Inseri meu estilo no Megadeth "enchendo o saco", diz Kiko Loureiro
Responsável pelos riffs e solos intrincados do novo disco do Megadeth, o guitarrista brasileiro Kiko Loureiro gosta mesmo é de "encher o saco". "Tinha um piano lá no estúdio durante as gravações. E, quando os caras paravam para tomar um café, eu ia lá e começava a tocar coisas do disco, enchendo o saco de todo o mundo", conta ele ao UOL sobre os detalhes do processo de composição do álbum "Dystopia", sua primeira participação na banda, que toca no Brasil em agosto.
O resultado da experiência semiantropológica com o piano está no final da faixa "Poisonous Shadows", uma das três composições que ele assina com o vocalista Dave Mustaine. O que já é mais do que Chris Broderick —o guitarrista que Kiko substituiu— vinha fazendo. "Não que eu toque bem, mas fazendo trechos das músicas no piano, ou mesmo no violão, você deixa o ambiente bem musical e criativo, além de buscar alternativas para as composições."
Esse lado sem noção do ex-guitarrista do Angra foi importante no entrosamento com os novos colegas e na própria concepção do disco, que vem recebendo elogios da crítica especializada. Lançado no último dia 22 de janeiro, o álbum estreou no 3º lugar no ranking da revista "Billboard", segundo melhor debute da história do Megadeth. "Mas o que a imprensa diz sobre a música não importa muito para mim. O mais importante é a opinião do fã, aquele que tem uma relação afetiva e histórica com a banda. E que conhece o thrash metal."
Falando dos Estados Unidos por telefone, numa pausa da Dystopia World Tour, Kiko faz um resumo de seus primeiros dez meses de Megadeth, que, segundo ele, têm sido de adaptação e, sobretudo, de muito aprendizado ao lado do businessman Dave Mustaine. "Ele é muito profissional. Fica direto no telefone, no e-mail resolvendo questões e falando com equipe. É uma aula", diz sobre o novo chefe, conhecido por partilhar de ideais republicanos. "E ele gosta de ler e assistir a notícias o tempo inteiro. E de discutir, mas não de impor nenhuma opinião. E também tem um lado religioso. Sempre faz uma oração com os caras antes de subir ao palco."
UOL - Como é o dia a dia de um Megadeth?
Kiko Loureiro - Tem sido muito legal. Há realmente muito aprendizado e adaptação. Às vezes você até se sente meio peixe fora d'água. Afinal, tudo é novo. É como se você tivesse se separado e casado com outra pessoa. E aí entra a língua [estrangeira], o fato do Mustaine e do David [Ellefeson, baixista do Megadeth] serem americanos, de outra cultura, de terem outra idade. Mas o lado legal é muito melhor que o da adaptação. Eles têm mil histórias sobre caras que cresci sendo fã. Eles conviveram com eles, presenciaram momentos históricos. Aquela coisa meio "Forrest Gump". Musicalmente, a coisa tem ido bem pra caramba. Estar lá dentro e ver todo esse profissionalismo é outro esquema. É muito legal ver como tudo é organizado, metódico, profissional.
Já são seis meses em turnê, tocando na Ásia, América do Norte e Oceania. Qual foi o momento mais marcante?
Com certeza, o primeiro show, no Canadá, em julho, em Quebec. Foi um show isolado, em um festival que eles toparam ir. Gravei o disco em junho e julho, e daí fui direto para uma turnê com o Angra. Estava viajando como um louco quando veio a notícia desse show. Tive que aprender um monte de músicas antigas. Até então, tinha aprendido só as do disco novo. Fui jogado naquela situação. Ensaiamos três dias. Mas, como a equipe toda ainda estava se adaptando, a gente não tocou muito as músicas. Ficamos mais vendo equipamento e a equipe. Para o Mustaine e o Ellefson, que fazem shows assim direto, beleza. Mas, para mim e para o Chris [Adler, do Lamb of God, novo baterista da banda], foi um desafio. Choveu muito, molhou a guitarra, e o palco estava escorregadio. Tudo filmado pela TV canadense. Foi um teste do tipo: "Vamos ver se os caras são bons mesmo".
