Um guia tiozão pra sobreviver ao maior festival de EDM dos Estados Unidos
Quando seu editor te oferece para cobrir o maior festival de música eletrônica de Las Vegas no dia do seu aniversário de 41 anos, você faz o quê? Aceita, claro! Afinal, você está em processo de negação da velhice, mesmo sabendo que EDM (sigla para electronic dance music) é um estilo de música eletrônica que não é muito a sua praia e que as suas sextas-feiras têm sido um constante misto de Netflix com uma taça de vinho tinto.
Você é daquela época que electronic dance music era Kraftwerk, Pet Shop Boys, Chemical Brothers, Underworld, Prodigy, Depeche Mode. Por isso quando adentra a arena do Las Vegas Motor Speedway, onde acontece o EDC (Electric Daisy Carnival), um evento que neste ano está acontecendo desde sexta-feira até a manhã desta segunda-feira, das 19h às 5h30, e que reúne cerca de 150 mil pessoas por dia no meio do deserto, o som dos diversos palcos te parece muito com aquele techno pesadérrimo que se costumava chamar nos anos 1990 de bate-estaca ou fritação. Os sets têm transmissão do UOL em parceria com a Red Bull TV.
São 23h30, a temperatura baixou de 41ºC para 30ºC, mas o mormaço da atmosfera ganha uns bônus de bafo quente na sua cara cada vez que um dos palcos cospe fogo, em um coreografado efeito pirotécnico que já é parte integrante do festival. Sem cuspição de fogo e sem fogos de artifício, os sets do EDC --que, este ano, tem Major Lazer, DJ Khaled e Dillon Francis-- não seriam os mesmos,
Nesta hora você também descobre por que os puritanos jovens americanos estão circulando pelo local com tão pouca roupa. Neste contexto, vale cueca, vale maiô, vale fio dental, meia arrastão, seja você homem ou mulher. Camisa é item opcional para homens, e tem até algumas garotas que se arriscam no topless. Claro, o efeito Las Vegas, uma das poucas cidades americanas onde se pode beber na rua e cujo lema é "o que acontece em Vegas fica em Vegas", ajuda muito.
Você quer ir ao banheiro porque tomou muita água para se prevenir de uma eventual desidratação, mas demora cerca de meia hora andando para encontrar, porque fica distraído com a beleza dos palcos, as projeções, a iluminação das ruas, as flores fluorescentes, os carros de som com luz de LED e laser que circulam pela arena, além da multidão de pessoas com tênis de luzinha, óculos de luzinha, chapéu com luz --isso sem falar nos brinquedos de parque de diversão que estão espalhados pelo local.
Aliás, como você é velho, fica se perguntando: "Como essa gente não vomita nesses brinquedos depois de beber tanto?". A resposta: "Juventude, energia e um pouco de prática. Seu corpo sabia como resistir a isso". E é neste exato momento que o peso da idade cai sobre suas costas e você pensa: "Será que eu ainda tenho energia para isso tudo?". Mas aí você se lembra que é seu aniversário e que nada mais te resta a não ser aproveitar a oportunidade e curtir com os "xóvens".
Principalmente porque você se lembra do show do U2 que está indo para o Brasil e que você acabou de ver em San Francisco onde o povo da sua idade que estava lá não cantava junto, não dançava e ainda te olhava torto se você fazia isso. Isso quando não reclamavam que você estava dançando e atrapalhando a visão deles, afinal eles pagaram uma fortuna por aquele lugar.
No EDC não tem nada disso. Primeiro porque absolutamente todas as músicas que tocam, em todos os os palcos, são hinos, como bem observou o motorista do Uber que me levou ao local, ele mesmo um apreciador de house e techno que "não tem saco pra EDM". Em todos os palcos que passei, não importava a música, todo mundo cantava todas a plenos pulmões. E eles dançam tanto, mas tanto, que tem uns sets de techno com hip-hop que os caras entram num movimento "headbanger" que deixaria os puristas do rock tiozão em pânico.
O que fazer num contexto destes? Primeiro escolha um drink de sua preferência, no meu caso vodka e energético, e vá andando pelo lugar até achar uma música que te agrade. É importante estar de ouvidos e coração aberto, especialmente se EDM não for seu estilo preferido. Como volta e meia rola um remix de Ariana Grande, Michael Jackson, Daft Punk, fica fácil de se misturar por ali.
Comece devagar. Pare no fundo da plateia e vá achando pequenas clareiras para se enfiar. E no caso do EDC tem um truque maravilhoso: volta e meia, frequentadores equipados de leques e sprays d'água penetram pela multidão borrifando o refrescante líquido enquanto os outros frequentadores, felizes da vida, vão abrindo caminho. Siga essa pessoa. Você vai ficar constantemente refrescado e vai chegar ao meio do fervo.
É o momento de dançar como se não houvesse amanhã --embora haja amanhã e depois de amanhã para repetir tudo isso. Enfie-se nas rodinhas onde as pessoas fazem passinhos, sorria sempre, ofereça água, drink. Se nada funcionar, diga que é seu aniversário e que você está sozinho. Pronto, ganhou os mais novos amigos de infância, que vão fazer de tudo para seu aniversário ser incrível, inclusive dizer que você não parece ter a idade que tem.
Eles vão inclusive te convidar a acompanhá-los a outros palcos e, nesta brincadeira, você vai experimentar um pouco do que cada palco tem a oferecer, além de conhecer um juventude que é super inclusiva e que detesta se apegar a rótulos. Eles não perguntam o que você faz, com quem você dorme, no máximo um "de onde você é?".
Nesta toada, sempre administrando os drinks com muita água, dá para dançar por pelo menos umas três horas. Até que chega aquele momento em que a repetição do bate-estaca começa a fritar sua cabeça e você quer ir embora. O que fazer, se você está no meio da muvuca? Aguarde um grupo de amigos que estiver indo na direção da saída de mãos dadas em formação de trenzinho e se enfie atrás do último. Em poucos minutos você está fora do palco. Isso deve acontecer por volta de 3h da manhã. Coma alguma coisa, beba mais um drink e não vá ficando "mais um pouquinho", como eu. Pegue o ônibus de volta antes das 4h para evitar o trânsito de duas horas até o centro de Las Vegas, quando os portões se fecham. Afinal, você ainda está jovem o suficiente para curtir a vida, mas já é velho o suficiente para evitar o perrengue da volta.
Agora, se você estiver montado na grana, pague US$ 800 de ida e volta por um serviço de helicóptero que te levará de volta em cinco minutos.
*O repórter viajou a convite da Red Bull
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