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Dolores O'Riordan fazia música pop pura e simples para todas as tribos

A banda The Cranberries - Reprodução
A banda The Cranberries Imagem: Reprodução

Alexandre Matias

Colaboração para o UOL

15/01/2018 17h26

Dolores O’Riordan, que morreu subitamente nesta segunda-feira (15), entrou para o imaginário coletivo no meio da indigesta salada sonora que virou o rock depois que o Nirvana mudou as regras do jogo no início dos anos de 1990. O vácuo comercial que permitiu sua ascensão, no entanto, não tinha nada a ver com sua própria sonoridade e só assim sua banda, os Cranberries, conseguiu um espaço que de outra forma não conseguiria naquela década: o da música pop pura e simples.

O Cranberries surgiu em uma época em que as grandes gravadoras, antes ditadoras do gosto musical do planeta, entenderam que seu toque de Midas não era tão imprescindível a ponto de uma banda caipira de uma cidade do interior desbancar Michael Jackson, Guns N' Roses e Madonna das paradas de sucesso. Em busca do tempo perdido, estas corporações começaram a apostar em todo tipo de grupo diferente e fora do que se convencionou chamar de rock comercial, criando um gênero híbrido que atendia por rock alternativo ou rock moderno.

Os Cranberries, porém, não pertenciam a uma tribo definida. Embora tivesse caído no gosto da MTV no auge de sua fase grunge (e antes da morte de Kurt Cobain), o grupo falava com um público que havia sido esquecido durante a última década do século passado. Nos anos 1990, a música pop tinha dois caminhos: ou seus altos investimentos financeiros traduzidos em hipérboles comerciais (retratados na caricatura do disco do Guns N' Roses que nunca saía, "Chinese Democracy") ou pulava entre nichos e guetos que iam do funk metal ao rock experimental, passando pelo britpop e pela ascensão comercial do gangsta rap.

Todo novo artista parecia ter saído diretamente das ruas ou da mesa de reuniões de executivos. Não havia um meio-termo. Foi por isso que os Cranberries deram certo. Sem caras e bocas, jeitos e trejeitos, piercings e tatuagens, o grupo concentrava-se em canções de fácil acesso, em refrões assobiáveis e temas de cores pastéis, que não provocavam fortes reações.

Enquanto o pop daquela década parecia partir para o confronto, os Cranberries buscavam a aceitação --e, por isso, cresceram, pegando o vácuo abandonado que antes era preenchido por nomes tão diferentes quanto Police, Roxette, A-ha, Eurythimics, Simple Minds, INXS e George Michael.

E é exagero chamá-los de banda de um hit só, já que além de "Zombie" e "Linger" (que já são dois), emplacaram outras músicas no inconsciente global, não tão famosas, mas o suficiente para manter a banda em atividade, junto a um público que parecia com eles --pois se faziam parte de alguma tribo, eram parte da tribo das pessoas que não se prendiam a nenhuma tribo, que apenas queria ouvir música no rádio sem que sua vida dependesse disso.

É este público --cada vez menor, mas ainda gigantesco-- que hoje lamenta a morte da cantora.