Quanto tempo demorou para aprender as músicas antigas?
Fiquei ouvindo as músicas durante a turnê do Angra, em aeroporto, durante qualquer tempo livre. Daí fui para minha casa nos Estados Unidos e tive dez dias para treinar tudo. Mas eu também tenho filha pequena, que tinha ficado quase três meses sem ver. Tive de ficar igual equilibrista chinês (risos). Até postei um vídeo, que viralizou, tocando "Holy Wars" com ela. Tive que tocar música de monstro. Foi o único jeito de convencer ela a fazer: brincar de tocar música de monstro (risos).
O Mustaine tem a fama de ser um cara politizado e difícil de convivência. Como é o Dave do cotidiano? Politizado?
Ele é politizado, sim. Gosta de ler e assistir a notícias o tempo inteiro. E comentar. Às vezes, eu ia ao quarto dele no hotel, quando a gente ia passar alguma coisa de guitarra, e ele estava lá vendo CNN. Ele gosta de discutir a opinião dos veículos. Diz que não gosta de uma Fox News, por exemplo, porque é muito de direita ou muito de esquerda. Vai no detalhe. A gente tocou em Wembley, em Londres, no dia posterior ao atentado de Paris, e no camarim todas as TVs ficaram ligadas. Ele gosta de discutir, mas não de impor nenhuma opinião. E ele também tem um lado religioso. Sempre faz uma oração com a banda antes de subir ao palco. Naquele momento de concentração, de acalmar os caras, sempre tem aquele "obrigado, senhor, amém".
O disco tem rendido elogios. Acha que conseguiu imprimir sua marca?
Acho que, principalmente, nos solo de guitarra. Não sei o quanto é importante um solo de guitarra (risos), mas ele acaba sempre tendo seu jeito de particular de tocar. Também dei um pouco de ideias nas composições. Coloquei ali de leve umas ideias, no jeitinho. Tem uma música, "Conquer or Die", que é um instrumental e tem um solo gigante. Dei a ideia de botar um violão de nylon, que dá um clima legal, para talvez ficar mais a minha cara e trazer para algo mais próximo do Brasil.
Mustaine disse em entrevista que se sentiu intimidado pela sua presença em estúdio, mas de um jeito positivo, porque você é um grande músico. Vindo dele, é um grande elogio, não?
Com certeza. E eu sou uma pessoa que gosta de ficar enchendo o saco dos outros —e eu sei que encho o saco— com o violão na mão, tocando a toda hora. Tinha um piano lá no estúdio durante as gravações. E, quando os caras paravam para tomar um café, eu ia lá e começava a tocar coisas do disco. Não que eu toque piano bem, mas, fazendo trechos das músicas no piano ou violão, você deixa o ambiente bem musical e criativo, além de buscar alternativas para as composições. Eu era o cara que ficava tentando jogar as ideias. Aos poucos, fui achando meu jeito de falar algumas coisas. E esse jeito eu acho que foi acertado. Eu trazia umas coisas, e ele falava: "Pô, até que não é má ideia". Às vezes ele dizia: "Não, isso aqui não é muito Megadeth". Ou então eu apresentava minha ideia, e ele vinha com outra, que transformava tudo em uma terceira coisa. Isso aconteceu com frequência. E é isso que acontece quando você trabalha em time.
Quando o Megadeth virá ao Brasil?
Em agosto. Não sei de mais detalhes. Ainda não há um planejamento mais abrangente, de cidades, datas. Provavelmente vamos passar pelas cidades que a gente sempre passa no Brasil. Também vamos tocar em outros países da América Latina. Em julho vamos saber, e vai ser anunciado. Vai ser divertido tocar no Brasil. Quem sabe, poderei mostrar para os caras o país, os lugares, a cultura. Isso pode ser bem divertido.
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