro, cintos e botas de plataforma estilo "blaxploitation" dos anos 70.
Em "Gangsta Bitches", conta com a colaboração de
Trina e
DaBrat,. Ela ridiculariza as auto-denominadas
"Gangsta Bitches".
A faixa "Who's that girl?" tem direito a trumpete a la "La Isla Bonita" de Madonna, uma sonoridade "latina" com um coro que responde: "Eve's that girl". Dá para cantar junto na primeira audição.
Eve faz raps poderosos e canta com uma inflexão puxada para o gospel na faixa "You had Me, You Lost Me". A sua versão do sucesso "No, No, No", celebrizado por Dawn Penn, conta com a colaboração de Stephen Marley, e poderia muito bem ocupar o espaço no rádio que atualmente é de Mariah Carey.
Tanto Eve como Kelis são mais reais e criativas do que as divas do mundo pop atual. Na disputa com o rock como principal veículo musical para expressar as frustrações da nova geração, o hip hop e o rhythm'n'blues são os gêneros do momento. Imbuídas dessa música, as meninas superpoderosas Eve e Kelis se destacam de suas contemporâneas e dão um passo além.
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